Juíza
usa sua própria história para desmascarar as falácias da tão propalada
meritocracia. Entre os pontos abordados, Fernanda Orsomarzo afirma que se
esforçou para chegar ao cargo que tem hoje, mas jamais teria conseguido se não
tivesse acesso a uma série de privilégios.
A
meritocracia” é o processo de alavancamento profissional e social como
consequência dos méritos individuais de cada pessoa, ou seja, dos seus esforços
e dedicações.
Quem
defende a teoria da meritocracia, acredita que qualquer pessoa possa chegar
onde quiser apenas através do seu esforço.
De
outro lado, muitas pessoas criticam essa ideia, principalmente em um país cuja
sociedade é desigual, racista, machista, homofóbica.
A
juíza de direito do Tribunal de Justiça do Paraná Fernanda Orsomarzo escreveu
um post no seu Facebook contando sua história de muito esforço, porém também de
muito privilégio, para afastar a ideia de meritocracia. O post já passa de 50
mil curtidas.
Fernanda
se classifica como branca e parte de uma família classe média, o que a
possibilitou de frequentar boas escolas, cursinhos e universidades. “Todos têm
suas lutas e histórias de vida. Todos enfrentam dificuldades e desafios. Porém,
enquanto para alguns esses entraves não passam de meras pedras no caminho, para
outros a vida em si é uma pedra no caminho”, afirmou.
Confira a íntegra do
texto:
Ralei
duro para ser Juíza de Direito. Cheguei a estudar 12 horas por dia em busca da
concretização do tão almejado sonho. Abdiquei de festas, passei feriados em
frente aos livros, perdi momentos únicos em família. Sim, o esforço pessoal
contou. Mas dizer que isso é mérito meu soa, no mínimo, hipócrita.
Em
primeiro lugar, nasci branca. Faço parte de uma típica família de classe média.
Estudei em escola particular, frequentei cursos de inglês e informática, tive
acesso a filmes e livros. Contei com pais presentes e preocupados com a minha
formação. Jamais me faltou café da manhã, almoço e jantar. Nunca me preocupei
com merenda ou material escolar.
Todos
têm suas lutas e histórias de vida. Todos enfrentam dificuldades e desafios.
Porém, enquanto para alguns esses entraves não passam de meras pedras no
caminho, para outros a vida em si é uma pedra no caminho. Meu esforço
individual contou, mas eu nada seria sem as inúmeras oportunidades
proporcionadas pelo fato de ter nascido – repito – branca e no seio de uma
família de classe média minimamente estruturada.
O
mérito não é meu. Na linha da corrida em busca do sucesso e realização, eu saí
na frente desde que nasci. Não é justo, não é honesto exigir que um garoto que
sequer tem professores pagos pelo Estado entre nessa competição em iguais
condições. Nunca, jamais estivemos em iguais condições.
O
discurso embasado na meritocracia desresponsabiliza o Estado e joga nos ombros
do indivíduo todo o peso de sua omissão e da falta de políticas públicas. A
meritocracia naturaliza a pobreza, encara com normalidade a desigualdade social
e produz esquecimento – quem defende essa falácia não se recorda que contou com
inúmeros auxílios para chegar onde chegou.
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2016/09/texto-de-juiza-que-desnuda-os-mitos-da-meritocracia-viraliza-nas-redes-sociais.html
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