Intermediar
negociações entre delatores da Lava Jato e autoridades dos Estados Unidos sem a
devida observância às regras pode custar caro à chamada "República de
Curitiba". Situação foi escancarada após a defesa de Lula apontar que
Sergio Moro vem ajudando a força-tarefa a esconder os detalhes desse acordo de
cooperação com os EUA
República
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Começou
a fase de produção de provas na ação penal movida pelo Ministério Público
Federal contra o ex-presidente Lula e outros réus na 13ª Vara Federal de
Curitiba, no Paraná. É certo que tal acusação já gerou muita discussão nos
cenários jurídico e político nacional quanto à efetiva descrição de conduta
criminosa por parte dos envolvidos, bem como a existência de elementos
probatórios mínimos para sustentá-la, conforme exige a legislação processual
penal.
No
entanto, uma situação inédita e extremamente grave ocorreu em todas as
audiências até aqui realizadas. Trata-se da recusa, por parte de algumas
testemunhas, em responder sobre a existência de negociações (ou acordos já
firmados) com autoridades dos Estados Unidos para figurarem como colaboradores
premiados daquele país.
Não
se pode negar a importância dos mecanismos legais de cooperação jurídica
Internacional em matéria penal, o que contribui para que os países disponham de
ferramentas para combater a criminalidade que avança para além de suas
fronteiras. Todavia, em nenhuma hipótese tal cooperação pode ocorrer às margens
da lei ou com ofensa à soberania política dos Estados.
Nesse
sentido, o silêncio que algumas testemunhas têm oposto às perguntas sobre as
negociações com autoridades dos EUA e o conteúdo das informações eventualmente
transmitidas àquelas autoridades, a um só tempo, revelam grave ofensa tanto à
legislação nacional quanto à soberania política do Estado brasileiro, prevista
no art. 1°, inciso I, da Constituição Federal.
O
sigilo previsto na Lei n° 12.850/13, que trata da colaboração premiada, vale
para os acordos negociados ou celebrados no Brasil, cessando tal sigilo tão
logo seja recebida a denúncia. Assim, não cabe invocar uma restrição imposta
por autoridade estrangeira para impedir a plena vigência da lei brasileira nos
processos judiciais que tramitam em seu território. Do contrário, temos a
esdrúxula situação de um juiz brasileiro afastar a soberania política do Brasil
em seu território para, em seu lugar, admitir aqui a vigência da legislação
estrangeira. Não bastasse isso, duas sérias razões reforçam a ilegalidade dessa
situação.
Em
primeiro lugar, de acordo com expressa disposição do Código de Processo Penal,
as testemunhas que prestam compromisso têm a obrigação de dizer a verdade sobre
tudo que lhes for perguntado, não podendo calar ou omitir fatos e
circunstâncias segundo seu juízo de conveniência. As exceções a essa regra
geral ocorrem quando, em virtude de relações de parentesco ou por sigilo
profissional, a própria lei as exime de prestar compromisso ou mesmo as proíbe
de depor.
Igualmente,
em razão da garantia constitucional que exime o cidadão de produzir prova que
poderá ser utilizada em seu desfavor (artigo 5°, inciso LXIII, da Constituição
Federal), a testemunha pode se calar quando isto representar uma
autoincriminação. Ilustram bem essa situação as reiteradas decisões do STF
assegurando aos depoentes de CPIs no Congresso Nacional o direito de
permanecerem em silêncio quando a resposta puder prejudicá-los nesse sentido.
Contudo,
tal ressalva não se aplica àquele que firmou acordo de colaboração premiada,
obrigando-se a dizer a verdade, tendo sido regularmente admitido como
testemunha em juízo. Esse é justamente o caso das testemunhas que são réus
colaboradores e têm se calado perante o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Por
fim, essa recusa das testemunhas implica cerceamento de defesa, pois impede que
a defesa técnica tenha amplo conhecimento sobre fatos e circunstâncias que
ostentam relevo para o julgamento da causa, a fim de exercer sobre eles o
indispensável contraditório, o que também é garantia constitucional (artigo 5°,
inciso LV, da Constituição Federal).
Em
segundo lugar, tal quadro pode revelar algo ainda mais grave. Uma das
testemunhas revelou ter se encontrado com agentes dos EUA em território
brasileiro. Caso isto tenha ocorrido em desacordo com o Decreto nº 3.810/01
(Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal entre Brasil e Estados
Unidos da América) configura-se ofensa à soberania política do Estado
brasileiro.
Em
nenhuma hipótese é admissível que agente de Estado estrangeiro ingresse no
território brasileiro para atividades de investigação criminal sem expressa
celebração de acordo de cooperação. Vale recordar que há precedente de suposta
inobservância da legislação sobre cooperação jurídica internacional na Operação
Lava Jato.
Ocorre
que não basta o mero cumprimento a tais formalidades, há restrições ao conteúdo
das informações que podem ser transmitidas às autoridades estrangeiras. Não é
admissível o fornecimento de informações e documentos de caráter estratégico
que estejam relacionados com a defesa nacional. Neste ponto, é preciso recordar
que algumas dessas testemunhas ocuparam os mais altos postos de direção da
Petrobras e, nessa condição, tiveram acesso a informações e documentos
sigilosos acerca dos recursos naturais (por exemplo, gás e petróleo) e da
política energética brasileira.
Caso
estejam fornecendo informações e documentos de caráter estratégico às
autoridades dos EUA, tais indivíduos podem estar cometendo crimes contra o
Estado, previstos na Lei n° 1.802/53, também conhecidos como “crimes de traição
à pátria”. Aqueles que porventura estejam instigando ou auxiliando tais
indivíduos a praticarem tal conduta também podem ser penalmente
responsabilizados, na qualidade de partícipes.
Portanto,
longe de configurar filigrana jurídica, tal situação deve ser melhor
esclarecida e, a depender das informações e documentos que estão sendo
transmitidos, é preciso instaurar investigação para apurar a responsabilidade
penal de tais réus colaboradores e seus partícipes.
http://www.pragmatismopolitico.com.br/2016/12/republica-curitiba-crime-traicao-patria.html
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