Advogados
e Juízes do Trabalho que participam do Fórum Nacional em Defesa dos Direitos
dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização divulgarma um manifesto
extremamente esclarecedor sobre o conteúdo da minirreforma trabalhista
anunciada por Michel Temer. É leitura obrigatória para quem quer poder formar
opinião e argumentar num assunto onde, outra vez, a campanha da mídia será
para iludir, enganar e saquear os
trabalhadores em seus direitos.
Quando
o saco de maldades vira presente de Natal
A
reforma trabalhista inconstitucional proposta pelo governo Temer insere-se em
um amplo pacote de maldades que atropela os direitos sociais, incluídos os do
trabalho, evidenciando um modelo de Estado e de sociedade que já se comprovou
nefasto em outros países, com políticas de austeridade propaladas como sendo a
via única para recuperar a economia e equilibrar as contas públicas cujos
resultados, porém, têm sido catastróficos em outros experimentos
internacionais, não resultando em crescimento e em equilíbrio fiscal. Nesse
pacote, além da já aprovada PEC 55 (que congela o gasto público por vinte anos
mas, por outro lado, permite a transferência de valores e riqueza aos rentistas
do Tesouro), estão a Reforma da Previdência, penalizando os mais necessitados,
e a Reforma Trabalhista que se expressa em projetos de lei em andamento (PLC
30/2015 que amplia a terceirização para quaisquer atividades, PEC 300/2016,
entre outros) e nas recentes medidas anunciadas como “presente de natal” que,
fundadas na tese da prevalência do negociado sobre o legislado, rompem com o
princípio da hierarquia dinâmica das fontes (que autoriza seja aplicada a norma
mais benéfica ao trabalhador), aliás, uma das expressões do princípio da
proteção, razão de ser do Direito do Tabalho.
O sistema constitucional de 1988, ao
prever a força normativa dos acordos e convenções coletivas, condicionou sua
validade e eficácia à observância dos princípios da dignidade humana e do valor
social do trabalho, deixando expresso no artigo 7º, caput, que às disposições
inscritas nos incisos podem ser agregadas outras que “visem à melhoria das suas
condições sociais”. Daí ser inconstitucional qualquer proposta que parta da
possibilidade de redução ou supressão de direitos assegurados pela legislação
trabalhista.
As
medidas anunciadas como “presente de natal” são presente de grego para os
trabalhadores e trabalhadoras do país, como diz nota conjunta da Central Única
dos Trabalhadores, CUT, e da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do
Brasil, a CTB, aqui integralmente endossada. Essas medidas, fundamentadas em
premissa equivocada e não comprovada empiricamente de que é flexibilizando a
tela social de proteção que serão ampliados postos de trabalho e atingidos
melhores índices de produtividade e competitividade, são inaceitáveis para os
que têm ciência de que tais elementos somente poderão ser alcançados com a
dinamização da economia, jamais com supressão de direitos que asseguram patamar
civilizatório mínimo.
Ao
consagrar, na lei, a supremacia do acordado sobre o legislado, as medidas,
acaso aprovadas, ampliarão a margem para o empregador contratar e gerir a força
de trabalho como lhe aprouver, segundo suas conveniências e necessidades,
acirrando as inseguranças no mundo do trabalho e aprofundando a precariedade. De
resto, sociedades menos injustas e mais inclusivas supõem uma regulação social
pública do trabalho a qual somente terá eficácia enquanto existir uma regulação
pública do capital que lhe coloque freios e limites.
No
caso das medidas propostas, regressivas e intoleráveis por privilegiarem o polo
mais poderoso da relação capital e trabalho, permitem, em síntese, que o
acordado se sobreponha ao legislado. São onze os pontos que, segundo a
proposta, poderão ser alterados nesse encontro “livre” das “vontades iguais”,
tais como: jornada de trabalho, férias, repousos, horários de descanso para
refeição, entre outros. Também consta dos direitos que podem ser “negociados”
(para menos): as horas de deslocamento do trabalhador (horas in itinere), em
desrespeito a entendimento consagrado pelo TST, os planos de cargos e salários,
os bancos de horas. Mas talvez a grande novidade seja a previsão da organização
por local de trabalho via comissão eleita que poderá ou não contar com a
participação do sindicato. Uma vez adotada a supremacia do negociado, essa
comissão poderá dispor sobre direitos empresa por empresa, o que, em cenário de
crise econômica grave, brutal recessão, terceirização ampla e fragmentação da organização sindical, além
de não representar a abertura de novos postos de trabalho, ampliará o poder das
empresas de negociar, por exemplo, jornadas intermitentes, com implicações
diretas na remuneração e nas contribuições previdenciárias, podendo levar a uma
situação de total supressão de direitos diante da insegurança do desemprego que
ameaça a sobrevivência pessoal e familiar.
Estudos
mostram que os acidentes e os adoecimentos se ampliam diante da sobrecarga de
trabalho. A proposta, ao permitir que as regras da jornada sejam alteradas,
respeitado o limite de 12 horas diárias e 220 horas mensais, além de consistir
afronta direta à conquista das 8 horas diárias e 44 semanais incorporada pela
Constituição de 1988, ampliará de forma alarmante os riscos a que ficam
submetidos os trabalhadores, em um país cujos índices de acidentes, sobretudo
nos terceirizados, já são altíssimos. A intensificação da jornada e o
previsível aumento das incertezas quanto à manutenção do emprego repercutirão
nas condições de vida e de subsistência das famílias, fazendo expandir os
problemas de saúde como depressão, estresse, LER/DORT, entre outros. A
catástrofe será ainda maior se for aprovada a Reforma da Previdência Social em
andamento.
Não
bastasse isso, a proposta contempla a possibilidade de ampliação do tempo em
que poderá o fazer uso do contrato de
emprego temporário de que trata a lei 6.019/74.
Ao ampliar esse tempo para 120 dias, com possibilidade de renovação, ao
invés de estimular a geração de empregos contribuirá para alimentar uma cadeia
de precariedades e de estímulo à rotatividade da mão de obra em um cenário em
que grande parte dos contratos por prazo indeterminado não chega a esse limite
dilatado pela proposta.
Diante
desse quadro, os signatários desta nota, integrantes do Fórum Nacional em
Defesa dos Direitos dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização, repudiam com veemência tal proposta que, ao
fim e ao cabo, busca eliminar quaisquer obstáculos legais ao “livre trânsito”
de um “desejo insaciável” de acumulação de riqueza abstrata. Cientes de que são
as conquistas incorporadas pela Constituição da República de 1988 que estão em
xeque, solidarizam-se com a insatisfação de trabalhadores e de entidades
expressa em notas que se ampliam e em manifestações públicas, repudiando toda e
qualquer tentativa de regresso àqueles tempos em que não havia diques para
conter a ação despótica do capitalismo constituído. Assim, colocam-se
contrários tanto à PEC 300, por flagrante inconstitucionalidade, inclusive
porque limita o direito de reparação aos dois últimos anos do contrato quanto à
Reforma Trabalhista anunciada, objeto desta nota, por seu escancarado caráter
retrógrado. São propostas que se colocam na contramão de história, na medida em
que, enquanto na Europa discutem-se políticas de aumento do salário mínimo, no
Brasil, apesar das imensas desigualdades sociais, alvitram-se medidas redutoras
de direitos que mais atingem os que mais necessitam da proteção social,
sacrificando o trabalho em detrimento do capital e sem qualquer aceno à redução
dos juros, a um imposto de renda progressivo que não penalize os assalariados,
à tributação da renda e das grandes fortunas.
Nós
dizemos não a esse presente indigesto!
http://www.tijolaco.com.br/blog/juizes-e-advogados-trabalhistas-detonam-reforma-de-temer/
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