Costuma-se
dizer que ninguém no Congresso é bobo. Bobos não chegam àquela casa. Loucos, e
muito menos bobos, também não chegam ao Supremo, o que atiça a busca de
explicações para o que se está passando atrás daquelas vidraças e cortinas.
Depois da liminar do ministro Marco Aurélio (parcialmente derrubada) afastando Renan
Calheiros da presidência do Senado, o que teria levado o ministro Luiz Fux ao
desatino de mandar a Câmara votar de novo as dez medidas contra a corrupção?
Muitos no Congresso acham, como a senadora Vanessa Grazziotin disse, com todas
as letras, em sua entrevista à TV247, que estabeleceu-se também entre aquelas
estrelas togadas uma acirrada disputa política.
Marco
Aurélio foi derrotado, na medida em que Renan, embora afastado da linha
sucessória, preservou a cadeira de presidente. Mas sabe que, para a posteridade,
foi ele que “ficou bem na foto”, como disse. Não por ter “feito média” com os
que, no domingo anterior, pediram a cabeça de Renan, mas por ter feito a
interpretação ortodoxa da Constituição, que depois o plenário “flexibilizou” em
nome das governabilidade e do ajuste fiscal.
Fux
faz o inverso. Qualquer estudante de direito sabe que sua liminar afronta o
princípio basilar da separação dos poderes e das prerrogativas de cada um
deles. Fux sabe que, no exercício de sua função de legislar, o Congresso é
soberano para modificar qualquer proposição, venha ela de onde vier: do
Executivo, de um parlamentar, de um partido ou diretamente de segmentos da
população, através de projetos de iniciativa popular. Não é por ter recebido
dois milhões de assinaturas de apoio (neste país de 200 milhões de habitantes)
que a proposição do Ministério Público ganhou o status de “imexível”. Um
exemplo recente é a lei da ficha limpa, também oriunda da iniciativa popular
mas alterada pelo Congresso.
Quando
compra esta briga com a Câmara, invadindo suas competências, Fux se alinha com
o Ministério Público e a força-tarefa da Lava Jato que tudo fez para emparedar
a Câmara naquela votação. As medidas sofreram mesmo grandes alterações. Foram
rejeitadas aquelas mais perigosas para a vida em democracia, como a criação da
figura do “reportante do bem”, o dedo duro incentivado, ou a flexibilização do
habeas corpus. Foi tipificada o crime de abuso de poder, que não constava do
original. Mas esta é a Câmara que temos, e se não gostamos, devemos esperar por
uma nova eleição e cada um que procure escolher representante melhor. O sistema
político não prevê a dissolução da Câmara por iniciativa do nenhum poder.
Imediatamente,
veio a reação do outro polo político do STF, o ministro Gilmar Mendes, que
qualificou a liminar de Fux como o “AI-5 do Judiciário”. Gilmar está
doutrinariamente certo, mas não é segredo para ninguém que está empenhado em
colaborar com o esforço de blindagem do atual governo e de seu bloco
político-partidário aliado. Tanto quanto Fux, tem lado.
As
divisões no STF expressam a disputa entre projetos para o país, que levou ao
golpe contra Dilma, e também as contradições que vêm surgindo dentro do próprio
condomínio golpista, que se expressam principalmente entre os partidos: de um
lado, PSDB/DEM, de outro, o Centrão.
Mas
certamente contribuiu para o aumento das rivalidades internas aquele velho
fator humano, a vaidade. Desde o julgamento da ação penal 470, quando sessões
do STF passaram a ser transmitidas ao vivo pela TV Justiça e outros canais, o
protagonismo de alguns ministros exacerbou-se. E com o agravamento da crise,
ali também começou-se a fazer política.
O
que se passa no STF, longe de contribuir para a distensão, leva água para o
moinho da crise. Felizmente, por conta do início do recesso, a Câmara não
precisará “desobedecer” uma liminar do STF, como fez Renan. Mas deve mesmo
cobrar, como farão Maia e Renan, uma rápida manifestação do plenário sobre a
liminar de Fux.
Uma
proposta que ganha reforço, com a liminar de Fux, é a de tipificar o crime de
“usurpação de competências”. Congressistas entendem que o STF e o TSE vem
avançando com velocidade sobre a linha divisória que reserva ao Congresso a
prerrogativa de legislar. A proposta está para ser votada na Comissão de
Constituição e Justiça.
http://www.brasil247.com/pt/blog/terezacruvinel/270767/A-guerra-entre-as-estrelas-togadas.htm
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