Uma
das jornalistas políticas mais respeitadas no país, Tereza Cruvinel já passou
por diversos veículos da imprensa nacional. Trabalhou por mais de duas décadas
nas Organizações Globo, onde era a principal analista do cenário político
brasileiro, e em 2007 foi convidada para presidir a Empresa Brasil de
Comunicação (EBC) e implementar a TV Brasil. Acabado seu mandato, passou pela
Rede TV e pelo Correio Braziliense. Hoje é colunista do portal Brasil 247.
Na
entrevista ao Fazendo Media, ela fala sobre o atual cenário político e as
perspectivas para as eleições de 2018. Analisa também a cobertura midiática dos
meios tradicionais durante os governos do Partido dos Trabalhadores (PT), e
aponta como um dos erros de Lula e Dilma não ter dado sequência ao processo de
regulação e democratização dos meios de comunicação. Fala ainda sobre a
importância da EBC e a impopularidade do governo Temer.
Enquanto cientista
política, o que está acontecendo no processo político brasileiro?
Tivemos
o desenrolar de um longo processo de desestabilização de um governo
democraticamente eleito, depois um golpe sob a forma de impeachment e agora
temos um governo neoliberal implantando uma agenda impopular que vai enfrentar
uma grande resistência da sociedade brasileira. Um presidente impopular com uma
agenda impopular, e que agora começa a ser investigado também. O custo do
impeachment, desse golpe, foi altíssimo: a degradação da economia brasileira
com 1,6 milhão de desempregados, a redução das exportações, a degradação de
todos os indicadores. E não teve nem a tal retomada da confiança, nem a tal
retomada do crescimento e muito menos a estabilidade política porque o próprio
presidente vai ser investigado.
E por que sair da maior
empresa de comunicação privada do país para a comunicação pública? Você tinha
alguma dificuldade em relação às suas opiniões no Globo?
Porque
sempre acreditei que era importante a comunicação pública para a democracia
brasileira, e quando tive uma oportunidade fui.Trabalhei 30 anos no Globo, não
tive nenhum problema.
Nesses mais de 30 anos
trabalhando nas mídias privadas brasileiras, o que acha da cobertura política
de uma maneira geral e nos últimos acontecimentos com o impeachment?
A
cobertura política das mídias privadas passou por grande alteração a partir da
eleição de Lula em 2002. Na campanha, Lula mereceu cobertura correta e eu diria
que até generosa, destacando seu novo perfil, mais conciliador, o Lulinha paz e
amor, e depois a Carta ao Povo Brasileiro, um compromisso com a
responsabilidade fiscal e a estabilidade econômica que removeu resistências à
sua candidatura. A partir de sua posse, a cobertura de governo tornou-se
gradualmente mais agressiva. Lula também cometeu erros de comunicação no início
do governo, resistindo, por exemplo, a conceder uma única entrevista coletiva
em seu primeiro ano de mandato. O ambiente que já era hostil envenenou-se de
vez a partir do caso Waldomiro. A partir do mensalão o PT torna-se o “inimigo
interno” a combater e os desequilíbrios na cobertura ganham intensidade. Houve
passagens graves na reeleição de Lula e o resto todos sabemos. Com o advento da
Lava Jato e os problemas políticos enfrentados por Dilma formou-se a aliança
mídia-judiciário, que propiciou o ambiente para os protestos e depois para o
impeachment. A grande derrota do PT nas eleições municipais é decorrência de
seus erros mas também de sua demonização pela mídia, como única fruta podre
deste galho envenenado que é o sistema político-eleitoral brasileiro.
Qual a sua opinião em
relação à democratização da mídia? O Gil e o Franklin Martins tentaram avançar
nessa pauta, ocorreram as conferências municipais e estaduais que culminaram
numa conferência nacional e as propostas foram engavetadas.
Um
erro do governo Lula foi não ter enfrentado o problema da regulação da mídia,
não enfrentou em nenhum dos seus mandatos. A EBC não nasceu perfeita, teve
problemas de origem por conta das circunstâncias políticas, e depois não foi
mais possível enfrentar a questão da regulação. A Dilma não enfrentou no
primeiro mandato, isso foi uma falha dos governos petistas pela qual eles
próprios pagaram muito caro.
Qual a importância da
EBC para a comunicação do país, e quais os principais desafios para a
consolidação de sua Rede?
A
EBC foi a mais importante experiência de comunicação pública implantada no
país. Pela primeira vez, foi criada uma instituição com a finalidade de desenvolver
a previsão constitucional de 1988, de que houvesse complementaridade entre
sistemas estatal, público e privado de radiodifusão. Antes da EBC, o que
tivemos foi uma emissora estatal, a TV Nacional da Radiobrás, de alcance local,
e as emissoras educativas estaduais, algumas das quais buscaram aproximar-se do
modelo público. Todas, entretanto, foram dependentes e subordinadas aos
governos estaduais.
A
EBC, diferentemente, foi criada com base em uma lei que previu sua
independência editorial, garantiu recursos orçamentários e estabeleceu as
linhas filosóficas da programação. Tudo isso, infelizmente, está sendo
transformado em letra morta pela Medida Provisória (MP) do Temer.
O que acha do tratamento
da justiça nas operações de combate à corrupção? Estamos caminhando para o fim
do desvio de recursos públicos no país?
A
Lava Jato cumpre um papel importante, iluminando o alcance da corrupção e sua
estreita relação com o sistema político-eleitoral, especialmente com o
financiamento de campanhas e partidos. Entretanto, a cultura da corrupção não
será extirpada por força de uma ação policial-judicial se não forem feitas
reformas importantes no sistema político, além, é claro, do aprimoramento dos
mecanismos de fiscalização e controle.
Como você vê o cenário
atual em relação às eleições de 2018?
O
resultado das eleições municipais aponta para uma inflexão conservadora do
eleitorado, para a emergência de uma maioria de direita no país. O PT sofreu a
previsível derrota, a esquerda teve seu espaço reduzido e a direita avançou.
Isso não significa, entretanto, que a onda conservadora será predominante
também em 2018. Tudo vai depender do andar da economia, do desempenho do
governo Temer, que até agora colheu mais rejeição que apoio, dos desdobramentos
da Lava Jato e da própria capacidade da esquerda para reposicionar-se no novo cenário.
A
ausência de candidatos competitivos favorece a emergência de salvadores da
pátria e de outsiders da política, de candidatos “de fora”, como um Joaquim
Barbosa, um Sérgio Moro, um Janot ou um Gilmar Mendes. Mas apenas favorece,
nenhum candidato com este perfil está colocado. Há uma degradação dos partidos
e uma falta de quadros. Os quadros do PSDB estão todos queimados, o PMDB não
tem nomes e o PT só tem o Lula. No PSDB, Geraldo Alckmin sem dúvida
apresentou-se como o nome mais forte, em função de sua indiscutível vitória
eleitoral em São Paulo, não apenas na capital. E o PMDB, que patrocinou o golpe
em nome de um projeto de poder próprio, não tem candidato. Lula é uma
incógnita, tudo vai depender de sua elegibilidade, que depende da Lava Jato. É claro
que tudo que está sendo posto em marcha pela Lava Jato é para tirar o Lula do
páreo. Se ele for candidato, tem muitas chances de conquistar esse mandato de
novo. Mas não sei se ele será candidato.
http://www.brasil247.com/pt/247/midiatech/259481/Tereza-Cruvinel-%E2%80%9CO-custo-desse-golpe-foi-alt%C3%ADssimo%E2%80%9D.htm
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