É
estarrecedora a reportagem do El País sobre a ação do Capitão do Exército
Willian Pina Botelho junto a grupos de jovens que se manifestavam contra o
governo Michel Temer.
É
documentada e exige explicações públicas.
A
ideia de que um oficial do Exército Brasileiro possa estar atuando
clandestinamente – porque a lei não o permite, salvo em casa de ameaça externa,
ação manifestamente terrorista ou a pedido dos governos estaduais – deste tipo
de atividade clandestina fez lembrar dois episódios que minha geração viveu sob
a ditadura.
Um,
dramático e mortal, quando o capitão Wilson Machado, que escapou, e o sargento
Guilherme do Rosário, que morreu, foram atingidos por uma bomba que carregavam
no Riocentro, em 1981.
Outro,
aparentemente prosaico, que marcou a
memória dos estudantes -como eu – dos anos 70, que era a do “cana da
turma”.
Explico:
era a convicção – não desarrazoada – de que em cada turma da Universidade
tínhamos um “cana” a nos espionar.
Não
era uma discriminação com pessoas – curiosamente, em minha turma, tínhamos duas
pessoas com ligações familiares com oficiais de alta patente do Exército que
foram e são pessoas absolutamente queridas
de todos os que vivemos aqueles tempos.
Não,
o temor era de um sórdido, de um mentiroso, de um dissimulado, de alguém que se
fingisse um amigo, sem o ser, para colher informações e incriminar jovens por
suas ideias, já que, como diziam os Novos
Baianos, não havia entre nós alguém ” capaz de matar uma muriçoca”.
Era
o medo de “um amigo”.
O
Exército Brasileiro levou três décadas para recuperar o acatamento geral do
país, por profissionalismo.
Melhor
do que ninguém, nossas Forças Armadas sabem os desvios de conduta e de poder
que a atuação repressiva lhes rendeu. Até porque acaba degenerando em formação
de quistos dentro das organizações militares.
Mais
ainda levamos nós para nos livrarmos da cultura do “dedurismo”, a
criminalização das relações sociais, de desconfiança como regra de convívio.
É
aterrorizante que instâncias paralelas ao seu comando usem militares para ações
políticas.
É
sintomático que, através do ministério da “Justiça”, com Alexandre de Moraes e
do recriado Gabinete de Segurança Institucional, com Sérgio Westphalen
Etchegoyen, as Forças Armadas fiquem sob a suspeita de atuarem como polícia
política.
http://www.tijolaco.com.br/blog/voltamos-ao-tempo-do-o-cana-da-turma/
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