O
golpe não se encerrou na sessão do Senado que cassou o mandato da Presidente
Dilma na farsa do impeachment. Ali apenas se abriu um capítulo novo do ataque à
democracia para a consolidação do regime de exceção que se vive no Brasil.
Os
objetivos com a suspensão das regras democráticas são: [1] extirpar Lula e o PT
do sistema político brasileiro – portanto, a representação dos pobres na
política; [2] transferir a riqueza nacional ao capital estrangeiro mediante a
regressão dos direitos do povo; e [3] inserir subalternamente o Brasil, a
sétima potência econômica planetária, no sistema mundial.
Os
sinais de arbítrio e excepcionalidade institucional já eram perceptíveis bem
antes do desfecho do golpe, ainda nas etapas de conspiração e desestabilização
do ambiente político.
No
Judiciário e no Legislativo, decisões fundamentais que regeram o golpe
continham escancarada arbitrariedade e excepcionalidade, mas assim mesmo foram
legitimadas pela Justiça e naturalizadas midiaticamente, para envernizar o
atentado à Constituição com a aparência de legalidade. A Rede Globo e
conglomerados da mídia, praticando um noticiário conivente e de viés
partidário, são essenciais para a subversão jurídico-institucional em curso.
O
regime de exceção se caracteriza pela adoção de medidas de arbítrio e de
coerção em substituição ao Estado de Direito e ao regramento legal; e pelo
esmagamento da oposição política e social.
É
um regime no qual as instituições de Estado, em especial policiais e judiciais,
são capturadas partidária e ideologicamente, e direcionadas para a perseguição,
combate e eliminação dos “inimigos do regime”.
As
Leis e a Constituição deixam de balizar as relações sociais e a resolução dos
conflitos. A sociedade é então governada por ocupantes ilegítimos do poder; os
sem-voto – usurpadores que, com lógicas totalitárias, distorcem as Leis e a
Constituição para aniquilar oponentes políticos e instalar um esquema
autoritário de poder.
A
manifestação do Tribunal Federal da 4ª Região defendendo a adoção de “situações
inéditas [da Lava Jato], que escaparão ao regramento genérico”; ou seja,
soluções não subordinadas ao regramento jurídico, é uma evidência assustadora
desta realidade.
Na
ditadura instalada em 1964, os militares foram gradualistas. As medidas
restritivas de liberdade, de repressão e de arbítrio foram instituídas à
continuação do golpe, através dos sucessivos Atos Institucionais decretados
entre abril de 1964 e dezembro de 1969, e que conformaram a índole fascista do
regime.
O
arcabouço jurídico do regime ditatorial de 1964, portanto, não foi cabalmente
concebido no dia 2 de abril de 1964, quando o auto-proclamado “Comando Supremo
da Revolução” [sic], liderado pelo general Arthur da Costa e Silva, assumiu o
comando do país depois do golpe que derrubou o Presidente João Goulart.
Já
neste golpe de 2016, a oligarquia fascista imprimiu uma dinâmica alucinada
desde o primeiro instante. Pretende processar, no menor período de tempo,
mudanças cruéis e com forte conteúdo anti-povo e anti-nação, que poderão ter
efeito de longuíssimo prazo para a organização econômica e social do Brasil.
Para
impor a agenda ultra-reacionária de restauração neoliberal, o governo golpista
enfrentará uma oposição radical. Não se pode desprezar que, com a crise de
legitimidade e com a propagação da resistência democrática, o regime tenderá ao
embrutecimento; deverá assumir formas abertamente violentas, com prisões
ilegais, torturas, assassinatos políticos.
O
objetivo estratégico da oligarquia golpista é a proscrição do PT e a destruição
do Lula no imaginário popular. Nas últimas duas semanas, a Lava Jato, que é o
braço terrorista do regime de exceção, deu passos importantes nesta direção.
A
força-tarefa da Operação, dominada por militantes fanáticos do PSDB, promoveu
na véspera da eleição três ações semióticas, implacáveis, inteligentemente
programadas: [1] a encenação espalhafatosa de procuradores “cheios de
convicções, mas vazios de provas” contra Lula [dia 12/09]; [2] a aceitação da
denúncia estapafúrdia, pelo justiceiro Moro [em 20/09]; e [3] a barbárie
jurídica da prisão do ex-ministro Guido Mantega [em 22/09].
A
Lava Jato faz um esforço titânico para apagar o legado da maior mobilidade
social havida no Brasil em 520 anos no Brasil – 40 milhões de pessoas retiradas
da condição de indigência – para ditar, em lugar disso, uma narrativa
criminalizadora dos períodos Lula e Dilma, tendo como eixo a corrupção.
Sempre
é oportuno recordar o pensador Norberto Bobbio, para quem o fascista não
combate de verdade a corrupção, apenas emprega um discurso cínico da corrupção
para tomar o poder: “O fascista fala o tempo todo em corrupção. Fez isso na
Itália em 1922, na Alemanha em 1933 e no Brasil em 1964. Ele acusa, insulta,
agride como se fosse puro e honesto. Mas o fascista é apenas um criminoso, um
sociopata que persegue carreira política. No poder, não hesita em torturar,
estuprar, roubar sua carteira, sua liberdade e seus direitos”.
Com
a cassação de Eduardo Cunha, a Rede Globo, como num passe de mágica, virou a
página da corrupção. A única “sujeira” que permanece na cena pública do
noticiário da Globo e da mídia dominante, e que deve ser radicalmente
extirpada, é o PT.
O
banditismo político alcançou um patamar inédito no Brasil. Não só devido à
brutalidade do ataque contra Lula e o PT, mas sobretudo devido à inteligência
operacional e estratégica da oligarquia fascista na implantação do regime de
exceção.
.oOo.
Jeferson
Miola é integrante do Instituto de Debates, Estudos e Alternativas de Porto
Alegre (Idea), foi coordenador-executivo do 5º Fórum Social Mundial.
http://www.sul21.com.br/jornal/lava-jato-braco-terrorista-do-regime-de-excecao-por-jeferson-miola/
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