Rendimentos
são engordados por adicionais legais, sustentados por interpretações da legislação.
O
salário dos juízes no Brasil tem um teto. Não pode ultrapassar o salário de
ministros do Supremo Tribunal Federal, o STF, hoje em R$ 33.763. Na prática, já
se sabe há um tempo, não é bem assim. Um levantamento conseguido em primeira
mão pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que a correlação é bem mais
desproporcional. Um desembargador (como é chamado o juiz de segunda instância
nos Estados) em Minas Gerais ganha, em média, líquido, R$ 56 mil por mês. Em
São Paulo, R$ 52 mil. No Rio de Janeiro, R$ 38 mil.
Esses
valores superam os pagos a um juiz similar no Reino Unido, que recebe cerca de
R$ 29 mil, e até dos Estados Unidos, cujo salário mensal médio é de R$ 43 mil.
Chega a ser superior a juízes da Suprema Corte de países da União Europeia,
como Bélgica e Portugal.
Os
salários básicos são engordados por adicionais legais, sustentados por
interpretações da legislação. Mas formam vários andares acima do teto. Como
disse a ministra Cármen Lúcia numa audiência no STF: "Além do teto, tem
cobertura, puxadinho e sei mais lá o quê", numa referência ao fato de que
o limite vale mesmo apenas para os 11 ministros do Supremo.
Os
juízes são o topo da cadeia de servidores públicos, diz o responsável pelo
levantamento, Nelson Marconi, coordenador Executivo do Fórum de Economia da
Fundação Getulio Vargas.
Segundo
Marconi, quando há uma demanda por qualquer tipo de benefícios no
funcionalismo, os juízes costumam abrir o ciclo de negociações. Na sequência,
diz, vêm Polícia Federal, Receita, advogados do Executivo, Banco Central e
Tesouro Nacional, numa fila que se estende até funcionários administrativos e
professores.
Este
ano, o poder de mobilização do Judiciário já foi visto. Foi a primeira a
defender o seu reajuste salarial, tão logo o governo interino assumiu. Na
negociação do pacote de ajuda de União aos Estados, foi a primeira categoria
que se opôs à contabilização dos ganhos adicionais como parte dos salários,
para fins de adequação aos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal.
"Todas
as categorias vão atuar contra o ajuste fiscal, basta ver que depois que os
juízes conseguiram o reajuste as demais entraram pedindo o seu também",
diz Marconi. "O verdadeiro desafio será vencer o corporativismo de
inúmeras categorias que vão se mobilizar para pressionar o Congresso e escapar
da tesoura", diz o economista Marcos Lisboa, presidente do Insper e ex-secretário
de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
Adicionais
Marconi
explica que o teto do Judiciário é rompido por uma série de verbas adicionais.
Há diferentes abonos e gratificações - por tempo de serviço, por dupla função e
substituição de colegas em férias ou em licença. Também existem os auxílios -
auxílio pré-escolar, auxílio-saúde, auxílio-moradia. Os ganhos adicionais são
legais e uma parte deles são até eventuais - como gratificações natalinas ou
por férias ou mesmo por ganhos em processos judiciais movidos pelos próprios
juízes.
"Tudo
deveria estar dentro do subsídio, mas ficou difícil conseguir aumentos no
subsídio e vieram os penduricalhos", diz Janaina Penalva, professora de
direito constitucional da Universidade de Brasília. Por causa dos
"penduricalhos", diz, a transparência fica prejudicada. Mesmo os
dados divulgados são "restritos" e "obscuros".
As
circunstâncias políticas, porém, em que o Judiciário é protagonista,
principalmente na área criminal com a Operação Lava Jato, não são, para ela,
consideradas favoráveis: "Há um desinteresse estratégico neste momento por
pressionar o Judiciário." Pesquisa O levantamento sobre os ganhos mensais
de desembargadores nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro foi
feito pela internet, nos links dedicados à transparência nos sites dos
Tribunais de Justiça. Chamaram a atenção os altos valores pagos em janeiro e
junho deste ano em Minas, muitos superiores a R$ 100 mil líquido. Alguns eram
próximos a R$ 200 mil.
Por
outro lado, causou estranhamento a média paga no Rio, inferior a R$ 40 mil
mensal, pois em outros levantamentos os salários eram maiores.
Atribuiu-se
a diferença ao fato de o Estado do Rio atravessar uma grave crise financeira.
Os pesquisadores dizem que não foi uma tarefa fácil localizar os números. Exige
paciência para se localizar as planilhas, e os dados, por sua vez, não seguem
padrões e não há clareza se lá constam todas as informações.
Os
levantamentos foram feitos por amostragem, em dois períodos: o primeiro
semestre de 2016, para retratar o comportamento dos ganhos na crise econômica,
e nos 12 meses entre junho do ano passado e julho desse ano, para se evitar
distorções, em caso de concentrações de pagamentos em alguns períodos.
Cálculo
do teto segue a lei, dizem tribunais
Procurados
pela reportagem, as assessorias de imprensa dos Tribunais de Justiça defenderam
a forma de cálculo adotada para cumprir o teto salarial do Judiciário, com os
adicionais que chegam a mais que dobrar o salário-base.
O
tribunal mineiro destacou que "a remuneração mensal de magistrados e
servidores respeita os limites legais e o teto constitucional e que acréscimos
à remuneração decorrentes de passivos ou de natureza indenizatória não integram
os limites do teto remuneratório ou da Lei de Responsabilidade Fiscal".
O
Tribunal de Justiça de São Paulo complementou que "o teto constitucional,
até mesmo por imposição legal, não pode abranger verbas de natureza
indenizatória, tais como auxílio-alimentação e indenizações de férias não
gozadas por absoluta necessidade do serviço."
O
tribunal paulista destacou ainda que não foi contra o teto para os gastos do
funcionalismo dentro do projeto de negociação das dívidas dos Estados: a
oposição foi à proposta de alteração da Lei de Responsabilidade Fiscal, que foi
"indevidamente embutida" na proposta "sem prévia e ampla
discussão de suas consequências para o serviço público em geral". Em
relação ao reajuste da categoria, disse ainda:
"Não
nos posicionamos em favor de aumento de vencimentos ou subsídios, mas pela
simples reposição das perdas geradas pelo desgaste inflacionário." O
Tribunal de Justiça do Rio enviou nota dizendo que, por causa da Olimpíada,
estava em regime de plantão, sem condições de atender os questionamentos da
reportagem.
Fonte:
Correio do Povo
http://www.correiodopovo.com.br/Noticias/Politica/2016/8/595627/Salarios-de-juizes-no-Brasil-superam-os-dos-EUA-e-da-Inglaterra
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