Uma
nova norma do Ministério da Justiça cria limites para o atendimento de
advogados aos presos custodiados nas penitenciárias federais. Segundo a
Portaria 4/2016, que cria regras para os profissionais terem contato com seus
clientes, o preso só pode ser atendido uma vez por semana e apenas por um
advogado constituído.
Os
advogados estão proibidos de transmitir informações que não têm relação direta
com o “interesse jurídico processual do preso” de forma verbal, escrita ou por
qualquer forma não audível, “inclusive mímica”.
Regras
valem para as quatro penitenciárias federais de segurança máxima do país.
Se
houver descumprimento, a conversa com o cliente será interrompida
imediatamente, conforme a portaria, assinada em junho pela diretora do Sistema
Penitenciário Federal, Valquiria Souza Teixeira de Andrade.
O
encontro com o cliente deve ser em dia e horário de expediente administrativo,
unicamente em parlatório, às segundas, terças ou sextas-feiras, mediante prévio
agendamento. A duração máxima da conversa será de uma hora. Se o advogado
comprovar a urgência do caso, a direção da unidade penitenciária poderá
autorizar mais de uma entrevista semanal, nos termos do Decreto 6.049/2007.
Já
existem relatos de que a regra está sendo aplicada. De acordo com reportagem do
portal UOL, advogados dos suspeitos de preparar atos terroristas para os Jogos
Olímpicos — presos recentemente na operação hashtag — afirmaram que foram impedidos de ver seus
clientes na sexta-feira (22/7). Os suspeitos estão detidos desde quinta-feira
no Presídio Federal de Campo Grande. A base legal para o impedimento, segundo
os advogados, foi a portaria do Ministério da Justiça.
A
norma afirma ainda que o advogado precisa estar constituído por procuração, com
indicação do processo, e comprovar no prazo de 30 dias ou na entrevista
seguinte a sua efetiva atuação no processo indicado. “No caso de advogado ainda
não constituído, a procuração, devidamente preenchida, deverá ser encaminhada
ao preso pelo núcleo jurídico da respectiva penitenciária federal, para fins de
análise e assinatura do indicado na procuração.”
Para
a diretora do Sistema Penitenciário Federal, “a organização por meio de
agendamento prévio de consultas e a limitação de requerimentos realizados
apresentam-se como medidas aptas a garantir um atendimento mais célere e
eficiente”.
Questionada
pela revista eletrônica Consultor Jurídico neste domingo (24/7), a assessoria
de comunicação do ministério ainda não respondeu se a norma já está plenamente
sendo aplicada nas quatro penitenciárias federais.
Retrocesso
O
presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Claudio
Lamachia, declarou que o impedimento ao trabalho da advocacia é uma afronta à
democracia. “A OAB adotará todas as ações necessárias para assegurar o exercício
profissional dos advogados e a imediata revisão da portaria do Ministério da
Justiça, se ela estiver em vigor”.
Ao
comentar o caso dos advogados impedidos de entrar no presídio federal, Lamachia
afirma que é “urgente e necessário” combater o terrorismo de “forma dura”. “Mas
o caminho de combater o crime cometendo outros crimes e violando prerrogativas
da advocacia leva o país ao retrocesso”.
Para
o criminalista Guilherme Batochio, conselheiro federal da Ordem, essas
proibições são “um verdadeiro absurdo”. “Medida típica de sistemas autoritários
e antidemocráticos. O arbítrio, ao que parece, vem fazendo prosélitos em toda
parte”, disse à ConJur.
“Como
saber, de antemão, o que consubstancia, ou não, ‘interesse jurídico do preso’?
O contato seria monitorado?, questiona o advogado. Batochio afirma que já
recebeu denúncias de monitoramento de conversas entre cliente e advogado no
presídio de Catanduvas e em Mato Grosso do Sul, quando integrava a Comissão
Nacional de Prerrogativas da OAB.
Repúdio
A
Associação Brasileira dos Advogados Criminalistas criticou neste domingo, em
nota, o que aconteceu com os advogados no presídio federal em Mato Grosso do
Sul. A entidade repudia obstáculos que possam solapar direitos fundamentais,
estabelecidos na Constituição e em lei federal, tanto de acusados como do livre
exercício profissional da advocacia.
A
Abracrim definiu a prática como constrangimento ilegal “sob escudo de ‘prática
de terrorismo'”. Para a entidade, o Judiciário deve atuar para impedir que esse
tipo de cerceamento volte a acontecer.
Segundo
a nota, a Constituição assegura que “o preso será informado de seus direitos,
entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da
família e de advogado”. E a Lei Federal
8906/94 assegura expressamente como direitos do advogado “exercer, com
liberdade, a profissão em todo o território nacional” e “comunicar-se com seus
clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se
acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares,
ainda que considerados incomunicáveis.”
*
Texto atualizado às 18h08 do dia 24/7/2016 para acréscimo de informações
Por
Marcelo Galli
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
http://www.conjur.com.br/2016-jul-24/penitenciarias-federais-criam-limites-advogados-proibem-mimica
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