Notícia
de ontem, no site da Folha, dá conta de uma gravação de áudio anexada a um dos
processos da Lava Jato no STF na qual é revelado o funcionamento de um
verdadeiro mercado de delações. Na gravação, Alexandre Margotto, ex-sócio de
Lúcio Bolonha Funaro, acusado de ser operador de Eduardo Cunha, pede dinheiro
para não delatar Funaro: "Eu quero estar do lado do Lúcio e que ele não me
desampare financeiramente nem juridicamente. Mas eu já quero cem pau agora, R$
100 mil".
Essa
gravação expõe toda a perversidade do funcionamento da Lava Jato. Primeiramente
há uma profusão inacreditável de delatores. Quem fecha o acordo de delação é
premiado com reduções generosas de pena, possibilidade de cumprir pena de
prisão em casa, etc. Treze delatores da Lava Jato condenados a penas que somam
283 anos de reclusão conseguiram reduzir esse tempo para menos de 7 anos graças
aos acordos de delação. Delatar é, portanto, um ótimo negócio.
E
quem valora a delação? Não é a lei, mas o procurador, de acordo com quaisquer
parâmetros subjetivos e, no caso da Lava Jato, explicitamente políticos. Ou
seja, o delator, para bem vender sua delação, precisa agregar valor a ela,
dizendo o que os procuradores e o juiz querem ouvir. Como estes atuam em
sintonia com a mídia cartelizada, ao cabo o delator delatará o que a mídia quer
ouvir.
É
um dos efeitos nefastos da relação fraterna entre MP e Justiça com a
"imprensa amiga", como referiu Sérgio Moro em um artigo sobre a
Operação Mãos Limpas. Moro e os procuradores não enxergam nada de errado nessa
parceria entre o sistema judicial e conglomerados de comunicação. Mas quando a
investigação bate às portas da Globo, como aconteceu na 22ª fase da Lava Jato,
oportunidade em que foram descobertas ligações entre a empresa dos Marinho e a
Mossack Fonseca, e a investigação simplesmente recua, fica mais do que evidente
a imoralidade e o conflito de interesses.
Os
bandidos, apavorados com a perspectiva de sofrerem uma condenação pesada, às
vezes presos por meses antes do julgamento, ficam com duas opções. A primeira é
entrar no jogo da operação. Os vazamentos seletivos, as operações com um timing
impecável para abafar fatos políticos favoráveis ao PT ou ao governo Dilma, a
perseguição alucinada a Lula, a nítida falta de qualquer investigação séria de
políticos do PSDB, como o citadíssimo Aécio Neves, enquanto são presos petistas
em série, deixam claro qual o jogo: delate alguém do PT e você pode ter seu
acordo de colaboração premiada.
Caso
não aconteça o acordo de delação, resta vender o seu silêncio para um
ex-comparsa, como fez Margotto. Perguntado pelo seu interlocutor sobre o que
poderia falar sobre a disputa entre Funaro e o grupo Schahin, Margotto falou:
"Não depor contra ele já é um grande favor. Eu sei toda a história do
Schahin". É óbvio que bandidos, em função mesmo da especialidade dos seus
crimes, irão usar a delação como mercadoria.
Para
tentar escapar das condenações medievalescas de Moro, ou vendem suas
informações ao Ministério Público (só as que interessam à dupla MP/mídia,
obviamente) ou vendem o seu silêncio a outros bandidos em troca de amparo
jurídico e financeiro. O Estado praticamente força réus a escolherem uma dentre
duas opções imorais. Trata-se de verdadeira barbárie cometida em nome da luta
contra a corrupção. Tudo sob aplausos generalizados, graças ao trabalho
semiótico diuturno da mídia concentrada. Assim como o Brasil, a Lava Jato não é
para amadores.
http://www.ocafezinho.com/2016/07/14/o-mercado-de-delacoes-criado-pela-lava-jato/
Nenhum comentário:
Postar um comentário