Nos Estados Unidos, a
denúncia sobre a farsa do impeachment de Dilma Rousseff, encampada por grandes
jornais como o The New York Times, ganha força agora entre parlamentares
norte-americanos. Em carta a John Kerry, 33 parlamentares pedem ao secretário
de Estado que se abstenha de declarações favoráveis ao golpista Michel Temer
(PMDB). A sugestão de matéria é de Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada.
Congressistas dos EUA
denunciam a ilegalidade do impeachment
Por Miguel Martins, com
Eduardo Graça, na CartaCapital
Em uma carta enviada na
sexta-feira 22 a John Kerry, secretário de Estado, 33 congressistas do Partido
Democrata e diversas entidades sociais e sindicatos, entre eles a influente
Federação Americana do Trabalho e Congresso de Organizações Industriais,
pediram ao integrante do governo de Barack Obama e provável representante
norte-americano nas Olimpíadas do Rio de Janeiro para lidar de forma cautelosa
com as "autoridades interinas" brasileiras e de se abster de declarações
ou ações passíveis de serem vistas como um apoio dos Estados Unidos à campanha
contra a presidenta eleita.
"Nosso governo deve
expressar sua forte preocupação com as circunstâncias que envolvem o processo
de impeachment e exigir a proteção da Constituição democrática no Brasil",
afirmam os signatários do documento ao qual CartaCapital teve acesso.
A carta seria endereçada a
Kerry na segunda-feira 25, mas teve o envio antecipado após seu vazamento para
a embaixada do Brasil em Washington. Ao receber a missiva, o Luiz Alberto
Figueiredo Machado, embaixador do Brasil nos EUA, encaminhou uma réplica aos
signatários na quarta-feira 20, na qual defende a legalidade do processo de
impeachment.
O esforço de Machado em
convencer os congressistas a rever sua posição mostra como a carta é incômoda
para o governo interino. A estratégia não deu certo. Em tréplica, o deputado
democrata Alan Grayson afirmou esperar que a correspondência dos parlamentares
"ajude a Administração a rever sua posição política em relação ao que
aconteceu no Brasil".
"Este não é um
julgamento legal, mas político, onde dois terços de um Senado tomado pela
corrupção podem dar fim ao mandato de Dilma", afirmam os parlamentares e
entidades na correspondência a Kerry. "O processo de impeachment está sob
críticas de irregularidades de procedimentos, corrupção e motivações políticas
desde seu início. O governo dos EUA deveria expressar sua preocupação sobre a
ameaça às instituições democráticas que se desdobra em um dos nossos mais
importantes aliados econômicos e políticos da região."
A carta tece duras críticas
ao presidente interino: "Michel Temer chegou ao poder e imediatamente
substituiu uma administração progressista, diversa e representativa por outra
que inclui apenas homens brancos a anunciar planos de impor a austeridade, a
privatização e uma agenda de extrema-direita". O documento lista ainda o
pacote de maldades prometido pelo governo interino e a "divisão
profunda" da sociedade brasileira.
A carta relata também a
queda do ex-ministro Romero Jucá por causa da divulgação de sua conversa com
Sérgio Machado, operador do PMDB na Lava Jato e um dos delatores da operação, e
registra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo que considerou
Temer ficha-suja e o tornou inelegível, "incluindo para o cargo que
atualmente ocupa", por oito anos.
Os congressistas e entidades
alertam Kerry do fato de Dilma Rousseff jamais ter sido acusada de corrupção e
que as pedaladas fiscais, motivo alegado para seu afastamento, são
"práticas utilizadas largamente em todos os níveis de governo no Brasil,
incluindo seus dois antecessores".
Em conclusão, os
congressistas e entidades se dizem preocupados com os sinais emitidos pelo
governo americano que "podem ser interpretados como um apoio" ao
afastamento de Dilma. "Pelo fato de muitos brasileiros terem rotulado o
processo de impeachment como um 'golpe' contra a presidenta brasileira eleita,
é especialmente importante que as ações dos EUA não sejam interpretadas como
favoráveis ao impeachment."
Eles lembram ainda que, em
19 de abril, dois dias após a Câmara dos Deputados ter votado o afastamento de
Dilma, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) reuniu-se com Thomas Shannon,
subsecretário de Estado para Assuntos Políticos. "Essa medida foi
interpretada como um gesto de apoio ao afastamento de Dilma do cargo."
Ao saber do conteúdo da
carta, o embaixador Figueiredo enviou a réplica a cada um dos congressistas
afirmando estar "surpreso". "Permita-me esclarecer que o
processo de impeachment de Dilma Rousseff está sendo realizado de acordo com as
exigências da lei brasileira", afirma o diplomata. "A Constituição
brasileira está sendo respeitada de forma rigorosa pelas três esferas de
governo, um fato que pode ser corroborado a partir de uma análise cuidadosa e
imparcial."
"Eu sublinho que a
firme batalha contra a corrupção tem o apoio da grande maioria da população
brasileira e tem gerado demonstrações de admiração e apreciação da comunidade
internacional", emenda o embaixador, para então defender o interino.
"Temer expressou publica e repetidamente seu comprometimento na luta
contra a corrupção e em manter o ritmo das investigações em curso no Brasil
livres de qualquer tipo de viés político ou partidário".
Em uma linha semelhante à
desqualificação do New York Times por seus editoriais críticos ao impeachment,
o embaixador afirma que considerar o processo manchado por
"irregularidades, corrupção e motivações políticas" revela
"desconhecimento do sistema jurídico brasileiro".
A carta segue o discurso
falacioso. "O respeito às regras orçamentárias esteve presente no Brasil
em cada Constituição brasileira como um dever que um dirigente público não pode
negligenciar." O festival de enganação não arrefece até o último alento.
"O embaixador não
reconhece problema algum com o processo, apesar de diversas organizações
internacionais, veículos de mídia, intelectuais, acadêmicos, organizações da
sociedade civil, artistas, mulheres e grupos de direitos humanos terem
manifestado uma séria preocupação com a falta de transparência do
processo", diz Maria Luísa Mendonça, coordenadora da rede Social Justiça e
Direitos Humanos.
Resta saber se Kerry, também
democrata, se sensibilizará com a denúncia de seus correligionários quando vier
ao Brasil para os Jogos Olímpicos.
http://www.brasil247.com/pt/247/mundo/245354/Congressistas-americanos-denunciam-golpe-no-Brasil.htm
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