O
ex-presidente turco Abdullah Gul, ao condenar a tentativa de golpe de Estado
militar em seu país, abortada pela mobilização popular e a liderança do
presidente Erdogan, revelou-se mal informado ao dizer que “a Turquia não é um
país da América Latina” para ter um golpe de Estado, não é um destes países,
disse citando também os africanos, “que têm governos depostos da noite para o
dia". Não que golpes inexistam por aqui. Eles acontecem, mas agora são
muito mais sofisticados, como foram no Paraguai, em Honduras e agora no
Brasil. Dispensam o uso do Exército, da
força bruta, dos tanques e baionetas. Diante dos “nossos” golpes, o da Turquia
soa obsoleto e tosco, e também por isso foi mais fácil abortá-lo.
Golpes
eficientes são estes recentes na América Latina, com verniz de legalidade,
combinando frentes de ataque jurídico-judicial, midiática e parlamentar. Com tão refinada engrenagem, as forças que
realmente movem o golpe nem precisam se expor.
Elas são nacionais e estrangeiras mas estas últimas já não precisam
movimentar esquadras para invadir o território do golpe, se preciso for, como
em 1964. Com a força da mídia sobre corações e mentes, os modernos golpes latino-americanos, que Gul
desconhece, conseguem até mesmo mobilizar apoiadores no papel de “povo”. Criado
o ambiente político propício, os neo-golpistas do continente precisam de
partidos dispostos a violar a soberania do voto popular e de alguém disposto ao papel de usurpador da
cadeira do presidente eleito a ser deposto. É um processo mais complexo, mais
demorado porém mais eficiente. Mais difícil de ser barrado ou revertido.
Muitas
análises comparativas sobre o golpe em curso no Brasil e o golpe abortado na
Turquia estão sendo publicadas,
concluindo sempre que os processos são muito distintos. Há quem lamente
a passividade dos brasileiros, a falta de uma insurgência popular enérgica como
houve na Turquia. Mas como convencer os
que estão tendo seu voto desrespeitado a reagir
contra um processo conduzido pelas “autoridades”? Para os turcos, o golpe estava nos tanques e
nos pelotões armados, contra os quais se insurgiram, usando inclusive seus
corpos indefesos. Já o brasileiro que votou em Dilma não viu um tanque
investindo contra seu voto, mas deputados e senadores, e de vez em quando, ministros
do STF determinando o rito do afastamento.
Uma
diferença, entretanto, foi pouco registrada. Na Turquia, todos os partidos, inclusive os de oposição
ao presidente Erdogan, condenaram o golpe e se posicionaram em defesa da
democracia como valor a ser preservado.
Lá, como aqui, há uma grande divisão na sociedade em relação ao governo
de Erdogan, que também apresenta traços autoritários e viés
fundamentalista. Não foi em defesa exclusivamente dele e de seu
mandato, mas do respeito às regras democráticas, que os turcos vararam a noite
em confrontos, e mais de 200 perderam a vida.
No
sofisticado golpe brasileiro, todos os partidos se juntaram na condução do
“golpeachment, com exceção dos cinco partidos de esquerda: PT, PC do B, PDT,
PSOL e a Rede (parcialmente). Na nova
tecnologia de golpes latino-americanos,
a maioria dos partidos, quando estão perdendo, quebram a regra do jogo
para fazer o gol de mão. Essa nova
tecnologia de golpe é que o ex-presidente turno revela não conhecer.
http://www.brasil247.com/pt/blog/terezacruvinel/244477/A-Turquia-e-as-novas-tecnologias-de-golpe.htm
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