“Sinto-me
feliz, todas as noites, quando ligo a televisão para assistir ao jornal. Enquanto
as notícias dão conta de greves, agitações, atentados e conflitos em várias
partes do mundo, o Brasil marcha em paz, rumo ao desenvolvimento. É como se eu
tomasse um tranquilizante, após um dia de trabalho”, declarou o presidente
general Médici, em março de 1973, ao falar sobre o Jornal Nacional, da TV
Globo.
Após
mais de 40 anos, o Tribunal Federal Oral 1, de Buenos Aires, concluiu nessa
sexta-feira (27/5) o julgamento histórico dos responsáveis pela Operação Condor
– nunca reconhecida oficialmente –, sentenciando 17 ex-militares acusados de
participar de ações coordenadas entre as ditaduras da América do Sul, que
envolvem o desaparecimento de 105 vítimas, incluindo argentinos, uruguaios,
chilenos, paraguaios, entre outros, nas décadas de 70 e 80.
O
processo criminal – iniciado em 1999, mas impulsionado a partir de 2006, quando
a Suprema Corte anulou as leis do Ponto Final (1986) e da Obediência Devida
(1987) – tornou-se inédito pela quantidade de provas produzidas. Foram milhares
de documentos coletados em diferentes países, além de centenas de depoimentos,
prestados tanto por vítimas como por seus familiares, contendo informações
sobre prisões, torturas, sequestros e assassinatos, praticados em todos os
países do Cone Sul, com o apoio dos Estados Unidos.
Na
sessão iniciada às 17h, que contou com a presença das Mães da Praça de Maio, a
leitura do dispositivo da sentença – transmitida, ao vivo, pelo Youtube através
de canais da justiça argentina – foi efetuada pelo juiz Pablo Gustavo Laufer,
juntamente com seus colegas de câmara, os juízes Adrián Federico Grünberg,
Oscar Ricardo Amirante e Ricardo Angel Basílico.
Dos
32 acusados constantes na denúncia – entre os quais contava o falecido
ex-ditador general Jorge Rafael Videla – restaram apenas 17. Destes, 15 foram
condenados por crimes de contra a humanidade e violações aos direitos humanos.
Entre as condenações mais altas, Santiago Omar Riveros, Manuel Juan Cordero
Piacentini e Miguel Ángel Furci receberam 25 anos de prisão. O ex-ditador
Reynaldo Benito Bignone, assim como Rodolfo Emilio Feroglio, foi condenado à
pena de 20 anos de prisão. Os fundamentos da sentença serão divulgados pelo
tribunal somente no dia 9 de agosto deste ano, data para a qual foi designada a
audiência pública em que será lida motivação da decisão.
Tudo
indica, entretanto, estarmos diante de um precedente histórico em matéria de
direitos humanos, uma vez que revela o verdadeiro sistema criminal
institucionalizado pela Operação Condor. Entre os autores da ação penal, além
da procuradoria, estão o Centro de Estudios Legales y Sociales (CELS) e a
Secretaría de Derechos Humanos da Argentina.
Além
de emblemática e simbólica, a decisão penal confirma que a Operação Condor
transcendeu fronteiras, não apenas geográficas, e que os crimes praticados
envolveram a cooperação do governo de diferentes países, entre eles o Brasil.
Esperamos que os desdobramentos dessa sentença prolatada pela justiça argentina
atinja a Corte Internacional de Direitos Humanos. Eis a única possibilidade de
se reverter o caminho trilhado pelo Supremo Tribunal Federal, em 2010, quando
optou pela via da contramão.
http://www.conjur.com.br/2016-mai-28/diario-classe-justica-argentina-condena-ex-militares-crimes-operacao-condor
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