Toda
a trama golpista que se escancarou nas gravações de Sérgio Machado não
precisaria, a rigor, dos “grampos” pra ser conhecida e revelada.
Jornalismo
e análise política, se não estivessem postos a serviço da histeria golpista,
poderiam tê-la dado a conhecer porque, afinal, era sabida e evidente pelos
gestos de seus promotores.
O
mais perverso, em tudo isso, é que passamos a considerar “normais” situações
como as que cruamente descreve Janio de Freitas, hoje, na Folha:
Um
homem procura colegas que o têm por confiável, incluído aquele a quem deve o
emprego magnífico usufruído por dez anos. Mesmo sem ser explícito, faz entender
que busca ajuda solidária para o risco angustiante de ser entregue, por atos de
sua plena responsabilidade, a um juiz que valoriza a cadeia como passo
preliminar. O homem conduz as conversas, em sutis induções e insistências.
Grava-as, sem disso ser suspeitado. Não se sabe quantas foram, nem quantos os
gravados.
O
homem divulga várias gravações. Gravado que não se comprometeu com propostas
condenáveis, passa, no mínimo, pelos dissabores do escândalo. Os que se
mostraram mais solícitos com as angústias do colega, porém, fosse por
solidariedade ou por combiná-la com sua própria situação, foram –como outros
vão ser– por ele entregues às feras, com suas situações agravadas. Por tal
atitude, o homem será premiado pela Justiça.
Assim,
sem nomes (embora todos conhecidos), o julgamento moral do prêmio fica mais
evidente.
Que
tipo de sistema judicial pode-se ter quando ele baseia seus métodos no “dedure
que eu te solto?”
E,
sobretudo, no “”divulgo o que me interessa e quando me interessa”?
Infelizmente,
não apenas a mídia, mas a própria consciência jurídica do país está acolhendo
estes métodos abjetos porque, afinal, o fim seria nobre: restabelecer a dita
“moralidade”.
Desta
sentença – os fins justificam os meios – não é preciso falar, não é? Sempre foi
o argumento do conservadorismo para contestar e tornar monstruosas as ações
transformadoras, revolucionárias, que precisaram atropelar as regras do
status-quo.
Como
também não preciso lembrar do discurso da direita contra os líderes
messiânicos, os “puros”, os portadores da verdade absoluta e da salvação da
pátria, entregue à danação da desonra. Quando, porém, o “salvador” é de seu
campo – um Collor, um Moro – desaparecem seus senões e surge a louvação, cace
ele marajás ou corruptos.
É
sábia a advertência de Mauro Santayanna, dias atrás:
É
preciso entender que o movimento permanente de criminalização da política e o
nivelamento por baixo de todos os partidos e homens públicos, frente à
“justiça” e à população, não favorece, por si só, à Democracia, e só pode
fortalecer, pelo contrário, ao Fascismo, que continua brilhando, estelar e
faceiro, e sendo profusamente incensado, a cada semana, a cada dia, a cada novo
episódio da “novela” política brasileira, pela mesma parcela da mídia
conservadora e entreguista de sempre.
Quando
se destrói a política como meio de solução de conflitos e legitimação do poder
político numa sociedade, o que sobra, só, é a ditadura, a imposição da verdade
por um homem, por uma casta – como foi com os militares, porque não seria com a
toga? – e, sempre, pela classe dominante.
O
processo de acanalhamento da sociedade brasileira vai muito além de termos
canalhas na política ou em cargos de governo. Já os tivemos e, talvez, seja
melhor até perguntar quando não os tivemos.
Está
sendo cuidadosamente desenvolvido há anos, em nome de um elogio da esperteza,
da traição e do “levar vantagem” próprios da selvageria.
Porque,
a rigor, a frase se inverte na realidade: são os meios que determinam os fins e
acabam por denunciá-los.
O
discurso das elites brasileiras é de que o Brasil é um país de sem-caráter.
Não
é. Embora, frequentemente elas o sejam.
Por
Fernando Brito
http://www.tijolaco.com.br/blog/somos-mesmo-um-pais-de-ladroes-canalhas-e-alcaguetes-ou-estao-nos-deixando-assim/
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