Com
o golpe, o Barão do Rio Branco anda em baixa no Itamaraty. Sua figura ímpar de
negociador hábil e arguto, afeito à força dos argumentos, vem sendo substituída
por figura menor, prosaica, mais afeita ao argumento da força e à discutível
efetividade dos decibéis, das ameaças e dos insultos.
Claro
está que o governo ilegítimo tem um problema muito sério de imagem
internacional. O motivo é óbvio. Golpes contra a democracia não são mais tão
populares como eram há algumas décadas. Antes saudados como
"ressurgimentos da democracia" e "revoluções" que nos
salvavam da "ameaça comunista", os golpes agora costumam ser vistos
(pasmem!) como golpes.
Em
vez de euforia cívica, eles agora despertam asco moral, mesmo quando
escrupulosamente vestidos pelos ritos constitucionais do impeachment. No caso
do golpe parlamentar brasileiro, o apego à forma não conseguiu ocultar o
desapego à questão de mérito: não há crime imputável à presidenta já afastada,
ao contrário do que acontece com seus algozes.
A
"assembleia geral de bandidos presidida por um bandido", expressão
que Miguel de Souza Tavares encontrou para designar o circo de horrores da
sessão da Câmara que deu início ao golpe, desnudou ao mundo inteiro o que
ocorria no Brasil: uma presidenta honesta estava sendo acusada por figuras com
a credibilidade de punguistas do baixo meretrício.
Como
previsível, o espetáculo de gosto duvidoso, mistura improvável de Ionesco com
comédia pastelão, não agradou as plateias mundiais, que a ele reagiram com
divertida incredulidade e triste nojo.
Não
tardou para que para que jornais do mundo inteiro, inclusive os mais
conservadores, passassem a designar a fraude do impeachment sem crime como
golpe ou, pelo menos, a questionar se esse tosco processo político poderia
contribuir para superação da crise política no Brasil. Reação pudica e de bom
senso ante a histeria desavergonhada dos golpistas.
Também
de modo previsível, muitas organizações internacionais importantes, como a OEA,
a Unasul, a Cepal, a ONU Mulheres e várias outras expressaram seu repúdio ou
sua preocupação com o golpe parlamentar em curso.
Consumado
o afastamento da presidenta, vários governos da América Latina, eleitos de
forma legítima, condenaram oficialmente o golpe de
Estado
ocorrido no Brasil. Alguns, como os de El Salvador e Venezuela, chamaram de
volta seus embaixadores em Brasília.
Ao
que consta, nenhum governo do mundo fez declaração de apoio ao governo
ilegítimo do Brasil. Mesmo quem não condenou oficialmente, mantém cautela e
prudente distância. Talvez inspirados no PSDB, esperam para ver o que vai dar.
Ora,
ante tal quadro de fragilidade seria de esperar que o novo inquilino do
Itamaraty agisse com a sabedoria e a argúcia do Barão do Rio Branco. Usasse
palavras conciliadoras e tom moderado, mesmo na defesa do indefensável. Afinal,
há aqui uma gritante assimetria que precisa ser levada em consideração: os
governos que criticam o golpe brasileiro têm os eleitores de seus países a
secundá-los, ao passo que o governo provisório e ilegítimo do Brasil não foi
eleito por ninguém.
Mas
o que se vê é exatamente o contrário e o que se ouve são decibéis estridentes,
a adornar ameaças e insultos.
No
caso da nota sobre El Salvador, acusou-se o governo daquele país de ignorância
sobre "a Constituição e a legislação brasileiras, sobre o rito aplicável
em processos de impedimento e sobre o pleno funcionamento das normas e
instituições democráticas no país". Também se fez uma ameaça, não tão
velada assim, baseada no fato de que El Salvador é o maior beneficiário da
cooperação técnica brasileira na América Central.
No
caso da Unasul, a cordata resposta oficial da nossa nova "diplomacia"
foi a desqualificação de seu Secretário-Geral, Ernesto Samper. Não bastasse, a
equilibrada gestão diplomática do Barão da Mooca acusou governos da Venezuela,
Bolívia, Equador e Nicarágua de "propagar falsidades" sobre o Brasil.
Pelo
visto, o novo inquilino do MRE que renovar a tradição, denunciada por Chico
Buarque, de falar grosso com a Bolívia e países semelhantes.
Pena
que essa vigorosa e agressiva defesa da nossa soberania, ameaçada por potências
imperialistas como El Salvador e Bolívia, tenda a se esvair quando esses
supostos defensores do Brasil começarem a negociar acordos assimétricos de
livre comércio com países modestos e pacíficos como os EUA. Nesse caso, se
falará fino. Bem fino.
Não
e a primeira vez que o atual locador do Palácio do Itamaraty distribui
grosserias contra países da América Latina. Inimigo declarado da Integração
Regional, ele já chamou o Mercosul de "farsa" e "delírio
megalomaníaco". Nunca conseguiu disfarçar seu desprezo por países menores e
pobres, principalmente africanos, latino-americanos e caribenhos, nos quais
pretende fechar nossas embaixadas. Mas, justiça seja feita, sempre se encantou
com o circuito Elizabeth Arden.
Na
época, tinha como atenuante o fato de ser mero candidato. Agora, ocupando a
cadeira que já foi do Barão de Rio Branco, deveria ao menos respeitar as boas
tradições da Casa. Mesmo de governo ilegítimo, ele é, de facto, o chanceler do
Brasil.
Sua
tonitruante diplomacia talvez vista bem no golpe, mas serve mal ao País.
http://www.brasil247.com/pt/colunistas/marcelozero/233019/A-tonitruante-diplomacia-do-Bar%C3%A3o-da-Mooca.htm
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