Por
considerar uma atitude "selvagem", que infringe os direitos
processuais dos envolvidos, o Tribunal Penal Federal da Suíça considerou ilegal
a entrega de documentos pelo Ministério Público do país a procuradores do
Ministério Público Federal brasileiro que atuam na operação "lava
jato".
Os
documentos em questão foram considerados pelo juiz Sergio Fernando Moro,
responsável pelos processos da operação em primeira instância, “provas
materiais principais” do processo contra os executivos da construtora Odebrecht.
O
tribunal suíço, no entanto, aponta que foram enviados dados bancários sigilosos
de maneira ilegal, uma vez que houve produção de provas (no caso, documentos
bancários) disfarçada de um pedido de cooperação jurídica internacional.
"Proceder
dessa maneira torna os mecanismos
próprios de cooperação jurídica internacional ineficazes e, assim,
infringe os direitos processuais outorgados ao Apelante no âmbito dos
procedimentos de cooperação jurídica internacional”, diz o tribunal suíço em
sua decisão.
Esta
não é a primeira vez que as provas recebidas pelo MPF das autoridades suíças
são questionadas. Um pendrive recebido pelo MPF em novembro de 2014 com dados
de contas bancárias relacionadas relacionadas a “Paulo Roberto Costa, Alberto
Youssef e outros” também é questionado. Os documentos teriam sido entregues sem
seguir as exigências legais para cooperação.
Dados
sigilosos
O
questionamento do envio de dados na Suíça foi feito por umas das empresas
offshore que foi apontada por investigadores da "lava jato" como uma
das companhias utilizada para pagar propinas a ex-diretores e gerentes da
Petrobras. Os dados bancários dessa empresa foram enviados pelo MP suíço e
utilizados como prova na "lava jato".
A
promotoria suíça, que também investiga esquema de corrupção e lavagem de
dinheiro envolvendo a empreiteira naquele país, enviou ao Brasil um pedido de
cooperação pedindo que diversas pessoas envolvidas na "lava jato"
fossem interrogadas.
Junto
com as perguntas a serem feitas, porém, foram enviados diversos documentos
bancários sigilosos, inclusive alguns que já haviam sido solicitados pelo
Brasil como provas de que houve pagamento de propina feito pela Odebrecht.
Inconformada
com a atitude, a offshore recorreu ao Tribunal Penal Federal da Suíça afirmando
que o envio dos dados foi ilegal, uma vez que houve produção de provas
disfarçada de cooperação.
Ao
analisar o caso, o tribunal concluiu que houve um caso de entraide sauvage
("auxílio judicial selvagem", em tradução livre do francês). Na
decisão, a corte ressaltou que em alguns casos o envio de dados sigilosos é
permitido no processo rogatório. "Porém, o fornecimento de provas
caracteriza uma forma da 'entraide sauvage' repudiada", diz a sentença.
"Através
de seu procedimento, o Apelado [Promotoria suíça] privou o Apelante [empresa]
do direito de se pronunciar, quanto à transmissão de seus documentos bancários,
ao decorrer do processo rogatório. Uma aprovação de tal procedimento impediria
a possibilidade de uma avaliação judicial da transmissão efetuada dos
documentos bancários e inviabilizaria a proteção jurídica individual, prevista,
contudo, no direito rogatório", concluiu o tribunal.
Assim
a corte suíça considerou ilegal a transmissão de documentos bancários enviados
às autoridades brasileiras e determinou que a promotoria deverá iniciar novo
processo rogatório relativo à transmissão dos documentos bancários da empresa.
Fora
dos autos
Com
base na decisão do tribunal suíço, a defesa do executivo da Odebrecht Marcio
Faria da Silva pediu o desentranhamento das provas da ação penal que resultou
em sua prisão.
"Tendo
a Justiça do país que coletou e entregou a prova ao Brasil declarado que a
entrega foi ilegal, essa prova não pode ser admitida neste ou em qualquer outro
processo", diz a petição protocolada nesta terça-feira (2/2) pelos
advogados Dora Cavalcanti Cordani e Rafael Tucherman, do Cavalcanti &
Arruda Botelho Advogados.
Os
advogados lembram que o próprio juiz Sergio Moro afirmou que “as provas
materiais principais” do processo são os documentos bancários anexados ao
pedido de cooperação encaminhado pela Suíça ao Brasil em 16 de julho de 2015.
Além
disso, em outra ocasião, ao prestar esclarecimentos sobre as prisões ao
ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki, Moro registrou que o
segundo decreto de prisão de Márcio Faria deveu-se “principalmente” à chegada
desses mesmos documentos bancários suíços.
A
defesa de Marcio Faria critica ainda o silêncio do juiz sobre os inúmeros
questionamentos feitos à respeito das provas que "casualmente"
chegaram às mãos do Ministério Público. " Com esteio no mantra de que 'o
processo é uma marcha para a frente', Vossa Excelência passou os últimos seis
meses indeferindo seguidos pleitos da defesa para esclarecer o tema", diz
trecho da petição.
Copo
meio cheio
Para
o Ministério Público Federal, a decisão do tribunal suíço não altera o processo
no Brasil pois a corte suíça não determinou a devolução dos documentos. Assim,
para o MPF, a decisão não tem qualquer efeito sobre a acusação criminal contra
executivos da empresa, amparada em amplas provas de pagamentos de propinas no
Brasil e no exterior e do desvio de bilhões de reais dos cofres públicos.
Cerca
de uma hora depois de a ConJur publicar a notícia sobre o caso, a Procuradoria
da República no Paraná enviou um texto a jornalistas sobre o caso, cujo título
é "Odebrecht sofre derrota na Justiça suíça". Segundo o release do
MPF, "o tribunal suíço concedeu à empresa apenas o direito a um recurso
interno, tal qual ocorreria caso o pedido de cooperação tivesse partido do
Brasil para a Suíça".
Fonte.
Tadeu Rover. Conjur
http://www.conjur.com.br/2016-fev-02/tribunal-suico-reconhece-ilegalidade-envio-documentos-brasil
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