A
nova lei que garante acesso a todos os documentos de uma investigação considera
nulos interrogatórios ou depoimentos colhidos de pessoa investigada sem
assistência de seu advogado, incluindo todos os elementos de prova decorrentes
ou derivados dessas falas. A regra foi fixada pela Lei 13.245/2016, publicada
nesta quarta-feira (13/1).
A
Lei 10.792/2003 já considerava obrigatória a presença de um defensor durante o
interrogatório do investigado preso, no curso do processo penal. A novidade é
que agora fica expressa a prerrogativa do advogado de acompanhar fases
preliminares de investigação — e não só perante a autoridade policial, mas em
apurações movidas por “qualquer instituição”, como o Ministério Público e o
Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
Se
o profissional for barrado, haverá nulidade absoluta “do respectivo
interrogatório ou depoimento e, subsequentemente, de todos os elementos
investigatórios e probatórios dele decorrentes ou derivados, direta ou
indiretamente”, conforme a nova regra, que altera o artigo 7º do Estatuto da
Advocacia (Lei 8.906/1994).
O
Superior Tribunal de Justiça já negou anular confissão de uma ré que, mesmo
avisada sobre os direitos de permanecer em silêncio e de ser acompanhada por um
advogado, aceitou falar sem a companhia de ninguém. Para o autor do projeto de
lei, deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), a partir de agora nem o
investigado pode abrir mão da garantia. Quando não tiver advogado, é obrigação
das autoridades providenciar dativo ou defensor público, avalia.
Já
o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, entende que a presença
do advogado “fica no campo da autonomia da manifestação de vontade”, como no
caso de pessoas convocadas para depor em comissões parlamentares de inquérito.
Exigir que um defensor sempre acompanhe o interrogatório na polícia, para o
ministro, “seria burocratizar demasiadamente o inquérito”. Na jurisprudência da
corte, o inquérito policial é visto como peça meramente informativa, não
suscetível de contraditório.
Assim,
segundo Marco Aurélio, a nova lei segue jurisprudência do próprio Supremo, que
garante prerrogativas do profissional do Direito — o acesso aos elementos que
fazem parte de apurações, por exemplo, é pacificado pela Súmula Vinculante 14.
O
criminalista José Roberto Batochio entende que o acompanhamento de perto é
relevante porque, na área criminal, a fase de investigação é uma parte da
persecução penal. “Não é uma lei corporativista, benéfica apenas para a
advocacia. É importante para cidadania, consagra direitos de todos”, afirma.
De
acordo com o advogado Ademar Gomes, presidente da Associação dos Advogados
Criminalistas do Estado de São Paulo (Acrimesp), haverá vantagens até para a
polícia, o MP e o próprio processo penal. “É muito comum que o réu recue de
depoimentos prestados na fase do inquérito sob o argumento de que foi coagido.
A presença do advogado dará mais credibilidade ao inquérito policial.” Ainda
segundo ele, autoridades começarão a ter mais cautela na hora de ouvir
investigados, inclusive podendo indicar, nas intimações, que o advogado pode
estar presente.
Efeito
colateral
O
criminalista Bruno Rodrigues chama a atenção para um problema: quem não tiver
advogado constituído nem declarar ter advogado logo na chegada à delegacia
continuará a ser interrogado sem a presença de um defensor. “Isso gera uma
discriminação econômica, pois o leigo, normalmente mais pobre, se for
questionado, vai dizer que não tem advogado e prestar o depoimento antes que um
defensor seja designado”, explica.
A
solução para isso, na visão do advogado carioca, é uma nova mudança no Estatuto
da Advocacia, no seu artigo 2º, que considera o advogado indispensável à
administração da Justiça. Como o parágrafo 3º fala da função do profissional no
processo judicial, deveria ter outro para fixar a obrigatoriedade de sua
presença em todos os atos de investigação e inquéritos, afirma Rodrigues.
Ele
também critica veto da presidente Dilma Rousseff (PT) ao inciso que permitia ao
advogado requisitar diligências durante a apuração de infrações. Segundo ele,
essa garantia impediria o inquérito policial inquisitorial, “onde os
investigadores fazem o que querem, descartando o que lhes convêm”.
Especialistas ouvidos pela revista Consultor Jurídico, no entanto, dizem que a
supressão do trecho não impede pedidos de diligências.
Atuação
plena
Em
artigo publicado na ConJur, o professor Gamil Föppel El Hireche e o
pós-graduando Pedro Ravel Freitas Santos consideram que o termo “assistência ao
investigado” não pode se limitar ao acompanhamento da oitiva. “Necessário que
se permita a formulação de quesitos quando da oitiva de testemunhas e/ou
suposta vítima, que se possibilite ao causídico o acompanhamento pormenorizado
do quanto investigado.”
Os
delegados Henrique Hoffmann Monteiro de Castro e Adriano Sousa Costa afirmam,
também em artigo à ConJur, que “sempre foi uma luta dos advogados ter voz ativa
no contexto de apurações inquisitoriais”. “Frequentemente, os advogados queriam
expor razões ao presidente das investigações, bem como fazer questionamentos
circunstanciados a seus clientes, e acabavam sendo silenciados, sob o argumento
de que não deveriam interferir no curso da oitiva”, afirmam. Segundo o texto, o
dispositivo recém-sancionado “garante ao causídico, além de poder assistir o
seu cliente quando de sua oitiva, também justificar fatos e formular perguntas
que auxiliem na apuração”.
O
advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira diz que as garantias fixadas nem
precisariam de norma específica, pois são necessárias ao pleno exercício do
direito de defesa fixado na Constituição Federal. Porém, é entusiasta da nova
lei, pois mesmo nos dias atuais já teve negados pedidos para acessar
inquéritos. Ele afirma que até durante o regime militar conseguia ver processos
sem dificuldade.
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
http://www.conjur.com.br/2016-jan-15/proibir-advogado-assistir-interrogatorio-torna-investigacao-nula?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter
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