Tese de doutorado começa
mapear a teia de relações aristocráticas e capitalistas que torna Justiça tão
favorável ao poder e hostil aos pobres
Há, no sistema jurídico
nacional, uma política entre grupos de juristas influentes para formar alianças
e disputar espaço, cargos ou poder dentro da administração do sistema. Esta é a
conclusão de um estudo do cientista político Frederico Normanha Ribeiro de Almeida
sobre o Judiciário brasileiro. O trabalho é considerado inovador porque
constata um jogo político “difícil de entender em uma área em que as pessoas
não são eleitas e, sim, sobem na carreira, a princípio, por mérito”.
Para sua tese de doutorado A
nobreza togada: as elites jurídicas e a política da Justiça no Brasil,
orientada pela professora Maria Tereza Aina Sadek, da Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, Almeida fez entrevistas, analisou
currículos e biografias e fez uma análise documental da Reforma do Judiciário,
avaliando as elites institucionais, profissionais e intelectuais.
Segundo ele, as elites
institucionais são compostas por juristas que ocupam cargos chave das
instituições da administração da Justiça estatal, como o Supremo Tribunal
Federal (STF), Superior Tribunal de Justiça, tribunais estaduais, Ministério
Público, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Conselho Nacional de Justiça
(CNJ).
Já as elites profissionais
são caracterizadas por lideranças corporativas dos grupos de profissionais do
Direito que atuam na administração da Justiça estatal, como a Associação dos
Magistrados Brasileiros, OAB e a Confederação Nacional do Ministério Público.
O último grupo, das elites
intelectuais, é formado por especialistas em temas relacionados à administração
da Justiça estatal. Este grupo, apesar de não possuir uma posição formal de
poder, tem influência nas discussões sobre o setor e em reformas políticas,
como no caso dos especialistas em direito público e em direito processual.
No estudo, verificou-se que
as três elites políticas identificadas têm em comum a origem social, as
universidades e as trajetórias profissionais. Segundo Almeida, “todos os
juristas que formam esses três grupos provêm da elite ou da classe média em
ascensão e de faculdades de Direito tradicionais, como o Faculdade de Direito
(FD) da USP, a Universidade Federal de Pernambuco e, em segundo plano, as
Pontifícias Universidades Católicas (PUC’s) e as Universidades Federais e
Estaduais da década de 60”.
Em relação às trajetórias
profissionais dos juristas que pertencem a essa elite, Almeida aponta que a
maioria já exerceu a advocacia, o que revela que a passagem por essa etapa
“tende a ser mais relevante do que a magistratura”. Exemplo disso é a maior parte
dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), indicados pelo Presidente da
República, ser ou ter exercido advocacia em algum momento de sua carreira.
O cientista político também
aponta que, apesar de a carreira de um jurista ser definida com base no mérito,
ou seja, via concursos, há um série de elementos que influenciam os resultados
desta forma de avaliação. Segundo ele, critérios como porte e oratória
favorecem indivíduos provenientes da classe média e da elite socioeconômica,
enquanto a militância estudantil e a presença em nichos de poder são fatores
diretamente ligados às relações construídas nas faculdades.
“No caso dos Tribunais
Superiores, não há concursos. É exigido como requisito de seleção ‘notório
saber jurídico’, o que, em outras palavras, significa ter cursado as mesmas
faculdades tradicionais que as atuais elites políticas do Judiciário cursaram”,
afirma o pesquisador.
Por fim, outro fator
relevante constatado no levantamento é o que Almeida chama de “dinastias
jurídicas”. Isto é, famílias presentes por várias gerações no cenário jurídico.
“Notamos que o peso do sobrenome de famílias de juristas é outro fator que
conta na escolha de um cargo-chave do STJ, por exemplo. Fatores como estes
demonstram a existência de uma disputa política pelo controle da administração
do sistema Judiciário brasileiro”, conclui Almeida.
http://racismoambiental.net.br/2015/11/27/para-desvendar-o-elitismo-do-judiciario-brasileiro/
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