Mãe e filho requereram a anulação da transferência de
imóveis doados pelo ex-marido e pai para a amante, com quem teve dois filhos,
descobertos após seu falecimento.
Acompanhando o voto do relator, ministro Luis Felipe
Salomão, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou acórdão do
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia julgado improcedente uma ação
de nulidade envolvendo a doação de imóveis do casal feita por cônjuge adúltero
em favor da concubina.
Mãe e filho requereram a anulação da transferência de
imóveis doados pelo ex-marido e pai para a amante, com quem teve dois filhos,
descobertos após seu falecimento. O casal se divorciou e a ação ordinária de
nulidade de ato jurídico contra a concubina foi ajuizada somente oito anos
depois, quase dois anos após a morte do ex-marido.
De acordo com os autos, parte do “considerável patrimônio”
construído durante os 46 anos de casamento em regime de comunhão universal de
bens foi transferida à concubina mediante procuração que já havia sido revogada
pela ex-esposa.
O tribunal paulista julgou a ação improcedente, ao
entendimento de que o prazo decadencial para contestar doações fraudulentas,
por força do artigo 1.177 do Código Civil de 1916, é de dois anos contados da
data em que dissolvida a sociedade conjugal. Como a dissolução se deu em 1989 e
a ação foi proposta em 1997, há muito já transcorrera o lapso decadencial,
terminado em 1991.
No recurso ao STJ, mãe e filho sustentaram, entre outros
pontos, que em ação proposta por herdeiro preterido a prescrição é de 20 anos;
que os atos de transmissão da propriedade dos bens são nulos de pleno direito,
pois houve revogação do mandato antes mesmo da lavratura das escrituras; e que
a nulidade absoluta não se sujeita à prescrição, pois o vício de consentimento
não se confunde com sua ausência absoluta.
Citando doutrina e precedentes, o ministro Luis Felipe
Salomão detalhou a distinção entre direitos potestativos e subjetivos e
reconheceu que o prazo decadencial para o cônjuge ou seus herdeiros necessários
anular a doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice é de dois anos, a
partir da data do divórcio ou da anulação da sociedade conjugal.
Para o relator, no entanto, o caso em questão é peculiar,
pois requer a anulação de doação praticada por quem não dispunha de poderes
para efetuar o negócio jurídico discutido na ação.
Segundo Salomão, a controvérsia consiste em saber se o
prazo para anulação de transmissão de imóvel efetuada com procuração
previamente revogada submete-se à decadência ou se constitui nulidade de pleno
direito que atinge todos aqueles que não agiram de boa-fé. A resposta,
acrescentou, é a segunda hipótese.
Para ele, o prazo decadencial é para anulação de contrato
por vício de consentimento, e não para ausência de consentimento.
Consequentemente, a invocação desses dispositivos pelas instâncias ordinárias
se torna inadequada, pois a procuração utilizada pelo doador já havia sido
revogada, resultando em venda a non domino (venda realizada por quem não tem
poder de disposição sobre a coisa).
Em tal situação, entendeu o ministro, o que emerge como
vício é a completa falta de legitimação do alienante, que consiste na inaptidão
específica para determinado negócio jurídico.
Luis Felipe Salomão ressaltou em seu voto que a Terceira
Turma já firmou entendimento de que a ausência de consentimento em
transferência de imóvel pertencente ao patrimônio do casal é ato jurídico
absolutamente nulo e, por isso, imprescritível.
Assim, prevalece a tese dos recorrentes de que houve error
in procedendo, o que torna a demanda imprescritível e justifica a anulação dos
atos processuais a contar da sentença para propiciar a regular instrução do
processo e o enfrentamento das questões de fato e de direito pelas instâncias
ordinárias.
“Diante do exposto, dou provimento ao recurso especial
para anular o acórdão recorrido e a sentença, para que o feito tenha regular
instrução, propiciando o adequado enfrentamento das teses expostas na exordial,
assim como o exercício da ampla defesa e do contraditório pelas partes
litigantes”, concluiu o relator. A decisão foi unânime.
O número deste processo não é divulgado em razão de
segredo judicial.
Fonte: STJ
Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
http://www.jornaldaordem.com.br/noticia-ler/doacao-imoveis-feita-por-conjuge-adultero-para-caso-extraconjugal-e-considerada-nula/36925
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