A
cidadania, juntamente com a soberania, a dignidade da pessoa humana, os valores
sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo econômico, é um dos
fundamentos da República Federativa do Brasil.
Mas
o que é cidadania afinal? Embora a palavra tenha sofrido uma ampliação
considerável em seu leque semântico nos últimos tempos, ela está muito ligada
hoje em dia ao consumidor que exerce seus direitos perante a justiça quando é
prejudicado nas relações de consumo.
Acontece
que não é simplesmente isto. Juridicamente, o conceito de cidadão está ligado à
possibilidade de interferir nos destinos de uma nação e isto é feito através do
voto de todos aqueles que estão em dia com suas obrigações eleitorais. Em suma,
é a possibilidade de interferir nas decisões políticas do estado. Segundo Paulo
Freire, é a possibilidade de o sujeito envolver-se
diretamente na participação da sociedade em que ele está inserido
e influenciar no processo de mudança de construção conforme é desejado.
Pois
é com extrema indignação e asco que leio a notícia de que a Associação
Comercial, Industrial e Empresarial de Ponta Grossa, município paranaense de
334 mil habitantes, a quase cem quilômetros de Curitiba apresenta um documento
aos candidatos a cargos do Legislativo, propondo o fim do voto para quem é
beneficiário do Bolsa Família, enunciado nos seguintes termos:“suspensão
do direito ao voto para beneficiados de qualquer programa de transferência
direta de renda, nas esferas municipal, estadual ou federal.”(
http://politica.estadao.com.br/blogs/roldao-arruda/associacao-propoe-suspender-voto-de-quem-recebe-bolsa-familia/)
Trata-se
de uma proposta estapafúrdia com visíveis nuances fascistas, que deixa
explícita a presença ainda bastante acentuada de nosso passado escravagista que
nossas elites insistem em não abandonar apesar de estarmos em pleno século XXI.
É
claro que teleologicamente, a idéia pretende atingir o PT, partido que há doze
anos vem implementando programas de inclusão social, só não fazendo mais em
virtude da oposição ferrenha de alguns partidos retrógrados que ainda defendem
com unhas e dentes o neoliberalismo, aliados a uma imprensa nefasta que não
reconhece avanços sociais e só sabe desfazer de qualquer medida que venha a
espraiar direitos para as camadas mais desamparadas da população.
Esta idéia desprezível não surgiu agora, pois alguns
cartazes neste sentido já haviam sido mostrados nos movimentos de rua do ano de
2.013, mas à época eu achei que eram apenas pessoas com suas mentes doentias e
sem noção da realidade expondo suas ignorâncias a respeito do verdadeiro
significado da palavra cidadania.
Mas
quando me deparo com entidades assumindo tais pleitos, eu sou acometido de
pensamentos sombrios a respeito de tal questão e devo deixar bem explícito o
meu repúdio e desprezo a estes caçadores de cidadania alheia (com cedilha
mesmo), que querem atingir a maior parte da população carente do Brasil,
alijando-a dos processos decisórios das questões importantes para o futuro de
nosso país.
Não
senhores saudosos dos tempos da casa grande e da senzala. Como tenho repetido
seguidamente, o povo já está consciente e não se contenta mais com as míseras
migalhas que lhe são jogadas de um bolo que ele confeccionou sozinho. Ele quer
a maior parte do produto do seu trabalho e não aceita mais continuar sendo
explorado por esta minoria detentora do poder econômico. Aprendam que é melhor
perder alguns anéis do que perder todos os dedos das mãos. Parem de querer
escamotear a cidadania das pessoas e aprendam a convier com a democracia em
toda a sua plenitude.
Jorge
André Irion Jobim
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