segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

ALIMENTOS AVOENGOS.OBRIGAÇÃO EXCEPCIONAL, COMPLEMENTAR E SUBSIDIÁRIA


Dispõe taxativamente o art. 1.696 do Código Civil vigente que "o direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns na falta dos outros".

Temos, portanto, que o encargo deve ser estabelecido primeiramente entre pais e filhos, cabendo ao pai e à mãe, ao pai ou à mãe, o dever de sustentar ou auxiliar no sustento dos filhos comuns. Significa que caso um dos genitores não possa atender essa obrigação, seja por não dispor de recursos econômicos, por ter falecido ou por qualquer outra razão, esse dever recai sobre o outro genitor.

Conseqüentemente, o pleito alimentar contra os avós é excepcional, somente se justificando quando a pessoa não tem condições de prover o próprio sustento e nenhum dos genitores possui condições de prestar-lhe auxílio, e, também, que os avós possuam condições de prestar esse auxílio sem afetar o seu próprio sustento. Isso porque a obrigação alimentar dos avós é decorrente do dever de solidariedade familiar, tendo seu suporte legal na regra do art. 1.694 do Código Civil. Aliás, é própria Constituição da República que em seu artigo 229 deixa claro que o dever de sustentar os filhos é dos pais e não dos avós ao dispor literalmente que “os pais têm o dever de assistir, criar, educar os filhos menores”.

Assim, somente quando nem o pai, nem a mãe possam atender as necessidades dos filhos, é que cabe o chamamento dos ascendentes para fazê-lo, conforme dispõe o art. 1.698 do Código, in verbis:

"Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide."

Inegavelmente, existe obrigação dos avós, bisavós e também dos demais ascendentes, de concorrerem para prestar alimentos ao descendente necessitado, mas tal obrigação é residual, em razão do dever de solidariedade familiar, pois a obrigação é, primeiramente, dos genitores, isto é, dos pais, pai e mãe, e pai ou mãe, um na falta do outro.

Da doutrina

YUSSEF SAID CAHALI (in "Dos Alimentos", 3ª ed. RT, 1999, pág. 704/709) adverte, de forma incisiva, que "somente após a demonstração da inexistência ou da impossibilidade de um dos parentes de determinada classe em prestar alimentos é que se pode exigir pensão alimentícia de parentes pertencentes às classes mais remotas".

Remata o eminente jurista, com precisão, que "o alimentando não pode, sob pena de subverter toda a sistemática do direito-dever de alimentos, eleger, discricionariamente, os ascendentes que devem socorrê-lo".

"Assim, duas circunstâncias abrem oportunidade para a convocação do ascendente mais remoto à prestação alimentícia: a falta de ascendente em grau mais próximo ou a falta de condição econômica deste para fazê-lo; o grau mais próximo exclui aquele mais remoto, sendo o primeiro lugar na escala dos obrigados ocupados pelos genitores; apenas se faltam os genitores, ou se estes encontram-se impossibilitados financeiramente de fazê-lo, estende-se a obrigação de alimentos aos ulteriores ascendentes, respeitada a ordem de proximidade.
(..)”

Por seu turno, a eminente jurista MARIA ARACY MENEZES DA COSTA (in "A obrigação alimentar dos avós", na obra "Direitos Fundamentais do Direito de Família", Editora Livraria do Advogado, 2004, pág. 233/234) quando assim se manifesta, in verbis:

“A obrigação alimentar que é dos pais não pode simplesmente ser repassada aos avós; na questão alimentar envolvendo avós e netos, o critério da possibilidade prevalece sobre a necessidade; avós mais velhos ou menos velhos; doentes ou sãos; avós sofridos; avós felizes; avós menos ou mais favorecidos pela fortuna; todos os avós devem ser respeitados a ter mantida a sua dignidade.

Assim como a criança é protegida constitucionalmente, também o idoso o é. Da mesma forma como existe lei protetiva da criança/adolescente, também há lei para o idoso. Ambos, avós e netos, recebem proteção. E essa proteção não dispensa criterioso exame da situação contextual em que se inserem os protagonistas do litígio”.

Da Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

"Cuidando-se de obrigação alimentar avoenga a situação não se resolve pela regra alimentar aplicada aos pais. O pedido de alimentos dirigido contra avós não se limita à necessidade do alimentando. Isso porque, de acordo com o disposto no artigo 1.695 e 1.698 do Código Civil, a obrigação alimentar avoenga é subsidiária e complementar. Não há prova de que foram esgotados os meios para obtenção de pensão em valor maior do principal obrigado, tampouco restou demonstrada a impossibilidade de o pai majorar a verba alimentar das filhas, motivo pelo qual não compete à avó a satisfação de obrigação que é apenas complementar e subsidiária. Desse modo, entendo que não restou provada a impossibilidade do genitor de alimentar adequadamente as apelantes." (Apelação nº 70031249709, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Des. Alzir Felippe Schmitz, julgado em 24/09/2009) (grifo nosso)

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS. OBRIGAÇÃO AVOENGA. CARÁTER EXCEPCIONAL E SUBSIDIÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DA IMPOSSIBILIDADE DOS GENITORES. A obrigação alimentar dos avós só tem cabimento quando esgotadas as possibilidades de prestação alimentar pelos pais. No caso, diante da ausência de tal prova, não há razão para reformar a decisão. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO." (Agravo de Instrumento nº 70034242602, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Alzir Felippe Schmitz, Julgado monocraticamente em 12/01/2010) (grifo nosso)

Conclusão

Concluímos assim, que o pleito alimentar contra os avós é excepcional, complementar e subsidiário, somente se justificando quando a pessoa não tem condições de prover o próprio sustento e nenhum dos genitores possui condições de prestar-lhe auxílio, descabendo fixar a obrigação aos avós para prestarem alimentos ao neto quando não há prova da incapacidade dos genitores para atender o sustento do filho, devendo ser esgotadas as possibilidades de prestação alimentar pelos pais. O derradeiro requisito é o de que os avós possuam condições de prestar esse auxílio sem afetar o seu próprio sustento.

A obrigação alimentar é dos pais, não podendo simplesmente ser repassada aos avós. Quando a questão alimentar envolve avós e netos, o entendimento jurisprudencial é de que o critério da possibilidade deve prevalecer sobre a necessidade, eis que os avós devem ser respeitados em nome do princípio da dignidade. Não apenas a criança é protegida constitucionalmente; o idoso também o é. Assim como existe lei protegendo a da criança e o adolescente, também há lei para proteger o idoso. E essa proteção exige um criterioso exame do contexto em que estão inseridas as partes em litígio, pois deverá ser demonstrado que o sustento dos netos não irá dificultar a sobrevivência dos avós. Em muitos casos, seria como vestir um santo desvestindo outro, já que os avós, em regra, são pessoas idosas, aposentadas e com problemas de saúde inerentes à faixa etária, não dispondo de condições para contribuir com a mantença dos netos sem prejuízo ao próprio sustento, o que inegavelmente, constitui óbice à estipulação da obrigação alimentar avoenga, nos termos do art. 1.695 do CC.


Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

Nenhum comentário: