Meandros da Justiça
De acordo com o art. 3º, § 2° do Código de Defesa do Consumidor, serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração.
Significa que o critério limitador para o conceito de serviço, é justamente o fato dele ser remunerado. Conseqüentemente, os serviços gratuitos, em princípio, não são abrangidos pelo referido estatuto.
Acontece que a doutrina tem feito uma distinção entre serviços puramente gratuitos e serviços aparentemente gratuitos. A diferença é a seguinte:
Serviços puramente gratuitos. São aqueles em que o fornecedor não tem qualquer intenção de lucro. Como exemplo, podemos citar o motorista de uma empresa que dá carona a alguém sem lhe cobrar qualquer valor. Nestes casos, é inaplicável o Código de Defesa do Consumidor.
Serviços aparentemente gratuitos. São aqueles serviços que, embora gratuitos, visam dar comodidade e acessibilidade aos eventuais consumidores de um determinado empreendimento. Na verdade o que se pretende com tais serviços, é justamente atrair clientes e obter lucros. Como exemplo, temos os estacionamentos não-pagos em shopping centers, supermercados, restaurantes, etc. São casos em que as normas de proteção ao consumidor terão plena aplicação.
Assim, se alguém estaciona o veículo em um destes locais e, ao voltar nota que ele está danificado ou foi furtado, poderá buscar ressarcimento da empresa que mantém o estacionamento, ainda que na entrada esteja escrito em letras garrafais em uma placa a famosa frase: NÃO NOS RESPONSABILIZAMOS POR OBJETOS DEIXADOS NO INTERIOR DO VEÍCULO, DANOS ELÉTRICOS, FURTOS, ETC.
A responsabilidade advém do fato de que o empreendedor passa aos seus clientes uma segurança em relação a outros empreendimentos, obtendo portanto, vantagem explicita sobre seus concorrentes. Qualquer empreendimento, no momento em que oportuniza aos seus clientes o uso de um estacionamento, assume o dever de guarda sobre os bens que lhe foram confiados, pois esse benefício por certo representa lucratividade para ele, eis que angaria assim um maior número de freqüentadores. O consumidor, no preço de suas compras, está remunerando também tais comodidades agregadas e serviços colocados à disposição.
O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 51, define como abusiva estas placas contendo uma possível isenção de responsabilidade. O entendimento da jurisprudência é de que o aviso caracteriza abusividade que leva à sua nulidade. A responsabilidade nos termos do artigo 14 do CDC, é objetivamente considerada, porque independe da verificação de culpa para consubstanciar o dever de ressarcir os prejuízos experimentados pelo requerente.
Súmula nº 130 do STJ
Temos ainda que levar em conta o que dispõe a Súmula nº 130 do STJ: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento."
As provas
Naturalmente o consumidor deverá ter algumas cautelas para poder pleitear seus direitos, exigindo comprovantes, tickets, nota fiscal de compra que comprove que esteve lá fazendo compras, testemunhas ou uma declaração do ocorrido.
Deverá também de fazer boletim de ocorrência, já que a ocorrência policial, ainda que seja um documento produzido unilateralmente, se presta para demonstrá-la até porque não é lógico imaginar que alguém simplesmente dirija-se a uma delegacia e registre uma ocorrência de furto sem motivo algum.
De qualquer maneira, aplica-se à espécie a teoria da aparência, corolário do princípio geral da boa-fé objetiva, que se traduz nos deveres recíprocos de lealdade, transparência, informação, probidade e assistência, verdadeira regra de conduta que se exige dos contratantes.
Da aplicação da Teoria da Redução do Módulo da Prova,
Diante da natural dificuldade de produção de prova absoluta de todas as circunstâncias que integram tais pretensões, é lógico e plausível a utilização de padrões de verossimilhança para definição dos fatos, fazendo-se com que passe a ser incumbência probatória da parte demandada, demonstrar, em razão do artigo 333, inciso II, do CPC, a absoluta impossibilidade do evento ter ocorrido nas suas dependências. A solução, em tais hipóteses, consiste no exame da questão com a aplicação da redução do módulo da prova, o que vem sendo albergado pelas Turmas Recursais do Rio Grande do Sul. O convencimento do julgador se dará pelo conjunto dos autos e pela análise da experiência comum.
Nesse sentido, as ementas das Turmas Recursais, a seguir transcritas:
REPARAÇÃO DE DANOS. FURTO DE APARELHO DE SOM EM ESTACIONAMENTO DE SHOPPING. REDUÇÃO DO MÓDULO PROBATÓRIO. PARADIGMA DE VEROSSIMILHANÇA QUE SE FAZ PRESENTE NO CASO CONCRETO. DEVER DE INDENIZAR. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. (Recurso Cível Nº 71000708032, Segunda Turma Recursal Cível. Relator: Luiz Antônio Alves Capra, Julgado em 05/10/2005
RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER. DANO MORAL. Súmula 130 do STJ. Teoria das relações contratuais de fato. Aplicação da teoria da redução do módulo da prova, quando o conjunto das circunstâncias está a gerar o chamado paradigma da verossimilhança. Prova que dá esteio suficiente, dentro de tais parâmetros de aferição, à reparação postulada pelo autor. Valor do veículo embasado em tabela de âmbito nacional e credibilidade reconhecida (Fipe). Dano moral, contudo, não configurado em tal situação. Recurso parcialmente provido. Unânime. (Recurso Cível Nº 71000672527, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: João Pedro Cavalli Junior, Julgado em 19/05/2005)
Jurisprudência
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. LEGITIMAÇÃO ATIVA E PASSIVA. TEORIA DA APARÊNCIA. FURTO DE AUTOMÓVEL EM ESTACIONAMENTO DE CENTRO COMERCIAL. FALHA NO DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA VERIFICADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE REPARAR CONFIGURADO.
Detém o autor legitimidade ativa para a demanda, eis que comprovou ser o atual proprietário do veículo supostamente furtado nas dependências do réu. De igual forma, o condomínio requerido mostra-se parte passiva legítima, à medida que disponibiliza área para o estacionamento de seus clientes, ainda que não seja o titular do respectivo terreno, pois, aos olhos dos frequentadores, é o responsável pelo serviço, vindo a se beneficiar comercialmente da prática. Aplicação da teoria da aparência.
Hipótese em que restou suficientemente demonstrado o furto do automóvel do requerente enquanto se achava estacionado nas instalações destinadas pelo demandado. Verifica-se, na espécie, falha do estabelecimento réu, que não logrou cumprir com seu dever de guarda e vigilância sobre os bens que lhe foram confiados pelos seus consumidores, que igualmente remuneram, ainda que por meio indireto, por meio do preço pago pelas compras. Sendo caso de responsabilidade objetiva (art. 14 do CDC), e presente o liame causal, responde o centro comercial pelos prejuízos morais e materiais comprovadamente experimentados pelo demandante.
REJEITADAS AS PRELIMINARES, DESPROVIDA A APELAÇÃO DO RÉU E PROVIDA A DO AUTOR.APELAÇÃO CÍVEL Nº 70024810491. NONA CÂMARA CÍVEL DO TJRS.DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY, Relator.
RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. FURTO DE AUTOMÓVEL EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 130 DO STJ. TEORIA DA REDUÇÃO DO MÓDULO DA PROVA. PARADIGMA DE VEROSSIMILHANÇA. DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. RESPONSABILIDADE DO ESTABELECIMENTO. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA CONFIRMADA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. RECURSO INOMINADO Nº 71001601301. Terceira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul. DR. AFIF JORGE SIMOES NETO, Relator.
Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
Significa que o critério limitador para o conceito de serviço, é justamente o fato dele ser remunerado. Conseqüentemente, os serviços gratuitos, em princípio, não são abrangidos pelo referido estatuto.
Acontece que a doutrina tem feito uma distinção entre serviços puramente gratuitos e serviços aparentemente gratuitos. A diferença é a seguinte:
Serviços puramente gratuitos. São aqueles em que o fornecedor não tem qualquer intenção de lucro. Como exemplo, podemos citar o motorista de uma empresa que dá carona a alguém sem lhe cobrar qualquer valor. Nestes casos, é inaplicável o Código de Defesa do Consumidor.
Serviços aparentemente gratuitos. São aqueles serviços que, embora gratuitos, visam dar comodidade e acessibilidade aos eventuais consumidores de um determinado empreendimento. Na verdade o que se pretende com tais serviços, é justamente atrair clientes e obter lucros. Como exemplo, temos os estacionamentos não-pagos em shopping centers, supermercados, restaurantes, etc. São casos em que as normas de proteção ao consumidor terão plena aplicação.
Assim, se alguém estaciona o veículo em um destes locais e, ao voltar nota que ele está danificado ou foi furtado, poderá buscar ressarcimento da empresa que mantém o estacionamento, ainda que na entrada esteja escrito em letras garrafais em uma placa a famosa frase: NÃO NOS RESPONSABILIZAMOS POR OBJETOS DEIXADOS NO INTERIOR DO VEÍCULO, DANOS ELÉTRICOS, FURTOS, ETC.
A responsabilidade advém do fato de que o empreendedor passa aos seus clientes uma segurança em relação a outros empreendimentos, obtendo portanto, vantagem explicita sobre seus concorrentes. Qualquer empreendimento, no momento em que oportuniza aos seus clientes o uso de um estacionamento, assume o dever de guarda sobre os bens que lhe foram confiados, pois esse benefício por certo representa lucratividade para ele, eis que angaria assim um maior número de freqüentadores. O consumidor, no preço de suas compras, está remunerando também tais comodidades agregadas e serviços colocados à disposição.
O Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 51, define como abusiva estas placas contendo uma possível isenção de responsabilidade. O entendimento da jurisprudência é de que o aviso caracteriza abusividade que leva à sua nulidade. A responsabilidade nos termos do artigo 14 do CDC, é objetivamente considerada, porque independe da verificação de culpa para consubstanciar o dever de ressarcir os prejuízos experimentados pelo requerente.
Súmula nº 130 do STJ
Temos ainda que levar em conta o que dispõe a Súmula nº 130 do STJ: "A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento."
As provas
Naturalmente o consumidor deverá ter algumas cautelas para poder pleitear seus direitos, exigindo comprovantes, tickets, nota fiscal de compra que comprove que esteve lá fazendo compras, testemunhas ou uma declaração do ocorrido.
Deverá também de fazer boletim de ocorrência, já que a ocorrência policial, ainda que seja um documento produzido unilateralmente, se presta para demonstrá-la até porque não é lógico imaginar que alguém simplesmente dirija-se a uma delegacia e registre uma ocorrência de furto sem motivo algum.
De qualquer maneira, aplica-se à espécie a teoria da aparência, corolário do princípio geral da boa-fé objetiva, que se traduz nos deveres recíprocos de lealdade, transparência, informação, probidade e assistência, verdadeira regra de conduta que se exige dos contratantes.
Da aplicação da Teoria da Redução do Módulo da Prova,
Diante da natural dificuldade de produção de prova absoluta de todas as circunstâncias que integram tais pretensões, é lógico e plausível a utilização de padrões de verossimilhança para definição dos fatos, fazendo-se com que passe a ser incumbência probatória da parte demandada, demonstrar, em razão do artigo 333, inciso II, do CPC, a absoluta impossibilidade do evento ter ocorrido nas suas dependências. A solução, em tais hipóteses, consiste no exame da questão com a aplicação da redução do módulo da prova, o que vem sendo albergado pelas Turmas Recursais do Rio Grande do Sul. O convencimento do julgador se dará pelo conjunto dos autos e pela análise da experiência comum.
Nesse sentido, as ementas das Turmas Recursais, a seguir transcritas:
REPARAÇÃO DE DANOS. FURTO DE APARELHO DE SOM EM ESTACIONAMENTO DE SHOPPING. REDUÇÃO DO MÓDULO PROBATÓRIO. PARADIGMA DE VEROSSIMILHANÇA QUE SE FAZ PRESENTE NO CASO CONCRETO. DEVER DE INDENIZAR. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. (Recurso Cível Nº 71000708032, Segunda Turma Recursal Cível. Relator: Luiz Antônio Alves Capra, Julgado em 05/10/2005
RESPONSABILIDADE CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER. DANO MORAL. Súmula 130 do STJ. Teoria das relações contratuais de fato. Aplicação da teoria da redução do módulo da prova, quando o conjunto das circunstâncias está a gerar o chamado paradigma da verossimilhança. Prova que dá esteio suficiente, dentro de tais parâmetros de aferição, à reparação postulada pelo autor. Valor do veículo embasado em tabela de âmbito nacional e credibilidade reconhecida (Fipe). Dano moral, contudo, não configurado em tal situação. Recurso parcialmente provido. Unânime. (Recurso Cível Nº 71000672527, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais - JEC, Relator: João Pedro Cavalli Junior, Julgado em 19/05/2005)
Jurisprudência
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. LEGITIMAÇÃO ATIVA E PASSIVA. TEORIA DA APARÊNCIA. FURTO DE AUTOMÓVEL EM ESTACIONAMENTO DE CENTRO COMERCIAL. FALHA NO DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA VERIFICADA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DEVER DE REPARAR CONFIGURADO.
Detém o autor legitimidade ativa para a demanda, eis que comprovou ser o atual proprietário do veículo supostamente furtado nas dependências do réu. De igual forma, o condomínio requerido mostra-se parte passiva legítima, à medida que disponibiliza área para o estacionamento de seus clientes, ainda que não seja o titular do respectivo terreno, pois, aos olhos dos frequentadores, é o responsável pelo serviço, vindo a se beneficiar comercialmente da prática. Aplicação da teoria da aparência.
Hipótese em que restou suficientemente demonstrado o furto do automóvel do requerente enquanto se achava estacionado nas instalações destinadas pelo demandado. Verifica-se, na espécie, falha do estabelecimento réu, que não logrou cumprir com seu dever de guarda e vigilância sobre os bens que lhe foram confiados pelos seus consumidores, que igualmente remuneram, ainda que por meio indireto, por meio do preço pago pelas compras. Sendo caso de responsabilidade objetiva (art. 14 do CDC), e presente o liame causal, responde o centro comercial pelos prejuízos morais e materiais comprovadamente experimentados pelo demandante.
REJEITADAS AS PRELIMINARES, DESPROVIDA A APELAÇÃO DO RÉU E PROVIDA A DO AUTOR.APELAÇÃO CÍVEL Nº 70024810491. NONA CÂMARA CÍVEL DO TJRS.DES. TASSO CAUBI SOARES DELABARY, Relator.
RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. FURTO DE AUTOMÓVEL EM ESTACIONAMENTO DE SUPERMERCADO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 130 DO STJ. TEORIA DA REDUÇÃO DO MÓDULO DA PROVA. PARADIGMA DE VEROSSIMILHANÇA. DEVER DE GUARDA E VIGILÂNCIA. RESPONSABILIDADE DO ESTABELECIMENTO. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA CONFIRMADA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. RECURSO INOMINADO Nº 71001601301. Terceira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul. DR. AFIF JORGE SIMOES NETO, Relator.
Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
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