sábado, 24 de outubro de 2009

PRESCRIÇAO VIRTUAL


MEANDROS DA JUSTIÇA

Para que o processo penal exista e seja válido, são exigidos alguns requisitos denominados pressupostos processuais. Já, para que se exerça a ação penal, é necessária a presença das chamadas condições da ação. A falta de pressupostos processuais acarreta a inexistência ou a invalidade da relação processual. Por outro lado, a ausência de uma das condições da ação, torna inadmissível o exercício do respectivo direito.

E quais são as condições da ação? São as mesmas do processo civil, ou seja:

1. Possibilidade jurídica. É preciso que haja uma previsão no direito material de que aquele fato, em tese, é criminoso.
2. Legitimidade das partes. É a denominada “legitimatio ad causam”, significando que o autor, ao menos à primeira vista, tem o direito de propor, e o réu, em tese, é parte legítima para sofrer a ação.
3. Interesse de agir. Consubstanciado na necessidade, utilidade e adequação de se recorrer ao poder judiciário para se obter o resultado pretendido.

E é justamente uma dessas condições da ação, mais precisamente o interesse de agir, que é passível de ser atingida mortalmente pela chamada prescrição virtual.

Instituto novo, fruto de criação doutrinária e jurisprudencial, a prescrição virtual, também denominada hipotética, antecipada, projetada ou em perspectiva, ocorre sempre que o juiz, antes de condenar, reconhece a prescrição levando em conta a possível pena que poderia ser fixada em eventual sentença condenatória.

Segundo os defensores desta modalidade de prescrição, se a ação penal não irá alcançar o resultado que dela se espera, ou seja, a punição do indivíduo que praticou um ato ilícito, terá perdido o interesse de agir, justamente uma das condições para a propositura da ação penal. Assim sendo, a sua continuidade configuraria uma inútil e dispendiosa movimentação da máquina judiciária na direção de um resultado que ao final, se revelará inócuo.

Existem aqueles que entendem que o próprio representante do Ministério Público, ao se deparar com casos concretos em que possa antever desde logo que a pena a ser aplicada não poderá ser muito além do mínimo e que fatalmente irá ser alcançada pela prescrição, poderia determinar desde já o arquivamento do inquérito policial.

Atualmente, o Supremo Tribunal Federal, não aceita a prescrição virtual e em diversos casos, os ministros concluíram que não há previsão legal para a aplicação do instituto. Conforme registro na Revista Trimestral de Jurisprudência 135590, o ministro Sydney Sanches indeferiu o pedido de prescrição virtual no julgamento do RHC 669-13. Em seu voto ele entendeu que “antes da sentença, a pena é abstratamente cominada e o prazo prescricional se calcula pelo máximo, não podendo ser concretizada por simples presunção”.

O Superior Tribunal de Justiça, também não aceita a tese. O ministro Hamilton Carvalhido, no julgamento do RHC 11.249, escreveu que “somente ocorre a prescrição regulada pela pena em concreto após o trânsito em julgado para a acusação, não havendo falar, por conseguinte, em prescrição em perspectiva, desconsiderada pela lei e repudiada pela jurisprudência”.

Infelizmente, tais decisões fazem com que o estado continue impondo às pessoas acusadas de algum crime, uma espécie de sanção antecipada e ilegal (eis que não tipificada), que é justamente a sua submissão às agruras de um processo ao final do qual, elas serão fatalmente beneficiadas com o instituto da prescrição. Além de prolongarem o sofrimento dos réus, impõem um desgaste ao estado consubstanciado no desperdício material e pessoal da atividade jurisdicional que acaba onerando inutilmente os cofres públicos.

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

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