Os
advogados Cristiano Zanin e Valeska Martins publicaram artigo nesta
terça-feira, em que rebatem editorial do jornal O Globo, que nega que o
ex-presidente Lula, que permaneceu como preso político durante 580 dias para
não disputar uma eleição que venceria em primeiro turno, foi vítima de lawfare,
ou seja, de uma guerra judicial com finalidades políticas. Confira abaixo:
Por
Cristiano Zanin e Valeska Martins – Não podemos concordar com a posição do
GLOBO em editorial publicado em 25 de dezembro — que tenta negar o conceito de
lawfare (em vernáculo, guerra jurídica) que defendemos em publicações científicas
e que identificamos em casos concretos como o do ex-presidente Lula, de outros
líderes políticos dos mais diversos matizes, e também em casos envolvendo
empresas, como o da Siemens.
Fomos
nós que, em 2016, usamos pela primeira vez no continente sul-americano a
expressão lawfare, embora ela não fosse inédita. No recém-lançado livro
“Lawfare: uma introdução”, defendemos, numa releitura do fenômeno, que lawfare
significa o uso estratégico do Direito para fins políticos, geopolíticos,
militares e comerciais. Citamos os exemplos acima referidos.
O
Direito jamais poderia ser utilizado para destruir ou fragilizar o adversário
ou o inimigo eleito. Originariamente, os americanos se afirmavam vítimas de
lawfare. Criticavam o uso estratégico do Direito, notadamente do Direito
Internacional, para deslegitimar as campanhas militares daquele país e de
Israel. Os americanos, porém, viram na guerra jurídica uma forte aliada na
conquista de aliados geopolíticos e de mercados e passaram a utilizá-la com
enorme desenvoltura.
O
lawfare não é tão visível quanto as guerras convencionais porque o inimigo é
atacado justamente sob o pretexto da necessidade de se cumprir a lei e os
procedimentos jurídicos — embora resulte na própria negação do Direito. Para
viabilizar o lawfare, cria-se uma verdadeira campanha, com o auxílio da mídia e
de operações psicológicas, para envolver a população e tornar aceitáveis os
abusos que acompanham o fenômeno em busca de combater um imaginário mal maior.
Tal como na guerra convencional, o lawfare envolve a implementação de táticas e
estratégias. A guerra praticada com o uso das leis tem um custo imediato
significativamente menor do que as guerras convencionais, mas seu poder de
destruição é similar e muitas vezes superior, porque não está limitada a uma
determinada área geográfica.
É
sintomático que O GLOBO tenha recorrido a uma declaração factualmente incorreta
do atual presidente do TRF-4 para negar a prática de lawfare contra Lula.
Segundo o magistrado, nenhum advogado na Lava-Jato teria sustentado a inocência
de seu cliente na operação. Porém, na defesa do ex-presidente não só
demonstramos que ele é vítima de lawfare como também sustentamos e provamos a
sua inocência.
Um
dos laudos periciais que produzimos na defesa de Lula atualmente está sendo
utilizado até mesmo por Marcelo Odebrecht para se insurgir contra seus pares.
Prova que valores que o Ministério Público acusa terem sido pagos a agentes
públicos foram em verdade destinados a colaboradores da própria Odebrecht. O
grupo foi escolhido como um verdadeiro “cavalo de troia”, pelas suas
ramificações em diversos países, para destruir governos e democracias em favor
dos interesses geopolíticos e comerciais americanos. Por isso, a similitude das
acusações apresentadas contra líderes políticos de diversos países.
Não
se pode perder de vista que o lawfare não tem ideologia. Pode atingir líderes
políticos de esquerda ou de direita. Pode atingir empresas e atividades
empresariais das mais diversas nacionalidades. O FCPA, lei americana editada
para punir empresas daquele país que praticam suborno no exterior, está sendo
indevidamente utilizada como uma das principais armas no lawfare, pela sua
possibilidade de alcance global. No Brasil não é diferente.
Lamentavelmente,
o lawfare é uma realidade. Para enfrentá-lo, é preciso, em primeiro lugar,
conhecê-lo. Para isso, temos dado a nossa contribuição, não apenas divulgando
nossos estudos mas também criando o Instituto Lawfare, em 2018, para produção
de conteúdo e análises de casos concretos.
Cristiano
Zanin e Valeska Martins são advogados do ex-presidente Lula e fundadores do
Lawfare Institute
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