"Oitenta
anos após o início da Segunda Grande Guerra, a humanidade se vê ameaçada por
novos conflitos. O ambiente internacional encontra-se carregado por ameaças
neocolonialistas, guerras comerciais, ingerência nos assuntos internos de
países soberanos, violações ao direito internacional, direitização da vida
política, criminalização dos movimentos sociais e todo tipo de contradições que
podem desembocar em novas tragédias", adverte o colunista José Reinaldo
Carvalho
Com
a agressão da Alemanha nazista à Polônia, há exatos 80 anos, a 1º de setembro
de 1939, teve início a Segunda Guerra Mundial.
Entre
os anos de 1939 e 1941, a Alemanha nazista, e a Itália fascista ocuparam uma
série de países da Europa ocidental e dos Bálcãs. A 22 de junho de 1941, a
Alemanha de Hitler atacou a União Soviética.
A
guerra envolveu direta ou indiretamente 80% do mundo, causou imensas dores,
ingentes e indeléveis sacrifícios, provocou dezenas de milhões de mortes e
incontáveis destruições materiais.
A
Segunda Guerra Mundial começou como um confronto entre as grandes potências
capitalistas. A rigor, com o final da
Primeira Guerra (1914-1918), não terminara a luta pela redivisão do mundo, por
mercados, zonas de domínio e influência. Nem a disposição das potências
imperialistas para levá-la a efeito por meio da violência. Era a sobressaltos
que se afigurava o fenômeno do desenvolvimento desigual do capitalismo no curso
da nova fase monopolista.
A
Alemanha, então a potência mais agressiva, visava a impor sua hegemonia na
Europa e ampliar seu império para o Oriente Médio e a África. O Japão pretendia
a hegemonia na região do Pacífico, convertendo em suas colônias a China, a
Coreia, a Indonésia, a Indochina, a Índia e as ilhas do Oceano Pacífico. Já os
fascistas italianos sonhavam em transformar o Mar Mediterrâneo num “lago
italiano” e ocupar a Argélia, a Tunísia, a Córsega e outros territórios. Visava
ainda ao domínio sobre os Bálcãs.
Esses
objetivos entravam em contradição com os interesses da Inglaterra, da França e
da nova potência imperialista emergente, os Estados Unidos da América. Foi por
esta razão que do lado oposto ao eixo Alemanha-Itália-Japão, enfileirou-se a
coalizão formada por aquelas três potências ocidentais.
Acontecimentos
trágicos que marcam indelevelmente a história da humanidade devem ser sempre
lembrados para que não se repitam, se as gerações posteriores forem capazes de
extrair os ensinamentos pertinentes. Por isso é necessário recordar alguns
fatos anteriores ao Primeiro de Setembro de 1939.
Pacto anti-Comintern
Pouco
recordado, um dos episódios mais pedagógicos a esse respeito foi o chamado “pacto
anti-Comintern”. Em outubro de 1935, as tropas italianas invadiram a Etiópia.
Alemanha e Itália empreendiam ações para esmagar a luta republicana e
democrática do povo espanhol. Os dois países mantinham entendimentos para
dividir as zonas de influência na Europa e aplicar uma política internacional
comum.
Em
1936, representantes do Japão e da Alemanha assinaram em Berlim o “pacto
anti-Comintern”, ao qual se uniu a Itália. Tratava-se de um esforço para
convencer a opinião pública de que o seu objetivo era a luta contra o
comunismo, especialmente contra o Comintern (o Comitê da Internacional
Comunista).
Por
outro lado, Estados Unidos, Inglaterra e França
desenvolviam uma política de suposta neutralidade e "não
intervenção", calculando superar as contradições com os países fascistas
às custas da União Soviética. Essas três potências estimavam que, na luta
contra a agressão fascista, os seus adversários se debilitariam, o que lhes
permitiria manter suas zonas de influência e de ocupação colonial e liquidar a
União Soviética como país socialista.
A
política de “não intervenção” visava a isolar a União Soviética e criar as
condições para uma grande cruzada dos países imperialistas contra esta,
utilizando como força de ataque o fascismo alemão e o militarismo japonês.
Diante de tal situação a União Soviética seguiu a política da segurança
coletiva, segundo a qual os países interessados em sua segurança nacional
deveriam manter laços entre si com tratados de ajuda mútua a fim de se
defenderem de agressões.
A
direção soviética advertiu que a política de não intervenção significava um
encorajamento à agressão, permitia deixar o terreno livre à guerra e
transformá-la em guerra mundial. Ficava claro nessa política de não intervenção
o obscuro desejo de que, na frente oriental, o Japão entrasse em guerra contra
a China e ainda mais contra a União Soviética.
Nunca
fez parte dos planos das potências imperialistas realizar qualquer ação que
impedisse que a Alemanha golpeasse a União Soviética. O que pretendiam era
fazer com que a Alemanha e a União Soviética se debilitassem numa guerra entre
si para depois sair em cena com suas forças ilesas, e, no “interesse da paz”,
impor as suas condições aos países beligerantes debilitados.
O complô de Munique
É
nesse quadro que tem lugar o “complô de Munique”. Em março de 1938, as tropas
hitleristas entraram na Áustria, sem nenhuma resistência e proclamam a anexação
do país. Apesar de ter sido uma agressão e uma clara demonstração dos planos
expansionistas da Alemanha, os governos ocidentais reconheceram a anexação, que
não deixava de ser um encorajamento a esses planos.
A
conferência de Munique, entre chefes de governos da Alemanha, Inglaterra,
França e Itália, realizada em setembro de 1938, chancelou os planos alemães e
configurou-se como uma desonrosa cedência da parte da Inglaterra e França, por
isso mesmo não foi isenta de contradições.
Os acordos ali assinados previam que a Tchecoslováquia entregasse à
Alemanha no prazo de dez dias a região dos Sudetos e outros territórios
fronteiriços, o que equivalia à completa liquidação do Estado
Tchecoslovaco.
A
política de cedências, que representava também um perigo para os países que a
praticavam, não era isenta de contradições. Havia setores que enxergavam que
tal política inflaria o bloco dos países fascistas, pois era óbvio que estes
apresentariam novas exigências de anexações, o que entraria cada vez mais em
contradição com os interesses da própria Inglaterra, da França e dos Estados
Unidos.
Antes
de se tornar primeiro-ministro britânico, Winston Churchill, partidário da
política de enfrentamento militar a Hitler, fez um discurso na Câmara dos
Comuns (parlamento britânico) criticando a posição adotada na Conferência de
Munique: “Escolhemos uma derrota, sem guerra, cujas consequências nos
acompanharão longe em nosso caminho”. “Vocês escolheram entre a guerra e a desonra;
escolheram a desonra e terão a guerra”. Mais tarde, em suas memórias, o líder
britânico, que de pró-soviético não tinha nada, muito ao contrário, escreveu:
“A oferta dos soviéticos foi de fato ignorada. Eles não foram consultados em
face da ameaça hitlerista e foram tratados com indiferença, para não dizer com
desdém, o que marcou o espírito de Stálin. Os acontecimentos se desenvolveram
como se a Rússia Soviética não existisse. Pagamos terrivelmente por isso”.
Pacto germano-soviético
A
primeira reação política e diplomática da União Soviética foram as conversações
de Moscou, em março de 1939, com França e Inglaterra, visando a firmar um
tratado de ajuda mútua, para a eventualidade de uma agressão alemã. Enquanto
isso, os países imperialistas mantinham entendimentos secretos com Hitler a fim
de dividir zonas de influência no mundo. Foi o que levou a União Soviética ao
controvertido, mas demonstrado pelos fatos como salvador, tratado de não
agressão com a Alemanha, em 1939. Com o tratado, a União Soviética
temporariamente neutralizou a agressão nazista e paralisou os esforços dos
imperialistas ingleses e franceses para isolá-la.
A
recordação desses fatos e o resgate das decisões táticas e estratégicas da
época servem para extrair lições, o que pode ajudar as forças
anti-imperialistas de hoje a melhor se situar nos quadros complexos com que se
defrontam. Caráter patriótico da
resistência Tendo sua origem nas
contradições interimperialistas, a Segunda Guerra Mundial foi gradualmente
mudando de caráter.
Os
povos dos países ocupados ergueram-se na resistência popular-nacional
antifascista, passando a protagonizar uma justa luta democrática e de
libertação nacional. Os próprios Estados capitalistas, a partir do
desencadeamento da guerra, viram-se confrontados com o perigo nacional, o que
criou condições para a formação de um amplo e poderoso movimento patriótico e
antifascista. Para os povos do mundo e
as forças progressistas e
revolucionárias que tomavam a frente de suas lutas, apresentou-se o imperativo
e combater pela democracia e a libertação nacional.
Para
os povos da União Soviética, então liderada por Stálin, o principal desafio
passou a ser, a partir da invasão alemã do seu território, empreender a guerra
patriótica em defesa da pátria do socialismo.
Formou-se, assim, uma frente antifascista de dimensões mundiais.
Os
próprios países capitalistas, nas condições da ameaça que a Alemanha nazista
representava para a sua soberania e integridade, uniram-se à luta dos povos do
mundo e da União Soviética.
Decerto,
as potências ocidentais não eram aliados confiáveis, mantinham posição ambígua
e vacilante quanto à causa da libertação dos povos e da democracia. Isto tinha
ficado patente quando da assinatura do Pacto de Munique, quando essas potências
alimentavam o desejo de jogar a Alemanha contra a União Soviética, julgando que
assim contornavam a guerra contra si próprias.
Malgrado o catáter imperialista dos aliados, a frente antifascista foi
indispensável e salvou a humanidade de uma tragédia maior.
A vitória sobre o nazi-fascismo seis anos
depois, a conquista de democracia e da paz, coroou o esforço de guerra dos
aliados, a luta dos povos e a direção lúcida e justa da União Soviética, que na
sequência da vitória passou a liderar o bloco que o escitor Jorge Amado
chamaria de "o mundo da paz".
Oitenta
anos após o início da Segunda Grande Guerra, a humanidade se vê ameaçada por
novos conflitos. O ambiente internacional encontra-se carregado por ameaças
neocolonialistas, guerras comerciais, ingerência nos assuntos internos de
países soberanos, violações ao direito internacional, direitização da vida
política, criminalização dos movimentos sociais e todo tipo de contradições que
podem desembocar em novas tragédias.
Somente
a união dos povos e sua mobilização na defesa consequente da soberania
nacional, da democracia e da paz serão capazes de conjurar o perigo de guerra.
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