Foram
as Cruzadas que, em nome de Deus, se predispuseram a matar todos os judeus da
Europa. Os massacres se tornaram tão sangrentos que, bando após bando, os
judeus se foram agrupando no recém-criado Reino da Polônia, onde foram bem
recebidos, confundindo-se com o princípio da própria Polônia. Uma série de reis
poloneses garantiram liberdade religiosa e proteção para os judeus vindos da
Boêmia.
Como
não havia uma classe média entre os aristocratas e os camponeses, os judeus
trouxeram as artes, ferramentas de trabalho, comércio e profissões manuais.
A
perseguição aos judeus iniciou-se quando a Igreja Católica cresceu em poderio e
se consolidou como religião estatal. Os jesuítas aprovaram conflitos medievais
contra os judeus. Logo estes receberam apoio dos comerciantes alemães emigrados
e ambos impuseram um imposto judeu, expulsão de ofícios competitivos, comércio
e profissões. Os pans feudais proibiram que judeus tivessem a posse das terras.
Na Polônia deu-se a criação de um dos primeiros guetos judeus do mundo,
trancafiados e emparedados.
Daí,
entre os diversos grupos judeus, principiou uma longa experiência em
autogestão. Falavam iídiche ao invés da língua local, criaram sua própria
cultura e literatura.
Varsóvia
com seu um milhão de habitantes, antes da Segunda Guerra, era a Paris da Europa
Oriental. Os judeus, então, representavam mais de um terço da população, embora
ocupassem apenas 3% da área total da cidade.
Em
1º de setembro de 1939, soldados nazistas atravessaram a fronteira e marcharam
para a Polônia. Era o primeiro teste da blitzkrieg (ataque relâmpago)
alemão. Em 27 de setembro, Varsóvia se
rendeu.
A
ocupação nazista foi mais longa na Polônia do que em qualquer outro país, o que
deu mais tempo para a implantação de políticas racistas e segregacionistas
contra aqueles considerados “inferiores racialmente”, como ciganos, judeus,
homossexuais e deficientes físicos e mentais. Quando tomaram a cidade, os
nazistas ofereceram comida à população local não judia, encorajando que esses
expusessem e delatassem judeus. Quanto mais a ocupação se consolidava, mais seu
caráter antissemita se reforçava.
Quanto
aos comunistas e socialistas dedicava-se a Gestapo, exterminando-os após
tortura.
Jürgen
Stroop, o Comandante SS responsável pela repressão ao gueto de Varsóvia, não
desejava passar a vida num banco de sapateiro como seu pai. Como ele não era
bom para coisa alguma, dificilmente seria um bom sapateiro da Baviera.
Desocupado, vivendo de pequenos furtos e empreitadas, tinha duas mulheres e
três filhos, sempre vítimas de sua violência doméstica. No pós Primeira Guerra, a Alemanha enchera-se
de revoltados e descontentes, que gastavam suas energias praguejando contra um
mundo que eram incapazes de compreender
e de enfrentar. Durante os anos 1920, surgiram rumores que foram música para
muitos de sua geração, pessoas obscuras e insignificantes, verdadeiros
Ninguéns: suas falhas eram explicadas por uma forma através da qual eles
queriam acreditar. Não eram responsáveis pelas suas dificuldades, mas vítimas
de uma conspiração do mundo contra sua gente. E à frente deste mundo que os
tolhiam estavam os judeus com seus negócios, os intelectuais, os comunistas, os socialistas e os
democratas! Tornou-se Nazista. Um novo status, e o uniforme marrom. Tudo o que
ele tinha que fazer era exercer a força bruta, o mesmo tipo que usava para
amortecer suas ex-esposas e filhos. Com o pouco que possuía de personalidade e
de compreensão da vida, viu que a única forma de sucesso era moldar sua sorte a
do Nazismo. Instintivamente entendeu a única regra: obediência absoluta! Como a
moralidade não constituía problema algum, tudo se resumia a disciplina e força.
Ele queria ser alguém e Hitler deu-lhe esta chance!
Os
nazistas acolheram fanfarrões, bêbados, drogados e desordeiros e os
transformaram em heróis. Em troca, eles deram-lhes absoluta obediência, sem
escrúpulos, remorsos ou conflitos de consciência, quer quando deveriam
assassinar um inimigo do Partido, quer fosse o caso de destruir uma sinagoga.
E
os nazistas fizeram o que Hitler prometera. A Alemanha, quer pela expropriação
das propriedades judaicas, quer pela exploração sem tréguas do trabalho escravo
pelos grandes industriais alemães, tornou-se poderosa e temida e, enquanto se
os poderes econômicos e bélicos se expandiam, os leais Jürgen Stroops recebiam
suas recompensas.
Jürgen
Stroop aprendeu no processo, intuitivamente, muitas lições. Um dos mais
importantes axiomas era que os intelectuais eram homens fracos. Esposavam
ideias nobres sobre as quais ele pouco entendia, mas que sobre as quais, ao
contrario dos nazistas, eles não estavam dispostos a morrer. Logo, eram
supérfluos e covardes. Ele poderia governá-los aterrorizando-os, e eles
poderiam realizar coisas para as quais ele era absolutamente incapaz.
Sobre
os instrumentos de propaganda nazista, Stroop aprendeu que uma mentira repetida
mil vezes, até mesmo para aqueles que sabiam que se tratava apenas de uma
mentira, faria com que ela se transformava em verdade. E que a primorosa
distorção dos fatos, era um excelente gerador das meias verdades. Que para a
maioria das pessoas a verdade consiste apenas aquilo no que as pessoas querem
crer, nada mais.
Quando
participara das turbas da antiga milícia nazista, a SA, a tropa de choque que
aterrorizava as ruas de Munich, aprendeu que a prática de cada ato de
violência, sempre contava com a apatia dos homens livres. E isto lhe trazia a
satisfação do cheiro do sangue vertido e também descobriu que ele o viciava.
Em
Varsóvia ainda trazia na memória as palavras de seu Fuhrer: “O certo é de
propriedade exclusiva do vencedor. O perdedor está sempre errado”.
O
idioma alemão, abastardado pelos nazis com expressões cínicas como “alegria
através do trabalho”, “supremacia da raça ariana”, “espaço vital”, “destino
alemão”, “as verdades”, “destino do povo alemão”, “povos irmãos”, “desumano
tratamento da etnia alemã”, se incorporou às falas de Jürgen Stroop para com
seus subordinados.
E
o povo polonês foi levado a compreender que “reserva” é a nova nomenclatura de
gueto; que “despojo” legítimo de guerra eram os
bens roubados ou confiscados aos judeus e aos inimigos políticos; que
“contaminado” era o nome da propriedade a ser confiscada; “medidas sanitárias”,
significavam execuções em massa; que “abatido quando tentava escapar” era
sinônimo de assassinato na prisão; “reinstalação”, era confisco de
propriedades; “trabalho voluntário”, igual a trabalho escravo; “sub-humanos”
designava os judeus, os ciganos, presos
políticos, homossexuais ( exceto os arianos); “mestiçagem” requeria execução para evitar a mistura de sangue
sub-humano com o ariano; que “bolchevique, especulador, belicista” era um
cognome para judeus e que “dispensa de tratamento especial”, simbolizava o
extermínio. Finalmente, tendo em vista o nível de privações a que os judeus
eram submetidos no gueto, a população polonesa foi “convencida” que, a fim de
viver em um gueto, um homem precisa contrariar a lei. Daí, todos os confinados
eram criminosos, inclusive crianças, logo, passíveis de execução.
Aos
judeus de Varsóvia foram agregados milhares de judeus provenientes de países
ocupados na Europa Oriental pelos nazistas. O gueto de Varsóvia chegou, em seu
auge a conter 380 mil pessoas.
Sob
o mais inacreditável terror nazista, a resistência do povo judaico fez-se
presente de diferentes formas. Principiou pela organização de instituições de
autoajuda e de caridade, como a CENTOS com as cantinas de sopa gratuita: a
certa altura, dois terços da população dependiam destas cantinas.
Havia
também um extenso sistema escolar clandestino organizado por vários movimentos
juvenis, que cobria todos os níveis básicos e de ensino secundário e oferecia
até cursos de nível universitário aos domingos, disfarçados frequentemente de cantinas.
Um
orfanato, liderado pelo pediatra e autor Janusz Korczak, era chamado da
República das Crianças. Este e outros orfanatos foram destruídos em 1942 e os
seus ocupantes enviados para Treblinka, onde foram assassinados.
A
vida cultural jamais deixou de existir. Incluía uma imprensa diária trilingue
(iídiche, polaco e hebreu), atividade religiosa (incluindo uma igreja para
convertidos ao cristianismo), aulas, concertos de música clássica, teatro e
exposições de arte. Um dos mais notáveis esforços de preservação culturais foi
liderado pelo historiador Emmanuel Ringelblum e o seu grupo, que coletou uma
importantíssima documentação para
preservar a história social da vida no gueto. Estes documentos foram escondidos
dos alemães em três locais separados, dois dos quais foram recuperados e
fornecem-nos hoje a história da vida no gueto.
Entre
julho e setembro de 1942, levas de deportações removeram mais de 300 mil judeus
para o campo de concentração de Treblinka. Reduzido a 60 mil pessoas – em sua
maioria homens e mulheres ainda saudáveis, decidiram organizar a resistência
armada do gueto.
O
primeiro conflito ocorreu em 18 de janeiro de 1943, quando vários batalhões da
SS marcharam rumo ao gueto, mas foram emboscados, com baixa de doze SS.
Os
transportes para os Campos de Extermínio foram interrompidos por 4 dias e as
duas organizações de resistência, a ZOB e ZZW tomaram o controle do gueto,
montando vários postos de combate. Uma de suas primeiras ações foi eliminar a
Milícia Judaica, assassinos judeus que operavam a mando dos alemães.
“A
batalha na rua Niska nos encorajou. Pela primeira vez desde a ocupação vimos os
alemães colados às paredes, engatinhando no chão, correndo para se cobrir,
hesitando antes de dar um passo, com medo de ser atingido por uma bala judia.
Os gritos dos feridos nos deram alegrias e aumentaram a nossa vontade de
lutar,” escreveu numa carta Tuvia Boryskowski, uma resistente.
Durante
os três meses seguintes, todos os habitantes do gueto prepararam-se para aquilo
que eles sabiam ser a luta final. Foram cavados túneis por baixo das casas, a
maioria ligada pelo sistema de esgotos e de abastecimento de água. Acima das
casas, cada telhado era um ponto de sentinelas.
O
apoio de sectores fora do gueto foi limitado a algumas ações polacas da Armia
Krajowa (AK) e dos comunistas que sobreviviam do lado polonês.
A
resistência sabia perfeitamente que não seria capaz nem de libertar o gueto,
muito menos destruir o aparelho nazista local. Os resistentes possuíam o
objetivo de uma morte digna. num misto de orgulho e esperança.
Ao
conhecer o resultado do primeiro combate no gueto, um enlouquecido Heinrich
Himmler ordenou ao general Jürgen Stroop que extinguisse o Gueto de Varsóvia
até, no máximo, meados de fevereiro, pois era um mau exemplo para todos os
povos sob as botas nazistas. Entretanto, a luta judaica se estenderia por três
meses!
A
batalha final começou na noite da páscoa judaica, domingo 19 de abril de 1943.
Os guerrilheiros judeus dispararam e atiraram granadas contra patrulhas alemãs
a partir de becos, esgotos, janelas. Os nazis responderam detonando as casas
bloco por bloco e cercando e matando todos os judeus que conseguiam capturar.
Ao mesmo tempo, toda a rede de esgotos era inundada por gases venenosos. Aviões
varriam os telhados, pontos de tiro dos resistentes.
Em
8 de maio, os últimos rebeldes foram cercados. Muitos preferiram o suicídio.
Esta
foi uma das mais lindas epopeias da luta do homem por liberdade e dignidade. Um
exército improvisado, de algumas centenas de combatentes, sob o comando do
ex-oficial do Exército Polonês, Mordechaj Anielewicz, sem armas minimamente
adequadas ( 50 pistolas e uma metralhadora), fez frente à mais poderosa
potência militar que o mundo já conhecera, resistindo com bravura inaudita durante
três meses àquele que era considerado o mais fulminante exército do mundo.
Janusz
Korczak foi preso, julgado por genocídio e condenado à morte em 1947.
Obs.:
Em Sobibor, na polônia Ocidental, o Campo de Extermínio dirigido pelo SS Gustav
Wagner, os 250 mil assassinados tiveram os corpos antes de incinerados, fervidos para retirada de
gordura para sabão e os ossos triturados para adubo. Gustav Wagner, como tantos
genocidas conseguiu evadir-se da Alemanha derrotada e exilou-se no Brasil.
Sabendo-se detectado pelo Mossad e conhecedor do destino de Eichmann,
sequestrado na Argentina e condenado à morte em Israel, procurou o Estado
Brasileiro para “entregar-se”, ou melhor, proteger-se, pois o pai do atual
Ministro do Exterior, Ernesto Araújo, o Procurador da República da ditadura
militar, em conluio com o STF, negou a extradição do mesmo para Israel, Polônia
ou Alemanha.
A
resistência do gueto de Varsóvia deixou-nos uma lição: que o nazismo e o
fascismo necessitam de combate permanente. E que somente poderemos enfrenta-los
e vencê-los criando uma nova ética arquetípica: a de que a vida humana deve ser
tratada como sagrada!
http://proust.net.br/blog/?p=1524

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