"Inócuo",
"panfletário", "flagrantemente inconstitucional",
"tecnicamente frágil", "insuficiente", foram alguns dos
adjetivos e expressões utilizados por entidades ligadas ao mundo jurídico e à
área de segurança pública para classificar o projeto de lei anticrime,
anunciado pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, nesta
segunda-feira (4).
Órgãos
como o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), o Instituto de Defesa do
Direito de Defesa (IDDD), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais
(IBCCrim) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) alegam que as várias mudanças
na legislação propostas por Moro causam estranhamento porque foram feitas sem
consulta pública ou participação de especialistas, limitam o direito de defesa
e podem agravar a crise de segurança pública, devendo contribuir para o aumento
das já elevadas taxas de encarceramento no Brasil.
Para
o FBSP, "o projeto ignora temas importantes para o setor, como a
reorganização federativa, o funcionamento das polícias – e suas carreiras e
estruturas –, governança, gestão ou sistemas de informação ou inteligência.
Também não há clareza sobre ações dos governos estaduais e da União no
enfrentamento da corrupção policial, que é um dos aspectos que contribui para o
surgimento de milícias".
O
Fórum, em nota, também afirma que o projeto de Moro não leva em conta planos
anteriores elaborados pelo próprio governo federal, nem considera evidências
empíricas sobre o funcionamento da segurança pública no país. "Por
melhores que sejam as intenções, medidas simples e objetivas não são
suficientes para resolver os problemas complexos do setor."
O
IDDD afirma ter recebido a proposta "com extrema preocupação".
"Para o Instituto, o pacote é inócuo, panfletário e, em diversos pontos,
flagrantemente inconstitucional. Abre espaço, ainda, para o agravamento da
violência estatal contra a população pobre e negra das periferias, alvo
historicamente preferencial do sistema de justiça penal", dizem em nota.
Em
vez de enfrentar o crime, o IDDD diz que o projeto do ministro da Justiça, se
aprovado como está, vai acabar por fortalecer as organizações criminosas, ao
agravar "condições que estão na base da violência e do colapso do sistema
prisional".
O
fortalecimento de "facções prisionais" também é apontado pelo IBCCrim
como uma das consequências do pacote de Moro, pois, fomenta o
"aprisionamento indiscriminado de sujeitos vulneráveis".
"Trata-se de um projeto tecnicamente frágil, por trazer previsões já
declaradas inconstitucionais e/ou de difícil compreensão, além de ter como
efeito previsível um aumento exponencial nas taxas de encarceramento, inclusive
pelos delitos menos graves."
Para
o procurador de Justiça aposentado e um dos mais renomados juristas do Brasil,
Afrânio Silva Jardim, a proposta de Moro de estabelecimento de acordo em troca
da redução de pena – conhecido como plea bargain – é "absolutamente
inconstitucional". "Estes acordos são seletivos por natureza e as
negociações fogem a qualquer controle eficaz. A ampliação da discricionariedade,
no nosso processo penal, é algo absolutamente indesejável", diz Jardim,
para quem a proposta pode contribuir para que o Ministério Público seja
transformado em um "verdadeiro monstro" que pode tragar o devido
processo legal.
Já
a OAB anunciou a formação de um grupo que vai analisar cada uma das proposições
contidas no pacote apresentado por Moro. A entidade também afirma que
alterações com "consequências profundas" devem ser realizadas
"no devido tempo" e com "amplo debate entre os vários setores da
sociedade".
"Tão
forte quanto o desejo de conter a escalada da violência e da impunidade é o
desejo de realizarmos tal tarefa como uma sociedade justa, democrática e
moderna que reconhece a importância dos direitos fundamentais e o respeito ao
devido processo legal. Não podemos cair no equívoco de supor que será possível
resolver os complexos problemas da segurança pública apenas com uma
canetada", afirmou, em nota, o presidente da OAB, Felipe Santa Cruz.
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