Não
Há Método na Burrice
O
grande Goethe já nos advertia que “não há nada mais terrível que uma ignorância
ativa” (Es ist nichts schreklicher als eine tätige Unwissenheit).
Obviamente,
Goethe não teve o prazer de conhecer Bolsonaro e sua preclara equipe de
fundamentalistas cristãos e sumidades emergidas das redes sociais.
Se
tivesse, teria acrescentado que não há nada mais desastroso que a ignorância
ativa que chega ao poder.
Com
efeito, mal começou e o governo do capitão exibe a um mundo estarrecido um
festival tragicômico de declarações brutais e estapafúrdias e de decisões
beócias e cretinas, seguidas invariavelmente por apressados e canhestros
desmentidos.
Ornamenta
esse festival de obtusidades as seguidas desautorizações dos zurros
presidenciais.
Com
o novo mandato, instaurou-se a mais completa anomia. Ninguém sabe direito que
decisões serão concretizadas e quem, de fato, manda no governo, sé é que há
alguém que manda.
Há
a incômoda sensação de se estar em num barco à deriva, que ruma impotente rumo
ao Maelstrom, sob o olhar impassível do Jesus da Goiabeira, que não ora por
nós.
Há
alguns, no entanto, que veem essa algazarra trágica como um plano
mefistofélico, destinado a distrair a opinião pública das “verdadeiras
intenções” do governo fascistoide, que quer entregar os destinos da Nação a
desinteressados agentes do capital internacional.
É
possível. Afinal, nada mais funcional a esses interesses que um presidente que fez
da ignorância e da boçalidade a sua raison d’être.
Um
presidente que não entende nada, não manda nada, e que está disposto a bater
continência até para o Rin Tin Tin, pastor alemão que serve galhardamente ao
Exército dos EUA.
Como
diziam os antigos gregos, aqueles a quem os deuses querem destruir primeiro
enlouquecem. Portanto, é possível que haja alguma funcionalidade oculta, bem
oculta, nesse enredo giocoso de ópera bufa. Alguma coisa cuja lógica seja
acessível apenas aos deuses.
Suspeito,
contudo, usando a Navalha de Occam, que a verdade seja, como soe acontecer,
mais simples e mais brutal: o Brasil foi assaltado por uma legião de
oligofrênicos que não têm a menor ideia de como governar o país.
Mesmo
o insigne “Posto Ipiranga”, sumidade gestada na Escola de Chicago, que respirou
os ares impolutos de Santiago de Chile, parece desconhecer fatos básicos sobre
o Brasil, como, por exemplo, o de que o orçamento de um ano tem de ser aprovado
no ano anterior, informação acessível até mesmo a mortais comuns medianamente
letrados.
O
Itamaraty, que já nos legou quadros extraordinários, à esquerda e à direita,
agora nos brinda Ernesto Araújo, um diplomata, por assim dizer,
intelectualmente muito original, até mesmo surpreendente. Suas animadas arengas
demonstram, em vários idiomas, uma mente muito atrás de seu tempo.
Já
o grande círculo militar do poder parece ter faltado a algumas aulas na Escola
Superior de Guerra e não ter se empenhado muito na leitura das obras de
Golbery. Isso explicaria as misteriosas referências à Terceira Guerra Mundial,
provavelmente desencadeada contra o kit gay, aliado da mamadeira de piroca, bem
como a total ausência de rigor geopolítico em suas soi disant “análises”.
Não
creio que haja funcionalidade política nessa grotesca barafunda. Qualquer
governo, mesmo aquele que não tem compromisso com os interesses do país e do
seu povo, precisa de credibilidade e legitimidade para administrar.
No
entanto, o desgoverno do capitão parece obstinadamente empenhado em queimar
rapidamente todo o seu capital político, laboriosamente amealhado em anos de
fake news e de ódio a tudo que cheire a progresso.
Muito
provavelmente, a legião de acéfalos que se apossou do Estado achava que
governar seria tão fácil quanto disseminar mentiras pelo Twitter e pelo
Facebook, ou como operar “milagres” numa igreja neopentecostal.
Infelizmente,
não é. Governar exige profundo conhecimento do país, do mundo e da máquina
pública.
É
tarefa muito complexa e difícil, que deveria ser atribuída, segundo Platão,
apenas a homens sábios.
Sabedoria
que não pode ser identificada com conhecimento acadêmico, mas que não pode
dispensar visão racional do mundo, coisa que o capitão e sua voluntarista
armada Bolsoleone evidentemente não têm.
No
governo, fé não move montanhas. Competência, sim.
Assim
sendo, não parece haver método na burrice e plano na improvisação.
Conta
a história que Leon Trotsky, exasperado com as posições irrefletidas do
escritor e político norte-americano Dwight Macdonald, teria afirmado: “Todo
homem tem o direito de ser ocasionalmente estúpido, mas o companheiro Macdonald
abusa desse privilégio”.
Como
Goethe, Trotsky não conheceu Bolsonaro.
https://www.viomundo.com.br/voce-escreve/marcelo-zero-brasil-foi-assaltado-por-uma-legiao-de-oligofrenicos-que-nao-tem-a-menor-ideia-de-como-governar-o-pais.html?utm_medium=popup&utm_source=notification&utm_campaign=site
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