No
apagar das luzes da gestão de Rodrigo Janot, o Ministério Público, através de
seu conselho, estabeleceu as regras para, de forma autônoma, dirigir todos os
processos de delação premiada da maneira que quiser.
O
professor Fernando Hideo Lacerda, no Conjur, diz que, a partir de agora, o
Ministério Público “se atribuiu o poder de escolher quem vai ser investigado
(até mesmo de ofício); designar internamente quem vai ser o investigador;
definir livremente como vai ser conduzida a investigação, a ponto de decidir
discricionariamente quais depoimentos vai ou não transcrever nos autos e quais
provas vai ou não dar acesso ao investigado; submeter as polícias (inclusive
guardas municipais) ao cumprimento de suas ordens; instaurar uma “persecução
patrimonial” especificamente para caçar bens do investigado independentemente
da apuração da sua conduta; e, ao final, arquivar sem controle judicial o
procedimento que ele mesmo instaurou e conduziu de forma totalmente
discricionária. ”
Isto
é, os procuradores ficam autorizados a “anistiar” crimes, se a delação do
criminoso lhes for conveniente, com apenas um “carimbo” burocrático do Poder
Judiciário. É o que foi feito, com consequências desastrosas, no caso da JBS.
O
MP passa, assim, a ser o dono da lei: se decidir que “não vem ao caso”
aplicá-la está livre para “fingir que não viu” os crimes de quem disser o que
quer ouvir.
A
frase atribuída a Maquiavel – que jamais
a escreveu, aliás – era usada por muitos, nos anos 70, para desqualificar a
esquerda : o fim justifica os meios.
Se
a moralização da vida pública brasileira fosse o fim do que estamos vivendo,
talvez se pudesse debater este conceito na pretensão do MP.
Mas
o poder absoluto, total, sem regras e sem contrapesos à autoridade é, mais do
que qualquer coisa, corruptor.
Desapareceram
todas as fronteiras que garantiam este princípio. A Polícia quer ter o poder de
negociar delações premiadas, invadindo a esfera da ação penal; O Ministério
Público quer investigar, como se para isso tivesse agentes e estruturas. E os
juízes querem os dois poderes, o de investigador e o de acusador.
E
os procuradores, convertidos em
“mercadores” da verdade que já têm para si definida e não precisam ser
construídas no contraditória acusação vs. defesa.
O
juiz Rubem Casara, em texto publicado no Justificando, resume bem como tudo se
torna, então, um negócio, onde a busca pela verdade não interessa mais, apenas
que se diga o que foi transacionado:
A
liberdade e a verdade, valores da jurisdição penal democrática, passaram a ser
tratadas como mercadorias. Os direitos e garantias fundamentais (…) também
passaram a ser tratadas como mercadorias. E o que caracteriza a mercadoria?
Mais do que a existência de um valor de uso e de um valor de troca, é a
possibilidade de ser negociada, substituída e, quando se torna obsoleta,
descartada.
No
momento em que o neoliberalismo foi alçado à condição de “nova razão de mundo”,
os valores e princípios que condicionavam a atuação dos sujeitos, tanto na vida
privada quanto na vida pública tornaram-se negociáveis e, portanto,
descartáveis.
Mercadoria
supõe, portanto, que seja negociada com “lucro máximo” para ambas as partes. No
caso da nossa legislação, que nem sequer prevê salvaguardas como a de não
aceitar colaboração quando o réu está preso (e, portanto, coagido) e que vem
sendo usada, até, com efeito retroativo sobre casos já sentenciados (“você vai
passar dez anos na cadeia, mas se falar, deixo por um ano e meio, que tal?“), o
resultado é claríssimo.
Os
casos podem ser conduzidos com suposições e convicção, que receberão, como
cereja do bolo, a declaração extorquida do delator, que entra apenas para
“fechar o caixão” do finado, digo, do acusado.
A
longa temporada -que não findou – de amedrontamento do Poder Judiciário a um
juiz convertido em super-herói – pela
mídia, pelos oportunistas políticos e pelos maníacos punitivistas – e a
procuradores, inclusive o Geral, que se portam como deuses castigadores da
sociedade devassa, transformaram o MP no Quinto Poder.
Como
os três tradicionais – Executivo, Legislativo e Judiciário – já foram moídos,
na expressão de Joesley Batista ( que merecia o perdão total até a semana
passada e, agora, todo o castigo possível e impossível), restam dois.
O
quarto, a Mídia, e seu carrasco, o Ministério Público.
http://www.tijolaco.com.br/blog/o-estado-nao-pode-ser-esperto-moleque-ou-canalha/
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