Nos
anos 1940, fugindo do nazismo, o escritor austríaco Stefan Zweig mudou-se para
o Brasil, onde teve contato com uma terra que, em suas palavras, “o encantou e
comoveu”. Em seu livro ‘Brasil, País do Futuro’ foi além do lugar comum de
exaltação de belezas naturais, e versou sobre as potencialidades de uma
sociedade que afastava a segregação racial e subjugação do outro, tinha aversão
a guerras e desconhecia perseguições religiosas. Sua visão idílica o impediu de
se aprofundar nas marcas da escravidão, nas atrocidades do Estado Novo e tantos
outros problemas que poderiam ser destacados. Contribuiu, porém, para a
construção de uma visão sobre nós mesmos enquanto uma nação com capacidade de
superar mazelas históricas e desenvolver-se.
Diante
da instalação de uma cleptocracia no Palácio do Planalto, da retomada de
projetos de privatização de setores estratégicos e da entrega da Amazônia, não
há como deixar de questionar sobre onde foi parar o Brasil dos olhos de Zweig.
Combinado a esses fatores, o corte de investimentos em educação e pesquisa são
a receita para levar o Brasil a se transformar não no país do futuro, mas da
subserviência.
Enquanto
o Ministério de Ciência e Tecnologia de Temer cobra das Universidades e
Institutos Federais uma adaptação a tempos de escassez, bilhões escoam com
pagamentos de juros da dívida, desonerações e sonegação fiscal, sem mencionar
nas malas encontradas no apartamento de um ex-ministro, e das que compram votos
no Congresso Nacional, que servem tanto para aprovar reformas que espoliam o
povo quanto para assegurar a impunidade de quem institucionaliza a corrupção.
A
situação é alarmante.
No
primeiro semestre de 2017, 70% das Universidades Federais sofreram cortes, e os
investimentos em ciência, tecnologia e educação superior já representam 50% do
que lhes havia sido destinado em 2015. De acordo com os cálculos de Carlos
Rocha, professor do Instituto de Economia da UFRJ, o contingenciamento deste ano
já representa uma perda de quase R$ 12 milhões por dia.
Com
os Institutos Federais não é diferente. Depois de experimentarem a maior
expansão de sua história, interiorizando a educação profissional e tecnológica,
pública e de qualidade, estão com um contingenciamento de 20% de custeio e de
55% em investimento nos seus orçamentos de 2017, para uma previsão que já era
menor em comparação a 2016. Alunos estão abandonando seus cursos em função da
redução do auxílio que recebem, pagos com o decrescente recurso da assistência
estudantil, fundamental para garantir a permanência e êxito dos estudantes de
baixa renda.
No
momento em que o Brasil deveria aproveitar seu bônus demográfico, o CNPq está
autorizado a gastar apenas 56% do total previsto do orçamento aprovado para
este ano, grande parte já executado, o que coloca em risco a continuidade das
bolsas de mestrado e doutorado, bem como de pesquisas em andamento, inclusive
com perda de resultados.
Um
entrave real ao nosso desenvolvimento, que impede a possibilidade de agregação
de valor direto à ciência e à economia nacionais por meio do avanço
tecnológico. Sem pesquisa não há inovação, sem a qual não há desenvolvimento.
Abrimos
mão de setores estratégicos ao mesmo tempo em que fechamos as portas da
educação profissional e superior e para a construção de um futuro soberano.
Em
contraste absoluto com o que vislumbrava Zweig, ‘Caravana’ - canção lançada por
Chico Buarque recentemente -, retrata esse Brasil de hoje, bem como o que
poderemos nos tornar caso o presente estado de coisas seja mantido. Coloca luz
sobre. “A gente ordeira e virtuosa que apela pra polícia despachar de volta o
populacho pra favela, ou pra Benguela, ou pra Guiné”, diz uma estrofe. Vai além
em “filha do medo, a raiva é mãe da covardia”.
Nada
mais correto, afinal, há outra maneira de nominar o que está sendo feito que
não covardia?
http://midianinja.org/mariadorosario/brasil-o-pais-da-subserviencia/
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