Numa
resposta que escancarou a crise institucional brasileira - aquela que centenas
de deputados e senadores estão chamando de funcionamento pleno das instituições
- a presidenta do STF, ministra Cármen Lúcia, praticamente classificou como
desrespeitosa e anti-republicana a declaração do presidente do senado, senador
Renan Calheiros (PMDB-AL), que criticou a operação da PF que culminou na prisão
de quatro policiais legislativos, comandada, segundo Calheiros, por um “chefete
de polícia” com mandato expedido por um “juizeco”.
Analisando
os fatos isoladamente Lúcia tem mais razão que Calheiros. Evidentemente, o
cargo máximo de um poder chamar a mídia para lançar críticas aos seus pares
republicanos é irresponsável e desnecessário num Estado onde as instituições
conversam e vivem harmoniosamente.
Todavia,
na realidade brasileira, Cármen soa tão dissimulada que suas declarações soltam
mais aos olhos do que o tom desproporcional que o senador alagoano utilizou em
sua entrevista coletiva sobre a Operação Métis. E a hipocrisia da magistrada
vem, justamente, de alguém que utiliza o argumento do respeito entre os três
poderes mas tem como colega de trabalho Gilmar Mendes, um ministro que milita
mais que muito deputado e tinha tudo para ser comentarista de política da Globo
News.
A
empatia da ministra parece estar restrita ao mundo do judiciário, sem fazer o
mínimo de análise crítica - ou mea culpa - sobre as palavras fora dos autos que
seus colegas de toga apresentam, como, por exemplo, as críticas que o juiz
Sérgio Moro faz, em suas palestras, aos projetos de lei quais não concorda
(claramente uma invasão do judiciário no legislativo, não?).
Mas
o rei dos pitacos fora dos autos, imbatível a ponto de sensibilizar o âncora do
Jornal Nacional (“Se você mandar repórter, decido alguma coisa importante”),
certamente é o ministro Gilmar Mendes. E os exemplos são intermináveis, como
críticas a um programa de governo, o Bolsa Família e à justiça do trabalho, o
TST que “hiperprotege” os trabalhadores numa mesma palestra. Sem falar em
entrevistas, nas quais Gilmar abre a metralhadora de opiniões e opina sobre
órgãos de Estado, como o MP, e a PF subordinada ao executivo.
Obviamente,
essa crise descomunal na política brasileira não surpreende quem sabia, desde o
início, que o país vivia um Golpe de Estado, afinal, a alcunha “ruptura institucional”
não existe à toa. Ao ferir de morte a constituição para impor um plano do
executivo derrotado nas urnas, foi aberta uma chaga incurável na nossa
democracia, em que a sensação de “vale tudo” se sobrepõe a lógica das leis e da
Ética como pressuposto para relações coletivas socialmente estáveis e focada no
bem comum.
Há
tempos não se via um exemplo tão claro da máxima “para os amigos tudo, para os
inimigos a lei”, fato que não só traduz
o nível de degradação pelo qual nosso judiciário passa mas também escancara o
contexto em que o Brasil se encontra, com as pontas entre os poderes soltas e
as instituições batendo cabeça para saber quem consegue aumentar (e impor) cada
vez mais suas influências.
Tadeu Porto é Diretor do
Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense
http://www.ocafezinho.com/2016/10/25/carmen-lucia-critica-renan-e-gilmar-pode-tudo/
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