terça-feira, 20 de abril de 2010

ÍNDIOS. SEGURADOS ESPECIAIS


O juiz Candido Alfredo Silva Leal Junior da Vara Federal Ambiental de Porto Alegre aceitou o pedido feito em Ação Civil Pública movida pelo MPF contra o Instituto Nacional do Seguro Social e a Fundação Nacional do Índio, onde foi pedida a declaração de inconstitucionalidade da norma da Previdência Social que distinguia índios “aldeados” dos “não aldeados”. “Não perdem a condição de indígenas aqueles que deixaram suas terras tradicionais e passaram a residir em centros urbanos, sobrevivendo da atividade de artesanato”, disseram os procuradores na ação. O INSS recorreu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região no dia 11 de março e ainda aguarda a análise da apelação.

Condenada a emitir certidões aos índios urbanos que atestassem a condição de “artesão”, a Funai não cumpriu a exigência determinada na decisão liminar. Já o INSS, condenado a reconhecer o índio urbano como segurado especial na categoria “trabalhador rural”, revogou o trecho da norma que dava essa condição às aldeias. O juiz não engoliu. “Se antes o INSS reconhecia como segurado especial apenas o indígena-aldeado, com a revogação daquela instrução normativa deixou de reconhecer também estes indígenas aldeados como segurados especiais”, disse.

A decisão, contudo, põe o benefício sob um critério bastante delicado: o índio é segurado não por causa de sua condição econômica ou seu meio de vida, mas simplesmente por ter nascido índio. “O artesanato indígena não pode ser comparado ao produzido pelo não-índio, uma vez que o artesanato indígena é resultado de produção com a participação dos membros do núcleo familiar, desde a coleta até a confecção do objeto”, argumentou o MPF. O juiz concordou.

A ambiguidade dessa interpretação foi o que o INSS tentou questionar. “O indígena não pode ser considerado segurado especial pelo só fato de exercer atividade rural ou de fabricação de artesanato”, alegou.

O entendimento do titular da Vara Federal Ambiental se baseou na avaliação da antropóloga do Ministério Público Elaine de Amorim Carreira. Segundo ela, a legislação não prevê o suporte previdenciário necessário ao índio que, embora morando na cidade, mantém os mesmos costumes de seus distantes coirmãos. Para ela, nos centros urbanos, eles não podem se enquadrar na condição de trabalhador rural, o que os deixa em um limbo. “Nos encontramos diante de uma situação onde várias comunidades indígenas, apesar de manterem seus usos, costumes e tradições, estão excluídas da seguridade-social por não perfazerem os requisitos convencionais do modelo jurídico-administrativo vigente”, disse ela, mas completou: “o fato de dependerem dos labores típicos das cidades não significa que possam ser tratados como brancos”, levando novamente a discussão para a questão da raça.

Para o juiz Candido Leal Junior, tudo se resume ao desenvolvimento de economia familiar. “O que difere as duas atividades é tão somente o local onde reside o indígena, o que não parece suficiente para autorizar a distinção”, afirmou. Confirmando a cautelar, ele reconheceu o mesmo direito a todos os índios que exerçam atividade artesanal em regime de economia familiar, com o uso de matéria-prima vegetal extraída da natureza, desde que essa atividade seja seu principal meio de vida. Ele obrigou, ainda, o INSS a editar, em até 60 dias, um ato normativo para reconhecer o direito dos índios e aplicou multa diária de R$ 1 mil, a contar de 17 de julho até 19 de novembro de 2009. O total é de R$ 125 mil.

Ação Civil Pública 2008.71.00.024546-2

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

Nenhum comentário: