quinta-feira, 29 de abril de 2010

ADOÇÃO DE CRIANÇAS POR CASAL HOMOSSEXUAL. UMA VITÓRIA E UM SINAL DE ALERTA


“É hora de abandonar de vez os preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e dos adolescentes”.

Estas são as palavras do desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, relator do recurso em que a 7ª Câmara Cível do TJRS confirmou, por unanimidade, no dia 5 de abril de 2006, sentença da comarca de Bagé que concedeu a adoção de duas crianças a um casal de mulheres homossexuais.

As duas mulheres Luciana Reis Maidana (psicóloga, 36 anos de idade atual) e Lídia Brignol Guterres (fisioterapeuta, 44 de idade), convivem desde 1998. Luciana obteve a concessão para adotar os dois irmãos biológicos; atualmente um está com 7 anos e 6 meses; o outro, 6 anos e 3 meses de idade. Posteriormente à adoção, a companheira ajuizou ação postulando também a adoção dos menores.

A adoção passará a ser formalizada em nome das duas. No registro de nascimento dos meninos, constará que são filhos das duas mulheres, sem especificação de pai ou mãe.

O relator fez referências a estudos especializados em diversos países, que - em tese - não detectaram qualquer inconveniente na adoção de crianças por casais homossexuais. Segundo ele, “mais importa a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga a seus cuidadores".

Fazendo um comparativo com as uniões entre pessoas do mesmo sexo – convivência duradoura, pública, contínua e com o objetivo de constituir família – o voto concluiu ser possível o reconhecimento do direito de adotar a uniões entre homossexuais.

O voto do desembargador Luiz Felipe Brasil Santos foi longo e apreciável. Ele rememorou que "temos, no Brasil, cerca de 200 mil crianças institucionalizadas em abrigos e orfanatos. A esmagadora maioria delas permanecerá nesses espaços de mortificação e desamor até completarem 18 anos porque estão fora da faixa de adoção provável. Tudo o que essas crianças esperam e sonham é o direito de terem uma família no interior das quais sejam amadas e respeitadas".

Depois, o voto incursionou no Direito comparado, trazendo conceitos de autores espanhóis, franceses e norte-americanos.

A desembargadora Maria Berenice Dias acrescentou que as crianças “têm duas mães, e a Justiça não pode negar isso”.

Julgamento no STJ

Por unanimidade, os ministros da 4ª Turma do STJ negaram recurso do Ministério Público do Rio Grande do Sul e mantiveram a decisão que permitiu a adoção de duas crianças por um casal de mulheres.

Seguindo o voto do relator, ministro Luis Felipe Salomão, a Turma reafirmou um entendimento já consolidado pelo STJ: nos casos de adoção, deve prevalecer sempre o melhor interesse da criança. "Esse julgamento é muito importante para dar dignidade ao ser humano, para o casal e para as crianças", afirmou.

A decisão apontou, ainda, que estudos não indicam qualquer inconveniência em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, importando mais a qualidade do vínculo e do afeto no meio familiar em que serão inseridas. O Ministério Público gaúcho recorreu, alegando que a união homossexual é apenas sociedade de fato, e a adoção de crianças, nesse caso, violaria uma série de dispositivos legais.

O ministro Luis Felipe Salomão ressaltou que o laudo da assistência social recomendou a adoção, assim como o parecer do Ministério Público Federal. Ele entendeu que os laços afetivos entre as crianças e as mulheres são incontroversos e que a maior preocupação delas é assegurar a melhor criação dos menores.

O presidente da 4ª Turma, ministro João Otávio de Noronha, fez um esclarecimento: “Não estamos invadindo o espaço legislativo. Não estamos legislando. Toda construção do direito de família foi pretoriana. A lei sempre veio a posteriori”, afirmou o ministro. (Número do processo não foi informado).

Fonte: STJ

Caso pioneiro de Bagé

Marcos Danilo Edon Franco, juiz da Vara da Infância e da Juventude de Bagé (RS), concedeu em novembro de 2005 o registro de adoção de duas crianças (irmãos), às duas mulheres conviventes homossexuais.

À época, dois meninos - um de 2 anos e outro de 3 anos - foram adotados, por sentença, por duas mulheres - de instrução superior - conviventes em união estável há mais de sete anos. Uma delas já era responsável pela criação desde o nascimento dos irmãos.

O fundamento da sentença é o de que "a sociedade não pode ignorar a relação entre pessoas do mesmo sexo", que ele qualifica como "um determinismo biológico, e não uma mera opção sexual". Ele enfatizou que "o homossexualismo não afeta o caráter nem a personalidade de ninguém". Explicou que, ao conceder a adoção, considerou a excelente criação e ambiente de afeto em que vivem as crianças, satisfazendo todos os requisitos que muitas vezes não estão presentes nos lares de casais "considerados normais pela sociedade".

(Proc. nº 70013801592).

Sinal de Alerta. Projeto de Lei nº 7018/10

É necessário que se faça um sinal de alerta para o fato de que, na contramão de tais decisões do nosso poder judiciário, está sendo analisado pela Câmara, o Projeto de Lei nº 7018/10, que proíbe a adoção de crianças e adolescentes por casais do mesmo sexo (homoafetivos). A proposta, do deputado Zequinha Marinho (PSC-PA), altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - Lei nº 8.069/90).

Atualmente, para o caso de adoção conjunta (feita por casais), o estatuto exige que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família. O texto proposto pelo autor acrescenta a esses requisitos a vedação explícita de os casais serem constituídos por pessoas do mesmo sexo.

Segundo a opinião de Marinho, a adoção por casais homossexuais expõe a criança a sérios constrangimentos. "O filho terá grandes dificuldades em explicar aos seus amigos e colegas de escola por que tem dois pais ou duas mães", exemplifica. Ele sustenta ainda que a instituição familiar é constituída obrigatoriamente a partir da união de um homem e uma mulher.

O projeto será analisado em caráter conclusivo pelas comissões de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. (Com informações da Agência Câmara)

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

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