O
jornalista Leonardo Fernandes do Brasil de Fato entrevistou o ex-ministro.
(…)
Qual
é a sua convicção em relação à possibilidade de Lula ser candidato nas eleições
desse ano?
Olha,
nós faremos de tudo para transformar no mais alto custo possível essa tentativa
deles de impedirem a candidatura do ex-presidente Lula. Eles ficam, através dos
colunistas pagos por eles, tentando nos convencer a colocar um plano B. Não
peçam para que nós pratiquemos esse absurdo, que é tirar o Lula da eleição,
porque é o povo que quer o Lula na eleição.
No
entanto, o episódio do domingo retrasado [8/7] não deixa dúvida de que eles não
terão escrúpulos e farão o possível e o impossível, o legal e o ilegal, para
impedir a candidatura dele. Por que? Porque está no cerne da lógica do golpe.
Então vai ser uma batalha muito dura.
Não
será nem a tecnicalidade, nem a competência dos advogados, que é importante, ou
muito menos qualquer conversa com juízes, ministros, que vai tirá-lo da cadeia.
Só
há uma forma de tirá-lo da cadeia: um levante popular, uma mobilização muito
forte, uma radicalização do processo, seja de que forma for, que faça com que
eles sintam que está ameaçada a estabilidade do país, e aí, por uma razão de
força maior, libertem o Lula. Por isso que nós estamos apostando num processo
de mobilização muito forte, daqui até o dia 15 de agosto.
No
dia 15 nós vamos à Brasília, e estamos convidando todo o povo brasileiro para
que assuma esta tarefa: eu vou registrar Lula. E nós temos que colocar dezenas
de milhares de pessoas lá, ao lado das outras mobilizações, da marcha que será
feita pelos movimentos da Via Campesina, do dia 10, que esperamos que seja um
dia de paralisação nacional, da greve de fome que começa agora no dia 31, na
linha da radicalidade que nós queremos dar para essa luta. Só assim nós vamos
tirar o Lula da cadeia.
Como
o senhor avalia o papel do judiciário no atual contexto político do país?
Eu
acho que os tempos de crise são tempos de grande aprendizado, são pedagógicos.
Houve um tempo em que, para deter o avanço dos movimentos sociais e sobretudo
de políticas progressistas, de governos progressistas, foi necessário que o
capitalismo usasse a farda. Foi assim em 64 e sempre casado com uma forte
atuação ideológica da mídia.
Getúlio
foi cercado e levado ao suicídio por uma ação fortíssima da mídia que o isolou,
sempre com o argumento da corrupção. O João Goulart, enquanto o seu governo
crescia, foi fortemente cercado pela mídia e o tema, como no tempo de Getúlio,
era a corrupção e o comunismo. Depois, com o Juscelino, fizeram toda a
desconstrução que fizeram. Depois conosco, com o Lula, em 2005, tentaram fazer
aquela grande campanha de mídia na época do mensalão.
E
agora, o neoliberalismo, nessa versão que a gente pode chamar de
pós-democrática, porque da democracia resta apenas a aparência. Na essência, a
democracia e a Constituição são constantemente violadas, sempre que necessário.
O neoliberalismo usa como instrumento fundamental, não mais a farda, mas a
toga.
Nós
nunca tivemos ilusão quanto ao papel do Estado como máquina da dominação. E
agora, de novo, a toga é usada. E assim como no regime militar se romperam os
próprios princípios da cultura militar, foram para a linha da tortura, da
perseguição, da morte, agora também o aparato da justiça violenta a justiça e
aí vale tudo.
É
o Moro que grava conversas entre o Lula e a Dilma, a Presidenta da República
naquele então, e nada acontece. São os processos baseados na delação sem prova
nenhuma e nada acontece. É o que o Brasil todo assistiu, aquele escândalo do
domingo, em que uma ordem judicial não é cumprida e nada acontece. Ou seja,
contra nós vale tudo. O que é perigosíssimo, porque com isso vai se verificando
na cultura política e no judiciário do país um relativismo perigoso, além da
ofensa permanente à Constituição. Então, eles estão plantando vento e em algum
momento vão colher tempestade, eu não tenho dúvidas disso.
Eles
estão brincando com fogo, usando a favor deles uma máquina que amanhã pode ser
usada contra eles. Esse é o problema. Então a gente está muito preocupado com
isso e lamentando muito. E vamos lutar como pudermos para devolver ao país o
funcionamento constitucional que base para a democracia.
Como
um articulador dos governos Lula e Dilma, como o senhor acredita que seria um
novo governo petista, caso esse seja o resultado das eleições? É possível
pensar em uma composição de forças como a que sustentou os governos anteriores?
Como
eu disse, todo momento de crise é um momento de aprendizado. De sofrimento
profundo, mas de aprendizado também. É evidente que a crise joga uma luz sobre
o nosso passado e no obriga a fazer uma releitura da maneira como nós trabalhamos.
Nos faz ver os acertos, mas também reconhecer de maneira muito mais serena os
nossos erros. Sem dúvida nenhuma, um dos nossos equívocos, mesmo naquela
conjuntura, foi de confiar em alianças com setores que são inimigos da classe
trabalhadora, e que, oportunisticamente, se acoplaram a nós quando viram que
era irreversível a nossa vitória.
Claro
que tudo isso é muito complexo, porque sem uma aliança naquele momento com o
José de Alencar, a gente possivelmente não teria vencido as eleições, e não teria
governado. O problema não foi fazer alianças, elas eram necessárias, o problema
foi que nós nos acomodamos naquele padrão de alianças, naquele padrão de
governabilidade parlamentar e não construímos uma governabilidade social, não
procuramos estimular a luta social, o sentido da organização, de fortalecer as
organizações sociais, não fizemos processos de conscientização que fizessem com
que as pessoas, ao se beneficiar das políticas daqueles governos,
compreendessem que fizeram parte de um projeto que tinha começo, meio e fim,
que tinha uma lógica, e portanto, deixamos de fazer com que as pessoas dessem
um salto de qualidade e, com isso, depois, pudessem também fazer a defesa do
nosso projeto, desse sustentação a ele.
De
modo que, quando aqueles que oportunisticamente estiveram conosco resolveram
nos trair, não havia base social suficiente para defender o nosso projeto. O
povo faltou. O povo faltou no impeachment, o povo faltou na prisão do Lula. Mas
não é culpa do povo. Nós pedimos apenas o voto das pessoas, nós não pedimos que
as pessoas fossem organizar a luta.
E
aí tem todo o problema do processo de comunicação que nós ignoramos,
infelizmente. Não cultivamos uma mídia democrática, eu não falo de mídia
estatal, nem partidária, mas do estímulo à mídia democrática. Preferimos
financiar os grandes meios, que se tornaram, ironicamente, os nossos principais
algozes, quando os interesses do capital financeiro que os sustenta e do qual
eles fazem parte, estão associados, determinassem que viessem contra a gente.
Então,
o próximo governo deve ter uma outra feição. Primeiro, de construir essa
governabilidade social fortemente. Segundo, evidentemente, não contar mais com
forças que já mostraram que a qualquer momento se colocam contra os interesses
populares.
(…)
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/so-um-levante-popular-tira-lula-da-prisao-diz-gilberto-carvalho/
Nenhum comentário:
Postar um comentário