Há
algum tempo fiz comparações entre os programas econômicas do golpe de 1964 e do
golpe de 2016. Antes disto já havia feito comparações políticas entre os
líderes que rasgaram a CF/4946 e a CF/1988 para retirar a soberania popular do
cenário político.
Hoje
retornarei ao assunto, enfocando as particularidades políticas dos dois golpes.
O golpe de 1964 tinha um projeto de nação claro e o colocou em prática sob o
comando dos militares. As elites não estavam divididas em relação ao aspecto
político mais importante do novo regime: os militares deveriam ficar no comando
do Estado e reprimir os dissidentes dentro da Lei (e fora dela quando
possível).
A
divisão política das elites na atualidade é evidente. Elas concordam com as
reformas, mas não conseguem encontrar um único líder para comandá-las. Geraldo
Alckmin comanda o Estado mais rico da federação e tem ambições presidenciais,
mas está sendo obrigado a enfrentar o sorridente prefeito de São Paulo que
rapidamente conquista a preferência da mídia. Bolsonaro é o candidato da
direita retro e certamente retirará alguns milhões de votos de qualquer concorrente
ao cargo no campo da direita. José Serra e Aécio Neves ainda não disseram se
pretendem ou não disputar a presidência. Marina Silva continuará sendo a eterna
candidata do Banco Itaú.
Dória
Jr. é cortejado pela imprensa e já se apresentou como opção do mercado, mas é
desconhecido fora de São Paulo e será sabotado por Alckmin. Ciro Gomes sonha
ser o candidato do centro, mas é mais conhecido no nordeste e não tem
musculatura partidária para alcançar seu objetivo. Tudo bem pesado, Doria Jr. é
um Ciro Gomes com discurso pró-mercado e Ciro Gomes é um Doria Jr. com
propostas desenvolvimentistas.
Lula
não apoiou o golpe e continua sendo o candidato presidencial preferido dos
brasileiros. Se for excluído das eleições o trauma político será terrível e
comprometerá o governo do candidato vitorioso, seja ele de centro ou de
direita. Se ganhar a eleição e demolir as reformas pró-mercado de Michel Temer,
o petista enfrentará dura resistência dos setores políticos, empresariais,
financeiros e midiáticos que arquitetaram e ajudam a consolidar o golpe de
2016.
O
cenário político pós-golpe de 2016 não propicia a construção de coesão social
mediante o uso da força e sob o comando de militares (como ocorreu após 1964).
Os próprios militares tentam se desvencilhar de qualquer compromisso com o
aprofundamento do golpe.
Impedidas
de cancelar as eleições presidenciais, as forças que lideram o golpe sugerem a
adoção do Parlamentarismo. O problema é que a mudança de regime esbarra na
preferência popular pelo Presidencialismo. Além disso, os regimes parlamentares
são frágeis e raramente conseguem se sustentar durante períodos de depressão
econômica e instabilidade política. A República de Weimar desmoronou abrindo
espaço para o III Reich nazista. A adoção do regime parlamentar neste momento
poderia provocar um resultado semelhante, pois a violência do movimento
liderado por Bolsonaro só poderá ser minimizado e/ou derrotado através de um
regime forte.
Um
novo presidencialismo: é disso que o Brasil precisa. O problema é que os ideólogos
e líderes do golpe 2016 não tem interesse em fortalecer o Estado. Muito pelo
contrário, eles fragilizam o Estado acreditando que assim ocorrerá um
florescimento natural do mercado (muito embora o mercado esteja encolhendo a
olhos vistos). Além disto, os golpistas nem mesmo tem um único candidato capaz
de levar adiante as reformas pró-mercado.
O
contexto político e econômico gerado pelo golpe de 1964 favorecia a preservação
do regime infame que foi criado. O contexto criado pelo golpe de 2016 só
propicia uma coisa: sua superação. Todavia, o Brasil ainda pode sair totalmente
dos trilhos com a adoção do parlamentarismo, sob o comando de um cretino como
Doria Jr.* ou nas mãos de um maníaco genocida como Bolsonaro. Gostem ou não, os
golpistas dentro e fora do Poder Judiciário serão obrigados a fazer um cálculo
racional: o Brasil ficará ruim com Lula ou pior sem ele. Melhor para o povo,
pois caso seja eleito Lula ao menos conseguirá restaurar a fé dos brasileiros
nas urnas.
*
Recentemente o prefeito de São Paulo proibiu as crianças de repetirem a
merenda. Criticado ele disse que estava preocupado com a obesidade infantil,
mas a verdade é que Doria Jr. conseguiu plagiar o personagem de Charles Dickens
que impede Oliver Twist de repetir a refeição no orfanato.
http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/um-golpe-a-deriva-por-fabio-de-oliveira-ribeiro
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