Advogados,
que militamos profissionalmente nos mais diversos ramos do direito, temos que
nos preparar para um largo período de insegurança jurídica. Esta decorre, como
sabemos, não somente pelas mudanças abruptas do direito positivo, situações que
ordinariamente podem ser resolvidas pelo exame dos conflitos como conflitos das
leis no tempo, pela aplicação dos princípios e normas que regem os direitos
adquiridos, pela doutrina e normas legais que informam as expectativas e
prerrogativas, de chamar a si, um determinado direito objetivo.
A
insegurança também não se esgota na possibilidade do Estado, unilateralmente,
romper contratos para dar respostas a situações macroeconômicas de crise.
A
situação de crise política que atravessamos, independentemente das nossas
paixões políticas e outorga de responsabilidades, gera uma insegurança de alto
a baixo na pirâmide legal, que desorganiza a vida civil e política. Esta
insegurança abala estabilidade do próprio contrato social, tal qual foi
formulado pela Constituição de 88.
As
interpretações que têm sido dadas ao seu sistema de direitos e garantias vêm
dissolvendo aquela mínima previsibilidade, que é necessária para que os
cidadãos e os sujeitos econômicos possam se mover com confiança e estabilidade,
tanto em termos de contratos de natureza econômica, como nos pactos políticos.
Já
está visto que temos, por exemplo, os "contentes" (e os
"descontentes") do dia, com as decisões do STF.
Algumas
delas, que há pouco mesmo eram apontadas como violadoras dos direitos civis e
políticos, hoje são celebradas como importantes instrumentos de luta contra
corrupção. Outras são "flexibilizadas" para premiar lideranças que
merecem um tratamento especial.
A
falta de coerência das decisões do Supremo tem abalado o princípio da igualdade
formal, de um lado, e ameaçado, portanto, o respeito à própria força normativa
da Constituição. Esta se legitima, principalmente, pela coerência da sua
eficácia no sistema de justiça, independentemente de quem for o destinatário da
decisão do Tribunal, não somente pela sua harmonia formal com os princípios.
Luigi
Ferrajoli, no seu clássico "Democracia e Garantismo" (Ed.Trotta,
Madrid, 2008, pág. 237) alerta para a adoção de um esquema conceitual "do
direito penal do inimigo", uma espécie de "despotismo penal", no
qual é gerada uma "aberta identificação com o esquema da guerra, que faz
do delinquente e do terrorista, um inimigo a suprimir não a julgar".
Não
estamos próximos desta situação, obviamente, mas algumas decisões judiciais e
manifestações públicas de magistrados e membros do MP, estabelecendo vínculos
políticos com uma das partes em conflito geram - nestas mesmas partes - uma
expectativa, não de julgamento justo dos seus adversários, mas da sua
"eliminação". Perde o Direito, perde a política democrática e a
República.
Não
podemos esquecer que, ao "direito penal do inimigo" - um direito de
guerra - normalmente sucede um direito civil do inimigo e um direito de
"expropriação do inimigo", seja por motivos de raça, classe, origem
étnica ou pela disposição de resistência contra os arbítrios do Estado.
E
nunca se sabe quem, amanhã, poderá ter direito adquirido - pela guerra - aos
despojos do Estado de Democrático de Direito. Por isso mesmo é sempre bom
celebrar mais a coerência do que a exceção. A primeira afirma a previsibilidade
da democracia, a segunda a incerteza de todos os contratos.
http://www.espacovital.com.br/publicacao-35119-um-largo-periodo-de-inseguranca-juridica#.WV-Ivg3uJ7w.twitter
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