Não
devemos nos iludir sobre o colapso brasileiro. Chegamos aquele ponto em que
todos estão insatisfeitos e nenhum dos lados tem legitimidade para assegurar
seu ponto de vista. O fracasso dos parlamentares e do presidente em exercício
dispensa comentários.
O
fiasco do Judiciário, escondido por ações da Justiça-Espetáculo, foi
escancarado no julgamento do TSE. A
rejeição da maioria dos brasileiros, que sentiu-se traída resultado, é um
sintoma.
O
problema também é grave do outro lado.
Mesmo
cidadãos que, em nome do respeito as
garantias individuais e da presunção da inocência, lembram que as delações
usadas para acusar a chapa Dilma-Temer não foram submetidas ao devido processo
legal -- fronteira que separa civilização e selvageria desde a Revolução Francesa
-- admitem que temos aqui um problema de origem. O 4 a 3 foi uma decisão
contaminada pelo casuísmo e pelo interesse político, o que lhe tira credibilidade. Pode-se até considerar correta
do ponto de vista da teoria, mas não exibe nenhuma consistência do ponto de
vista da prática jurídica e política no Brasil de 2017.
Com
escrevi neste espaço, quando comentava o 4 a 3, vivemos numa situação sem saída
na qual "o preço do certo é o errado." (9/6/2017). Esta é a
insustentável leveza do edifício institucional do país.
É
possível enxergar um paisagem de escombros, onde há dois caminhos à frente.
Um
deles é a continuidade provisória do governo Temer e sua queda mais do que
provável sob direção do condomínio judiciário-midiático que vem acumulando
poder desde a AP 470. Caso a queda se confirme, o plano é que seja substituído por um novo candidato escolhido
pelos mesmos articuladores do golpe que afastou Dilma. O novo príncipe -- agora
sem a mais remota conexão com as urnas de 2014 -- teria a incumbência de tocar
as mesmas prioridades -- a começar pelas reformas.
Como
a prioridade real aqui não é preservar a democracia -- mas um projeto econômico
sem respaldo popular -- pode-se apostar que todas as contradições que empurram
Temer para fora o Planalto irão se manter, crescer e se multiplicar.
É
fácil entender porque isso acontece. O
traço mais revelador da profundidade da crise que enfrentamos reside na
constatação de que nenhuma das partes em conflito na cúpula do Estado, numa
disputa palmo a palmo -- ou bilhões a bilhões,
para ser mais claro -- se mostra capaz de falar pela maioria dos
brasileiros e construir um acordo político pela voz da democracia. Há uma
oposição cada vez mais clara, visceral, entre o projeto de quem governa -- e o
ponto de vista de quem é governado.
É
por isso que muitos analistas dizem que a Constituição de 1988 se esgotou.
Outros falam que o universo criado pela
Nova República se extinguiu. Sem discordar, não vou tão longe.
Mas
não é possível ter dúvidas de que o ciclo inaugurado pelo afastamento de Dilma
-- seja chamado de golpe, como acho adequado, de encenação, como disse Joaquim
Barbosa, de impeachment, como sustentam os beneficiários -- terminou. Não representa o país, nem do
ponto de vista daqueles que pediam Fora Dilma. Não dá mais. Se havia um tênue
fio de continuidade com o voto popular na investidura de Temer, um mandato tão curto como desastroso
encarregou-se de romper.
Nesta
situação, é inaceitável escolher a
presidência República num salão
aristocrático onde milionários e seus empregados de confiança tentarão, no
prazo de um ano e meio de reinado espúrio, produzir mudanças de longa duração e
muita profundidade sobre o destino das brasileiras e brasileiros -- a quem se
reserva o direito de se conformar e se submeter.
Não
é uma questão de nomes mas de método.
No
Brasil de 2017, os Três Poderes estão
dominados por um pacto incapaz de gerar um consenso que permita a nação se
levantar e debater o futuro que deseja construir. As principais referências
foram rompidas, as cartas estão embaralhadas.
Mesmo
para enfrentar uma situação extrema, nossa Constituição rejeita todo e qualquer
ensaio de Poder Moderador, conceito que não passa de uma palavra chique para
acobertar tramas de quem toma decisões cruciais para o destino da nação sem
pedir autorização ao povo.
Numa
conjuntura de reconhecida gravidade, a única opção consistente para se
construir um novo consenso político é a democracia. Nem é preciso discutir
muito. A possibilidade de se chegar a isso se encontra no artigo 1 da
Constituição. Ali se diz, com simplicidade: "todo poder emana do povo, que
o exerce em nome de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta
Constituição."
Estamos
falando de eleições diretas. Não é discurso de palanque, nem palavra solta em
panfleto. É a única saída contra um desastre cuja sombra torna-se cada vez mais
visível no horizonte.
http://www.brasil247.com/pt/blog/paulomoreiraleite/300684/Direta-n%C3%A3o-%C3%A9-op%C3%A7%C3%A3o-%C3%89-necessidade.htm
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