"Não
percebo a contradição entre o meu papel como historiadora e o fato de ser filha
de [Luís Carlos] Prestes e Olga [Benário]", disse Anita Prestes, que já
nos primeiros dias de maio lança uma nova biografia sobre sua mãe. "Olga
Benário Prestes — Uma Comunista Nos Arquivos da Gestapo" é o nome do livro
que revela detalhes do processo de 2.000 páginas que resultou na execução da
judia alemã e comunista, em uma câmara de gás dos nazistas em 1942, aos 34 anos
de idade.
"Olga
Benário Prestes foi minha mãe e a grande inspiração de toda minha vida. Luís
Carlos Prestes, meu pai, também foi uma grande inspiração da minha vida. Antes
de conhecê-lo pessoalmente aos nove anos de idade, eu já conhecia sua história,
que me fora transmitida pela minha avó Leocádia Prestes e minha tia Lygia
Prestes. Sempre fui muito ligada ao meu pai e à sua luta abnegada pela
revolução no Brasil. Na idade adulta tornei-me interlocutora de confiança do
meu pai e cheguei a atuar como sua assessora nos últimos 15 anos da vida
dele", conta a historiadora.
Benário,
nascida em Munique, em 1908, teve desde muito jovem um papel ativo nos
movimentos comunistas da Alemanha. Aos 20 anos, exilou-se na União Soviética,
com o seu parceiro, o escritor Otto Braun, a quem ajudou a escapar da prisão,
mas depois se separaram.
Ficção
e vida real se misturam: ambos estabeleceram uma relação. No entanto, o casal
acabou nas mãos da polícia mais tarde. Uma investigação conjunta com a Gestapo
revelou a verdadeira identidade de Benário, que também era judia. A Alemanha
estava em plena época de perseguição dos judeus. Apesar de estar grávida de um
brasileiro, foi deportada para a Alemanha em 1936.
Em
Moscou, ela conheceu o líder político brasileiro Luiz Carlos Prestes, a quem
eles chamavam de Cavaleiro da Esperança, porque, entre 1925 e 1927, percorreu o
Brasil em uma marcha de 25.000 quilômetros a pé, juntamente com 1.500 homens
para semear a revolução no país. As tentativas deste grupo, conhecido como
Coluna Prestes, fracassaram e logo depois ele teve que partir para o exílio na
União Soviética. Em 1934, voltou a seu país para liderar um novo movimento e
Benário recebeu a missão de protegê-lo, porque estava militarmente treinada
pelos soviéticos. Os dois viajaram escondidos, como um casal em lua-de-mel.
No
final do mesmo ano, nasceu Anita Leocádia Prestes, em uma prisão de Berlim.
Indagada sobre o peso de ser filha de personagens tão emblemáticos, a doutora
em Filosofia pelo Instituto de Ciências Sociais de Moscou destacou o orgulho
que sente de seus pais e o ideal de justiça social que lhe imprimiram.
Separada da mãe
Pouco
mais de um ano depois de nascer, Anita Prestes foi separada de sua mãe e
entregue à família brasileira para escapar da prisão. Benário resistiu seis
anos e passou por outros campos de concentração, até que morreu executada numa
câmara de gás no dia 23 de abril de 1942. Na última carta a Prestes e sua
filha, Olga escreveu: "Lutei pelo justo, pelo bom e pelo melhor do mundo…
Quero que me entendam bem: preparar-me para a morte não significa que me renda,
mas sim saber fazer-lhe frente quando ela chegue".
Uma
parte dessa história foi retratada em inúmeros livros e em um comovente filme.
Mas, como os agentes da Gestapo descreviam Olga?
"Meu
livro sobre minha mãe, a ser publicado em breve pela Editora Boitempo, está
baseado em documentação inédita do Arquivo da Gestapo liberado ao público há
dois anos. Nele haverá muitas informações até agora desconhecidas e que, por
essa razão, por enquanto, mantenho em segredo para aguçar a curiosidade do
público", disse Anita.
Tais
documentos somam cerca de 2.000 páginas do chamado Processo Benário. Os papéis
haviam sido apreendidos pelo Exército Vermelho, após a derrota de Hitler na
Segunda Guerra Mundial. Permaneceram guardados durante décadas na capital
russa. De acordo com a apresentação preliminar da obra pela editora, o material
revelado inclui cerca de cinquenta cartas recebidas e escritas por Olga para a
família de seu marido, também preso, mas no Brasil.
Anita
Prestes lança neste mês a biografia "Olga Benário Prestes - Uma Comunista
nos Arquivos da Gestapo"
Biografia
No
ano passado, Anita também publicou uma biografia de seu pai, intitulada "A
Coluna Prestes", em referência à histórica marcha liderada pelo Cavaleiro
da Esperança. A escritora se apresenta como uma "comunista
brasileira" orgulhosa dos ideais internacionalistas de seus pais, que
deram suas vidas pela revolução".
Anita,
que esteve exilada em dois períodos de sua vida na União Soviética, recorda com
carinho esses momentos e destaca "a solidariedade do governo soviético e
do Partido Comunista da União Soviética, assim como do povo soviético, em
relação aos revolucionários do mundo inteiro que eram perseguidos em seus
países de origem.".
"As
entrevistas que tenho concedido visam esclarecer o público a respeito dos
livros que publico, assim como da vida e da atuação política dos meus pais e
dos comunistas. Como historiadora marxista, considero necessário contribuir
para que as novas gerações conheçam interpretações históricas comprometidas com
a evidência, como defendia o grande historiador Eric Hobsbawm. Por isso,
considero importante falar à imprensa sempre que sou solicitada", explica
Anita.
Preocupada
com a justiça social, a filha de Benário e Prestes manifestou sua insatisfação
com o governo do atual presidente do Brasil, Michel Temer, que considera um
"usurpador de um mandato que não lhe foi concedido pelo povo
brasileiro." Nesse sentido, sublinhou a sua posição contrária ao golpe
parlamentar que destituiu Dilma Rousseff.
Para
Anita, é necessário que as "forças democráticas e progressistas do
país" se organizem para constituir uma real alternativa de poder que
acolha as demandas dos trabalhadores e da maioria da população.
(*) Publicado
originalmente em Sputnik
http://operamundi.uol.com.br/conteudo/geral/47031/olga+benario+esposa+de+prestes+foi+a+mulher+mais+vigiada+pela+policia+secreta+nazista.shtml?utm_source=dlvr.it&utm_medium=twitter
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