Em
depoimento diante do juiz Sergio Moro, nesta quinta (20), o ex-ministro Antonio
Palocci negou que tenha recebido pagamento de vantagens indevidas em benefício
próprio ou em nome do PT em troca de defender os interesses da Odebrecht nos
governos Lula e Dilma. Por outro lado, em jogada com sua defesa, Palocci
sinalizou que pode arrastar para a Lava Jato nomes de mercado financeiro e
grandes empresas de comunicação que teriam pedido "grande montantes de
recursos" no início do primeiro mandato de Lula. Isso para mostrar que não
era apenas a Odebrecht que exercia forte lobby na política.
Na
rodada de perguntas feitas por seu advogado, Palocci foi confrontado sobre a
existência de uma planilha onde constam valores que a Odebrecht diz que seriam
"provisões" destinadas ao financiamento de campanhas do PT. A
planilha apresenta valores que Marcelo Odebrecht afirmou que foram repassados
ao partido em troca de aprovações de dois projetos do interesse do grupo, pelo
menos.
Palocci
negou que tenha negociado propina com a empresa, mas admitiu que "tomou
conhecimento" da história de "provisões da Odebrecht ao PT"
ainda no governo Lula. Segundo ele, pouco antes da eleição de 2014, a Odebrecht
fez chegar ao ex-presidente a informação de que havia, "além daquilo que
havia sido comprometido na campanha [doação oficial], uma provisão em torno de
R$ 200 milhões."
"Lula
me procurou porque essa pessoa lhe falou que eu deveria saber disso. Ele estava
surpreso, estranhando, achei ele irritado. Eu também fiquei muito surpreso com
'previsão'. Eu disse que não sabia de nada. Fui atrás de Marcelo e disse que
nunca tratamos com a empresa através de provisões", disse Palocci.
Segundo
o ex-ministro, "nesse momento, Marcelo tentou construir um entendimento
comigo de que isso acontece, de que ele havia me falado que eles trabalham
dessa maneira na empresa, fazendo provisões." Palocci afirma que,
sentindo-se desconfortável, pediu a Marcelo que esclarecesse a história com
Emilio Odebrecht, que teria conhecimento de que a relação da Odebrecht com o PT
se dava de maneira institucional. Depois, o petista afirmou que voltou a Lula e
disse que resolveu o "mal entendido".
"Passados
dois meses, uma pessoa me procurou, numa conversa estranha, um empresário
querendo saber de contribuição de campanha, ambientes eleitorais, como a gente
lidava com isso. A pessoa é minha amiga, achei a conversa estranha. Ele foi
inconveniente, mas não foi desrespeitoso. Ele percebeu que eu rechacei e ele
parou o assunto. Eu só fui entender dois meses depois, quando um banqueiro me
procurou e disse que estava ali mandado por pessoa do governo, e queria dizer
que vai cuidar das coisas de financiamento de campanha, provisões, usou a mesma
palavra. Queria saber se eu poderia ajudar. Eu queria saber se a presidente
Dilma sabia que ele estava ali. Ele disse que não, mas estava ali em nome de
uma pessoa do primeiro escalão do governo", comentou Palocci.
Nesse
momento, começa o mistério. "Eu pediria para não declinar nomes nesse
momento, mas em sigilo eu falo o que o senhor quiser. É que essa audiência é
pública, mas fico à disposição para lhe dizer o que o senhor achar
adequado", disse Palocci. Moro, por outro lado, não demonstrou interesse.
"Essa
pessoa me disse que iria cuidar dos recursos [ao PT]. Eu disse tudo bem, mas
não sabia como funcionava isso. Ele estranhou, achou que eu iria dar vários
dados e informações. Eu disse que não tinha nada a informar. Ai ele entrou no
assunto de provisões da Odebrecht, dizendo que se eu falasse, a gente poderia
capitalizar esses recursos. Eu disse que ele estava mal informado."
"Você
é uma grande personalidade do meio financeiro, se procurar a Odebrecht, eles
vão esclarecer isso com facilidade, não precisa de mim", disse Palocci.
"Esse
assunto deu muita cria, inclusive nos assuntos relacionados à Lava Jato. Só
peço licença ao senhor para não declinar nomes, o senhor decide se lhe
interessa ou não, e eu me prontifico a lhe falar tudo ou a quem o senhor
determinar", reforçou.
O
advogado de Palocci, então, questionou uma declaração anterior, em que o
ex-ministro disse que grandes empresas de comunicação também receberam atenção
do governo, assim como a Odebrecht.
"Olhando
o cenário de hoje, parece que todos os governos só trabalham em função da Odebrecht.
O que eu procurei demonstrar é que o primeiro problema que tive quando sentei
na cadeira de ministro da Fazenda foi o setor da construção civil."
"O
que isso tem a ver com Odebrecht?", perguntou Moro. Ao que Palocci
respondeu: "O governo muitas vezes salva empresas, em situações de
emergência, usando o limite da lei."
Palocci,
nesse momento, denotou que o governo Lula recebeu de empresas de comunicação
pedidos por "grandes montantes de recursos".
No
final da audiência, quando Moro abriu espaço para Palocci falar o que quisesse,
o ex-ministro reiterou a declaração enigmática.
"Fico
à sua disposição hoje e em outros momentos, porque todos os nomes e situações
que eu optei por não falar aqui, por sensibilidade da informação, estão à sua
disposição o dia que o senhor quiser. Se o senhor estiver com a agenda muito
ocupada, a pessoa que o senhor determinar, eu imediatamente apresento todos
esses fatos com nomes, endereços, operações realizadas e coisas que vão ser
certamente do interesse da Lava Jato."
E
completou: “Acredito que posso dar um caminho, que talvez vá dar um ano de
trabalho, mas é um trabalho que faz bem ao Brasil.”
ITALIANO
Palocci
ainda apresentou a Moro duas provas de que ele não é o "italiano" que
aparece em comunicações da Odebrecht. A primeira é uma mensagem em que Marcelo
diz que não havia encontrado o italiano na diplomação de Dilma Rousseff.
Palocci mostrou fotos suas no evento. O segundo indício é um e-mail de Marcelo
Odebrecht para Alexandrino Alencar, onde este último diz: "Falei com
Palocci e Palocci me disse que Itália e GM [Guido Mantega] estiveram com a
presidente". Palocci disse que a mensagem demonstra que Itália era uma
terceira pessoa.
Confrontado
por um e-mail que mostra que Branislav Kontic, seu ex-assessor parlamentar,
teria agendado em 2009 uma reunião entre Marcelo e "italiano",
Palocci respondeu que poderia ter sido reunião com qualquer político. Várias
vezes, disse, ele pediu a Marcelo para conversar com outras lideranças do PT, e
o então assessor fazia a ponte.
Palocci
também negou que tenha tratado de pagamentos no exterior com João Santana e
Monica Moura, responsáveis pelas últimas campanhas do PT. Ele disse que quando
recebia cobranças do casal, entrava em contrato com o tesoureiro do partido -
José de Fillippi Jr ou João Vaccari Neto - para que ele resolvesse as questões.
CONTRIBUIÇÃO
"Eu
nunca operei contribuições [para campanhas do PT], porque não era meu papel. Eu
dizia aos empresários para atenderem os tesoureiros do partido", disse
Palocci. Ele também comentou que, nas poucas vezes em que buscou apoio
financeiro para eleições, chegou a tratar desse assunto por telefone e deixava
"claro" que queria "coisa com recibo", ou seja, doação
oficial.
REFIS DA CRISE
Palocci
também falou sobre o chamado Refis da crise. Delatores da Odebrecht dizem que
fizeram doações ao PT em contrapartida à aprovação desse projeto.
O
ex-ministro explicou o contexto da aprovação do Refis e disse que ele não teve
participação no episódio, pois tratava-se de tema do governo, ou seja, de
competência de Guido Mantega.
Ele
contou que o lobby da Odebrecht começou, na verdade, pela aprovação da Medida
Provisória 460, que tratava de revogar um benefício que "foi dado no
passado, 10% do IPI de exportações era dado como crédito para empresas. E todas
as empresas estabeleceram uma tese jurídica de que isso não poderia ser
extinto. Marcelo queria anular a anulação desse imposto."
"Eu
disse a ele [Marcelo Odebrecht] que eu não poderia jamais apoiar a MP porque eu
era contra ela e, segundo, porque minha posição era decisiva para o processo.
Porque na bancada do PT [na Câmara], em questões econômicas, eu era consultar
às vezes em caráter decisivo. E o PT era um dos poucos partidos que se
colocavam contra a medida, que envolvia R$ 100 bilhões. Eu disse que se fosse
aprovada, eu trabalharia para ela ser vetada."
No
final, a MP foi "aprovada amplamente no Congresso e eu e Guido Mantega
trabalhamos para ser vetado pela presidência". Semanas depois, o Supremo
Tribunal Federal "chamou o processo e decidiu que os valores retidos pelas
empresas deveriam ser devolvidos e que esse crédito de exportações não existia
mais. E aí no Refis da crise [foi sugerido], se propôs o parcelamento desses
pagamentos. Eu não participei diretamente disso. Era coisa de governo."
Segundo
Palocci, Marcelo mandou e-mails para ele querendo discutir o Refis da crise.
"Eu disse para ele que era uma questão muito técnica, que ele deveria
procurar o Ministério da Fazenda."
O
ex-ministro ainda disse que no caso do Refis, "ali não estava se fazendo
bondade nenhuma. Só estavam decidindo a forma que as empresas deveriam pagar
[pelo fim do crédito do IPI das exportações]. Se não, no fundo, ninguém iria
pagar."
"Há
uma grande mudança no estilo e gestão da empresa até 2008, 2009, quando Marcelo
Odebrecht assume. Antes, tinha a liderança que se pode ver na pessoa de Emílio
Odebrecht uma atitude diferente em relação às suas agendas, a flexibilidade das
posições. Isso mudou bastante. Antes tinha uma empresa com percepção de Brasil
e mundo, e Marcelo já era um guerrilheiro das causas da empresa."
http://jornalggn.com.br/noticia/palocci-ameaca-arrastar-mercado-financeiro-e-empresas-de-comunicacao-para-a-lava-jato
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