Cientista
político é conhecido por dissecar poderio norte-americano na desestabilização
de países.
Respeitado
pela vasta obra em que disseca o poderio dos Estados Unidos a partir do
financiamento de guerras e da desestabilização de países, o cientista político
brasileiro Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira afirma, em entrevista ao
Jornal do Brasil, que representantes da Lava Jato, como o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, e o juiz de primeira instância Sérgio Moro, avançam
nos prejuízos provocados ao país e à economia nacional. Segundo o professor, os
“vínculos notórios” de Moro e Janot com instituições norte-americanas explicam
a situação atual das empresas brasileiras.
“Os
prejuízos que causaram e estão a causar à economia brasileira, paralisando a
Petrobras, as empresas construtoras nacionais e toda a cadeia produtiva,
ultrapassam, em uma escala imensurável, todos os prejuízos da corrupção que
eles alegam combater. O que estão a fazer é desestruturar, paralisar e
descapitalizar as empresas brasileiras, estatais e privadas, como a Odebrecht,
que competem no mercado internacional, América do Sul e África”, argumenta
Moniz Bandeira, que está lançando o livro A Desordem Mundial: O Espectro da
Total Dominação.
Na
entrevista a seguir, o cientista político, que é autor de mais de 20 obras
sobre temas como geopolítica internacional, Estados Unidos, Brasil e América
Latina, faz críticas severas ao presidente Michel Temer, que, segundo ele, “não
governa”, mas segue apenas as coordenadas do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles,
“representante do sistema financeiro internacional”.
“Seu
propósito é jogar o peso da crise sobre os assalariados, para atender à
soi-disant, ‘confiança do mercado’, isto é, favorecer os rendimentos do capital
financeiro, especulativo, investido no Brasil, e de uma ínfima camada da
população – cerca de 46 bilionários e 10.300 multimilionários”, critica Moniz
Bandeira.
Confira
a entrevista com o cientista político:
Jornal
do Brasil – Um livro como Quem pagou a conta?, da historiadora britânica Frances
Stonor Saunders, aponta a cultura como estratégia de dominação e força dos
Estados Unidos em relação aos seus artistas e intelectuais e em relação a
outros países durante a Guerra Fria. Essa dominação ainda se dá da mesma forma?
Ela passou por novas configurações?
Moniz
Bandeira – Sim, o inglês é a língua franca e os Estados Unidos ainda possuem o
maior soft power. É através do controle dos meios de comunicação, das artes e
da cultura que influenciam e dominam, virtualmente, quase todos os povos, sobretudo
no Ocidente. E os recursos financeiros correm por diversas fontes.
Como
o senhor vê o modo como os EUA elegem seu presidente da República? É um método
seguro? A Rússia chegou a anunciar que enviaria fiscais para acompanhar o
processo de votação até a apuração do resultado.
Os
grandes bancos e corporações, concentradas em Wall Street, são, geralmente, os
grandes eleitores nos Estados. George W. Bush não foi de fato eleito, mas
instalado no governo por um golpe do poder judiciário. Agora, porém, a
tentativa de colocar na presidência dos Estados Unidos a candidata de Wall Street
e do complexo industrial-militar, a democrata Hillary Clinton, falhou.
Elegeu-se Donald Trump, um bilionário outsider, como franco repúdio ao
establishment político, à continuidade da política de guerra, de agressão.
Trump recebeu o apoio dos trabalhadores brancos, empobrecidos pela
globalização, dos desempregados e outros segmentos da população descontentes
com o status quo. E o fato foi que mais de 70 milhões de cidadãos americanos
(59 milhões em favor de Trump e 13 milhões em favor Bernie Sanders, no Partido
Democrata) votaram contra o establishment, contra uma elite política corrupta,
e demandaram mudança.
De
que modo os EUA participaram da destituição da presidente Dilma Rousseff? Essas
intervenções se dão em que nível, quando comparadas às do período da ditadura
militar no Brasil?
Conforme
o historiador John Coatsworth contabilizou, entre 1898 e 1994, os Estados
Unidos patrocinaram, na América Latina, 41 casos de “successful” de golpes de
Estado para mudança de regime, o que equivale à derrubada de um governo a cada
28 meses, em um século. Após a Revolução Cubana, os Estados Unidos, em apenas
uma década, a partir de 1960, ajudaram a derrubar nove governos, cerca de um a
cada três meses, mediante golpes militares, como no Brasil. Depois de 1994, outros
métodos, que não militares, foram usados para destituir os governos de Honduras
(2009) e Paraguai (2012). No Brasil, o impeachment da presidente Dilma Rousseff
constituiu, obviamente, um golpe de Estado. Houve interesses estrangeiros,
elite financeira internacional, aliados a setores do empresariado, com o
objetivo de regime change (mudança de regime), através da mídia corporativa,
com o apoio de vastas camadas das classes médias, abaladas com as denúncias de
corrupção.
E
qual teria sido o papel norte-americano na destituição?
Há
evidências, diretas e indiretas, de que os Estados Unidos influíram e
encorajaram a lawfare, a guerra jurídica para promover a mudança do regime no
Brasil. O juiz de primeira instância Sérgio Moro, condutor do processo contra a
Petrobras e contra as grandes construtoras nacionais, preparou-se, em 2007, em
cursos promovidos pelo Departamento de Estado. Em 2008, ele participou de um
programa especial de treinamento na Escola de Direito de Harvard, em conjunto
com sua colega Gisele Lemke. E, em outubro de 2009, participou da conferência
regional sobre “Illicit Financial Crimes”, promovida no Rio de Janeiro pela
Embaixada dos Estados Unidos. A Agência Nacional de Segurança (NSA), que
monitorou as comunicações da Petrobras, descobriu a ocorrência de
irregularidades e corrupção de alguns militantes do PT e, possivelmente,
forneceu os dados sobre o doleiro Alberto Yousseff ao juiz Sérgio Moro, já
treinado em ação multi-jurisdicional e práticas de investigação, inclusive com
demonstrações reais (como preparar testemunhas para delatar terceiros).
O
senhor cita também o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no
desmantelamento de empresas brasileiras…
Rodrigo
Janot foi a Washington, em fevereiro de 2015, apanhar informações contra a
Petrobras, acompanhado por investigadores da força-tarefa responsável pela
Operação Lava Jato, e lá se reuniu com o Departamento de Justiça, o
diretor-geral do FBI, James Comey, e funcionários da Securities and Exchange
Commission (SEC). A quem serve o juiz Sérgio Moro, eleito pela revista Time um
dos dez homens mais influentes do mundo? A que interesses servem com a Operação
Lava-Jato? A quem serve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot? Ambos
atuaram e atuam com órgãos dos Estados Unidos, abertamente, contra as empresas
brasileiras, atacando a indústria bélica nacional, inclusive a Eletronuclear,
levando à prisão seu presidente, o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva. Os
prejuízos que causaram e estão a causar à economia brasileira, paralisando a
Petrobras, as empresas construtoras nacionais e toda a cadeia produtiva,
ultrapassam, em uma escala imensurável, todos os prejuízos da corrupção que
eles alegam combater. O que estão a fazer é desestruturar, paralisar e
descapitalizar as empresas brasileiras, estatais e privadas, como a Odebrecht,
que competem no mercado internacional, América do Sul e África.
Levando-se
em consideração a destruição de empresas de infraestrutura no país, projetos
para acabar com a exclusividade da Petrobras na exploração da commodity, o
senhor acredita na tese de que o cérebro da Lava Jato está fora do país? Se
sim, como se daria isso?
Não
há cérebro. Há interesses estrangeiros e nacionais que convergem. Como apontei,
os vínculos do juiz Sérgio Moro e do procurador-geral Rodrigo Janot com os
Estados Unidos são notórios. E, desde 2002, existe um acordo informal de
cooperação entre procuradores e polícias federais não só do Brasil, mas também
de outros países, com o FBI, para investigar o crime organizado. E daí que, provavelmente,
a informação através da espionagem eletrônica do NSA, sobre a corrupção por
grupos organizados dentro da Petrobras, favorecendo políticos, chegou à Polícia
Federal e ao juiz Sérgio Moro. A delação premiada é similar a um método
fascista. Isso faz lembrar a Gestapo ou os processos de Moscou, ao tempo de
Stálin, com acusações fabricadas pela GPU (serviço secreto). E é incrível que,
no Brasil, um juiz determine, a polícia faça prisões arbitrárias, ilegais, sem
que os indivíduos tenham culpa judicialmente comprovada, um procurador ameace
processá-los se não delatarem supostos crimes de outrem, e assim, impondo o
terror e medo, obtêm uma delação em troca de uma possível penalidade menor ou
outro prêmio. Não entendo como se permitiu e se permite que a Polícia Federal,
que reconhecidamente recebe recursos da CIA e da DEA, atue de tal maneira, ao
arbítrio de um juiz de 1ª Instância ou de um procurador, que nenhuma autoridade
pode ter fora de sua jurisdição, conluiados com a mídia corporativa, em busca de
escândalos para atender aos seus interesses comerciais. A quem servem? Combater
a corrupção é certo, mas o que estão a fazer é destruir a economia e a imagem
do Brasil no exterior. E em meio à desestruturação da Petrobras, das empresas
de construção e a cadeia produtiva de equipamentos, com o da “lawfare”, da
guerra jurídica, com a cumplicidade da mídia e de um Congresso quase todo
corrompido. O bando do PMDB-PSDB apossou-se do governo, com o programa
previamente preparado para atender aos interesses do sistema financeiro,
corporações internacionais e outros políticos estrangeiros.
O
economista Bresser-Pereira, ex-ministro de FHC, afirma, na apresentação de A
Desordem Mundial,que os EUA, segundo a tese do senhor, passaram por um processo
de democracia para a oligarquia. Que paralelo se pode fazer com o Brasil nesse
sentido, tomando como base as últimas três décadas? O senhor acredita que
passamos brevemente por um momento de democracia e agora voltamos à ditadura do
capital financeiro/oligarquia?
Michel
Temer, que se assenhoreou da presidência da república, não governa. É um boneco
de engonço. Quem dita o que ele deve fazer é o ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles, como representante do sistema financeiro internacional. E seu
propósito é jogar o peso da crise sobre os assalariados, para atender à
soi-disant, “confiança do mercado”, isto é, favorecer os rendimentos do capital
financeiro, especulativo, investido no Brasil, e de uma ínfima camada da
população – cerca de 46 bilionários e 10.300 multimilionários.
O
senhor afirma que onde quer que os EUA entrem com o objetivo de estabelecer a
democracia, eles entram na verdade por interesses políticos e econômicos. É
esse o caso da aproximação dos norte-americanos com Cuba? Fidel Castro é um dos
que compartilhavam dessa visão de interesse.
Sim,
havia forte pressão de empresários americanos para o restabelecimento de
relações com Cuba, por causa de seus interesses comerciais. Estavam a perder
grandes oportunidades de negócios e investimentos devido ao embargo econômico,
comercial e financeiro imposto a Cuba desde fins de 1960, portanto mais de 50
anos, sem produzir a queda do regime instituído pela revolução comandada por
Fidel Castro. Era um embargo de certa forma inócuo, uma vez que outros países,
como o Brasil, estavam a investir e fazer negócios com Cuba. A construção do
complexo-industrial de Mariel, pela Odebrecht, com equipamento produzidos pela
indústria brasileira e o apoio do governo do presidente Lula, contribuíram,
possivelmente, para a decisão do presidente Barack Obama de normalizar as
relações Cuba. Essa Zona Especial de Desarrollo de Mariel (ZEDM), 45
quilômetros a oeste de Havana, tende a atrair investimentos estrangeiros, com
fins de exportação, bem como opção para o transbordo de contêineres, a partir
da ampliação do Canal do Panamá, ao permitir a atracagem dos grandes e modernos
navios de transporte interoceânicos. Tenho um livro sobre as relações dos
Estados Unidos com Cuba (De Martí a Fidel – A Revolução Cubana e a América
Latina).
O
processo de apoio financeiro de instituições políticas às religiões cristãs de
direita, tal como o senhor descreve ao tratar do governo Bush, se assemelha de
alguma forma ao contexto do Brasil, levando-se em conta o crescimento da
bancada evangélica no Congresso Nacional e a conquista de cargos do Poder
Executivo por representantes da Igreja?
Sim,
o processo é secreto. Ocorre através de ONGs, muitas das quais são financiadas
pela USAID, National Endowment for Democracy, conforme demonstro em A Segunda
Guerra Fria e A desordem mundial, bem como através de outras agências
semi-oficiais e privadas. Essas igrejas também coletam muito dinheiro dos
crentes, acumulam fortunas. E as bancadas de deputados recebem dinheiro de
empresas não nacionais, mas de grandes empresas estrangeiras, muitas das quais
apresentam no Brasil balanços com prejuízos, conquanto realizem seus lucros nas
Bahamas e em outros paraísos fiscais. Tais empresas multinacionais não foram
investigadas pelo juiz Sérgio Moro, o procurador-geral Rodrigo Janot e a
força-tarefa da Operação Lava-Jato et caterva. A quem eles servem? Racine, o dramaturgo
francês, escreveu que “não há segredo que o tempo não revele”. Não sabemos
exatamente agora, porém podemos imaginar.
Fonte: Jornal
do Brasil
https://renatorabelo.blog.br/2016/12/05/moniz-bandeira-moro-e-janot-atuam-com-os-eua-contra-o-brasil/
Nenhum comentário:
Postar um comentário