Não
dá nenhuma alegria a decisão dos empregadores de dois dos médicos envolvidos na
monstruosa chacota feita nas redes sociais com o AVC de Marisa Letícia Lula.
Também
não tenho “peninha” do que lhes aconteceu: são adultos e caso se pretendam
médicos o mínimo que que se pode pedir a quem confiamos para nos abrir a
barriga a bisturi é que saiba, ao menos, fechar a própria boca quando o ódio
quer transformá-la em cloaca.
O
que me entristece, mesmo, são duas outras coisas.
O
primeiro é o grau de degradação no comportamento humano é tanto que chegamos a
um ponto em que xingar tornou-se algo que perdeu todos os limites, até os da
decência profissional.
E
não pense que é só à direita, não: há os que se dizem de esquerda mas não vão
além de querer, como um Bolsonaro, a desgraça, a supressão, a morte de alguém
por suas convicções.
Este,
o campo do ódio, é o terreno deles e não vou dar ao meu adversário a vantagem
de jogar na sua casa de horrores. Nosso campo é o da civilização, da
humanidade, da dignidade e da tolerância.
O
segundo, e isso é mais constrangedor, é que estas pessoas ganharam habilidades
e conhecimentos médicos com o dinheiro da população, com o dinheiro do Estado
brasileiro, na Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, mas não se sentem
devedores – por isto ou por sua profissão – sequer de um mínimo de equilíbrio
em seu comportamento social, que dirá de humanidade.
Hoje
mesmo, cedo, li a mensagem de meu amigo – e médico – Eduardo Costa, comemorando
o fato de, há 50 anos, ter entrado no Serviço Especial de Saúde Pública (SESP),
criado por Vargas e ampliado por Juscelino – um “Mais Médicos” de 70 anos
atrás, e com apoio não dos cubanos, mas de Franklin Roosevelt – para levar
saúde à Amazônia e ao Vale do Rio Doce. Ambos eram quase desertos humanos, aos
quais a borracha e a exploração mineral levaram gente pobre, gente
desassistida, igualzinho a milhões de brasileiros que ainda estão assim, nas
lonjuras ou nas periferias urbanas.
Conta
um pouco da história, dele e de outros médicos gaúchos que foram para a
Amazônia, onde ” não tinha água encanada, e luz (só) de um motorzinho que
funcionava das 19 às 21 horas”. Era a Boca do Acre, no Amazonas; era Brasil e
era lugar onde havia seres humanos vindo de longe, como os 56 cearenses que
fundaram o lugar, entre eles Alexandre de Oliveira Lima. que enricou e ganhou o
apelido de Barão de Boca do Acre.
Isso,
gente que veio de longe para essa terra de oportunidades, como vieram os Casa e
os Rocco, pais e avós italianos de Marisa Lula e como vieram também os país e
avós árabes do Dr. Richam, o que desejou que seus colegas fizessem logo ela
“dilatar as pupilas”.
Ao
longo da vida, alguns de meus melhores amigos foram ou são médicos. Sei que sua
tristeza, neste momento, é maior que a minha, porque a profissão é, para muito
de nós, a única religião e seu deus é a dignidade dos nossos semelhantes.
Nos
anos 80, logo que surgiu a Aids e não havia praticamente com o que tratá-la, um
deles que tratava pacientes muitas vezes terminais, dizia que se não pudesse
fazer mais nada, dar a eles o direito a morrer numa cama limpa era ser médico.
Os
que fizeram esta brutalidade não são. Nem podem ser, até que se curem do ódio.
http://www.tijolaco.com.br/blog/medicos-nao-monstros/
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