A
reforma da Previdência anunciada pelo governo não eleito pode ser resumida numa
sentença de morte: você não vai se aposentar. É só fazer as contas. O tempo de
contribuição necessário para ter direito a aposentadoria integral (que de
integral não tem nada) passou a ser de 49 anos. Some a essas quase cinco
décadas a idade que você começou a trabalhar, os eventuais períodos em que
ficou sem contribuir e compare com a expectativa de vida média do brasileiro. A
indesejada das gentes vai chegar primeiro.
Não
fosse apenas essa crueldade estatística, o arremedo de reforma encaminhado ao
Congresso, sem qualquer discussão prévia com os trabalhadores, ainda penaliza
beneficiários mais necessitados da Previdência, aqueles que recebem outras
formas de auxílio, que perderão em valor e deixarão de ser corrigidos pelo
salário mínimo. Para completar, o pacote ainda aumenta o tempo mínimo de
contribuição, punindo quem precisou se virar nos 30 para se manter no mercado
informal.
É
claro que a defesa da reforma, na boca de técnicos que lidam com números e
condições ideais, busca sempre comparação com outros contextos em tudo
distantes da realidade do brasileiro médio. O trabalhador rural, o empregado da
construção civil, o operário do chão de fábrica e outros servidores que labutam
em condições extremas de exploração no Brasil, são postos lado a lado com
estatísticas de países ricos da Europa, que possuem outra realidade em matéria
de direitos trabalhistas e expectativa de vida bem acima da registrada por
aqui.
Há
uma dissonância que só se explica pela má fé ou pelo desprezo vira-lata com o
brasileiro. De um lado, condições de espoliação do trabalho; de outro, recurso
a padrões de excelência na hora de propor benefícios. A reforma da Previdência
é a consagração desse método desumano.
Além
disso, as medidas chegam em tempo de grande mobilização pela precarização dos
direitos trabalhistas. O que tem sido defendido no setor empresarial é
exatamente o enfraquecimento do emprego. O alto nível de desemprego hoje
registrado não se explica apenas pela crise, mas por uma mudança de padrões de
empregabilidade que retira cada vez mais cedo as pessoas da formalidade para
baratear seu custo e tornar frágil sua representação. Para cortar custos,
pessoas em pleno auge da força produtiva estão sendo demitidas para diminuir a
massa salarial, gerando um novo exército de desempregados que se defrontam com
um mercado impenetrável. As formas de ingresso cada vez mais se assemelham a
chantagens.
Vai
ter luta
No
entanto, há algo que parece não ter entrado na conta dos golpistas. A reação
popular. Essa ameaça ao futuro do trabalhador não vai seguir o roteiro traçado
pelos conspiradores. Se o presidente não eleito tem seus compromissos com a
austeridade e seus descaminhos, que estão quebrando o país, não pode esperar que
o trabalhador receba o chamado ao debate com espírito de colaboração. A
resposta tem que ter o mesmo grau de violência da proposta.
Temer
é pequeno, seu projeto é entreguista, seus métodos autoritários. A pequenez,
mesmo ancorada pela colaboração de outros anões morais, não pode atentar contra
uma história de conquistas do trabalhador brasileiro. O desmonte da
Constituição de 88, o ataque à República, a afronta à democracia e o patrocínio
da instabilidade institucional que hoje humilha o país terão seu “não passarão”
inequívoco na ação dos trabalhadores no enfrentamento da reforma da
Previdência.
Quando
nos ameaçam de morte, sem metáforas, não é possível responder com serenidade.
Toda ação, por mais radical que se apresente, deve ser entendida como legítima
defesa. Os brasileiros de bem estão convocados a defender o direito à vida.
Entre morrer de trabalhar e morrer lutando a distância é simbólica. Sua medida
é a dignidade humana.
https://www.brasildefato.com.br/2016/12/12/morrer-de-trabalhar/
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