Se
alguém tem experiência para comparar o golpe de Estado que se passa em nosso
país é que viu outros se passarem.
Desta
vez, os militares não são quem empresta sua capa a ocultar os interesses do
golpismo.
Ele
é civil, político, judicial e empresarial.
E
só vem triunfando porque é completo como um exército. Tem a sua artilharia
midiática, tem (ou teve) sua infantaria histérica na Paulista, teve sua
intendência empresarial e tem um comando que não hesita em suas ambições de
avançar sobre o terreno que lhes é inacessível pelo voto.
Ler
Janio é a tristeza obrigatória a quem não quer se render, mentalmente, à
vitória da hipocrisia.
Afastamento
de Dilma é hipocrisia como jamais houve no Brasil
Janio de
Freitas
Quem
não aceita ver golpe partidário na construção do impeachment de Dilma Rousseff
pode ainda admitir, para não se oferecer a qualificações intelectual ou politicamente
pejorativas, que o afastamento da presidente se faz em um estado de hipocrisia
como jamais houve por aqui.
O
golpe de 64 dizia-se “em defesa da democracia”, é verdade. Mas o cinismo da
alegação não resistia à evidência dos tanques na rua, às perseguições e prisões
nem aos crimes constitucionais (todos os militares do golpe haviam jurado
fidelidade à Constituição que acabavam de trair: sem exceção, perjuros
impunes). Todos os golpes tentados ou consumados antes, incluída a Proclamação
da República, tiveram na formação aquele mesmo roteiro, com diferença de graus.
A força das armas desmoralizava a hipocrisia das palavras.
Os
militares, hoje, não são mais que uma lembrança do que foi a maior força
política do país ao longo de todo o século 20. Ao passo em que a política
afunda na degeneração progressiva, nos últimos 20 anos os militares evoluíram
para a funcionalidade o mais civilizada possível no militarismo ocidental. A
aliança de civis e militares no golpismo foi desfeita. A hipocrisia do lado civil
não tem mais quem a encubra, ficou visível e indisfarçável.
Há
apenas cinco dias, Michel Temer fez uma conceituação do impeachment de Dilma
Rousseff. A iludida elegância das suas mesóclises e outras rosquinhas faltou
desta vez (ah, que delícia seria ouvir Temer e Gilmar Mendes no mesoclítico
jantar que tiveram), mas valeu a espontaneidade traidora. Disse ele que o
impeachment de Dilma Rousseff é uma questão “política, não de avaliação
jurídica deles”, senadores. Assim tem sido, de fato. Desde antes de instaurados
na Câmara os procedimentos a respeito: a própria decisão de iniciá-los, devida
à figura única de Eduardo Cunha, foi política, ainda que por impulso pessoal.
Todo
o processo do impeachment é, portanto, farsante. Como está subentendido no que
diz o principal conspirador e maior beneficiado com o afastamento de Dilma.
Porque só seria processo autêntico e legítimo o que se ocupasse de avaliação
jurídica, a partir da Constituição, de fatos comprovados. Por isso mesmo
refere-se a irregularidades, crimes, responsabilidade. E é conduzido pelo
presidente, não de um partido ou de uma Casa do Congresso, mas do Supremo
Tribunal Federal.
As
441 folhas do relatório do senador Antonio Anastasia não precisariam de mais de
uma, com uma só palavra, para expor a sua conclusão política: culpada. O
caráter político é que explica a inutilidade, para o senador aecista e seu
calhamaço, das perícias técnicas e pareceres jurídicos (inclusive do Ministério
Público) que desmentem as acusações usadas para o impeachment.
Do
primeiro ato à conclusão de Anastasia, e até o final, o processo político de
impeachment é uma grande encenação. Uma hipocrisia política de dimensões
gigantescas, que mantém o Brasil em regressão descomunal, com perdas só
recompostas, se o forem, em muito tempo –as econômicas, porque as humanas,
jamais.
E
ninguém pagará por isso. Muito ao contrário.
Por
Fernando Brito
http://www.tijolaco.com.br/blog/o-exercito-dos-hipocritas-por-janio-de-freitas/
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