Com
o natural sentimento de mágoa de alguém que sofre uma injustiça, a reação de
Lula, ontem, foi a de repetir um desabafo idêntico ao que fez quando da absurda
condução coercitiva que sofreu por policiais federais, a mando de Sérgio Moro,
num espetáculo midiático dantesco: carregar à
força para depor alguém que não era (e não é, naqueles casos) réu e
sequer havia sido convocado a prestar depoimento.
“Eu
já cansei, eu não tenho que provar que tenho apartamento, quem tem que provar é
a imprensa que acusa, o Ministério Público que fala o que eu tenho, a Polícia
Federal que falou o que eu tenho, eles que têm que apresentar documento de
compra, pagamento de prestação, algum contrato assinado, porque se não tiver,
eles terão que me dar de presente um apartamento e uma chácara, aí eu ganharei
de graça essas coisas que eles falam que eu tenho”
Lula
completa, daqui a três meses, 71 anos. Depois dos anos de metalúrgico e
presidente do sindicato da categoria, foi deputado, presidente de um partido
político, Presidente da República por oito anos e, depois, um dos mais
requisitados palestrantes para eventos empresariais, justamente pelo sucesso de
sua administração.
A
pergunta óbvia é a seguinte: não ganhou, ao longo deste tempo e exercendo
funções como as que exerceu, o suficiente para comprar um belo de um
apartamento em qualquer das zonas ditas nobres de São Paulo ou da cidade
brasileira que desejasse? Ou um sítio, com piscina, churrasqueira e, até,
pedalinhos?
Seu
antecessor, Fernando Henrique, tem apartamentos aqui (ao que se diz também em
Paris) tem fazendas e empreendimentos agrícolas. Porque seu patrimônio –
afinal,os anos de professor universitário foram numa atividade que não
enriquece ninguém – não são suspeitos ou objeto de investigação
policial-judicial?Porque ele fala francês e inglês (este, bem mal, como se viu
na entrevista vergonhosa à Al Jazeera)?
Até
os acervos acumulados em suas gestões e que, por força de lei, foram obrigados
a carregar consigo, sem poder dar ou vender, são diferentes: no caso de FHC,
são preservação da memória nacional; no caso de Lula, apresentado como coisas
“afanadas” do Planalto!
O
cansaço é um sentimento que só atinge os justos. Os maus têm, no máximo,
preguiça, porque não há cansaço em quem não trabalho, muito e pesado.
Jamais
vi um canalha esgotado e quando algum vai fruir o produto de seu mau-caratismo
é num “dolce far niente” luxuoso. Ainda que fossem dele – e como diz, não há um
documento a prova-lo – pode-se chamar de luxo um “pombal” no Guarujá ou um
sítio em Atibaia?
Se
eu pudesse dizer algo a Lula, nestes tempos de mesóclise, contar-lhe-ia uma
cena que vivi com Leonel Brizola, num dos muitos revezes que sofreu na vida.
Numa
conversa por telefone, nos tempos de menos escutas, ele desabafa dizendo que está cansado, que
pouco pôde conviver com a família (mesmo no exílio, os filhos estavam no
Brasil, a partir de certa altura, e ele confinado no interior do Uruguai), que
estava com mais de 70 anos, que era hora de descansar e procurar prover toda a
ausência a que fora obrigado, depois de 50 anos de vida pública, 15 deles no
exílio.
“Brito,
eu tenho este direito”.
Eu
disse que era óbvio que sim e que ninguém poderia condená-lo por isso, embora
muitos fossem falar que ele teria ido
aproveitar “as delícias” de sua fazenda uruguaia: uma velha casa de pedra, no
interior profundo, com telhas de amianto pintadas de vermelho, apropriadamente
chamada de Casco Viejo.
“Só
tem um problema, governador (como sempre o chamávamos), isso é impossível.”
“Impossível,
por que?”, respondeu.
E
o velho, que era menos teimoso do que se diz, teve de ouvir:
“Se
o senhor se aposentar hoje, garanto que amanhã meu telefone vai tocar e vou
ouvir uma voz me dizendo… (e imitando seu sotaque) Mas óooolha, Brito, tu viste
os jornais, viu o que estes filhos da p…. estão fazendo?” É por isso que é
impossível, porque o senhor não consegue”.
Até
o leito de morte, todos sabem, ele não conseguiu, e este teimoso aqui o
acompanhou, com as mesmas queixas da família.
Certos
personagens tomam conta, e não devolvem, da condição de indivíduos que todos
nós – e eles também – temos.
Não
vão descansar, mesmo que os seres humanos que são o queiram.
Como
disse o outro agora velho, o de São Bernardo: “dá uma coceira….”
http://www.tijolaco.com.br/blog/incansaveis/
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