Neste
1º de abril de 2016 se completam 52 anos do corte constitucional que instaurou
no Brasil um governo autocrático, que mitigou garantias fundamentais, golpeando
nossa cambaleante democracia. Data como essa não deve ser esquecida, para que
nunca se repita ingerência semelhante.
Quando
falamos em democracia, muitos acreditam se tratar de um conceito perene, porém
foram poucos os períodos em que o Brasil não se viu assolado pelo
autoritarismo.
Desde
a invasão europeia até o advento da República, vivia-se sob o sistema
monárquico. O republicanismo trouxe uma parcial democracia, que excluía o
sufrágio das classes oprimidas. A Revolução de 30 instaurou um governo
ditatorial, que embora tenha alguns avanços sociais, criou um estado de
exceção, alinhado aos regimes fascistas europeus.
A
primeira Constituição genuinamente democrática foi a de 1946; tinha a missão de
afastar o Brasil do totalitarismo, influenciada pela posição tomada durante a
2ª Guerra. Esta missão logo se topou com o velho ímpeto autoritário. Com a
renúncia de Jânio Quadros em 1961, os militares tentaram impedir a regular
posse do vice Jango. Todavia, graças à mobilização popular capitaneada pelo
governador gaúcho, Leonel Brizola, os militares cederam, sendo aprovada a
Emenda Constitucional nº 04/1961, instituindo o parlamentarismo como sistema de
governo.
Mesmo
cerceado pelo Congresso, Jango encaminhava importantes projetos sociais, com
foco na educação e na reforma agrária. Em 1963 foi realizado plebiscito para
que a população decidisse se o parlamentarismo permaneceria ou se o
presidencialismo deveria ser retomado; o resultado foi uma retumbante vitória
do presidencialismo, com mais de 80% dos votos. No entanto a decisão da maioria
não foi respeitada e, como dito, em 1º de abril de 1964 os militares depuseram
o Presidente eleito e se infiltraram no poder.
O
período em que os militares exerceram o poder foi marcado pela extrema
violência com que combatiam os opositores e pela atecnia de seus dispositivos
legais. Foram criados “atos institucionais”, espécie de decreto
hierarquicamente superior às demais normas, inclusive da própria Constituição,
anomalia com o intuito de legitimar a prática dos atos autoritários.
Durante
o militarismo se sucederam estes atos institucionais, com curiosos preâmbulos
que afirmavam que o objetivo do golpe era combater o “bolsão comunista” do
governo que pretendia “bolchevizar o país”.
Com
eles, os militares fulminaram a independência do Legislativo, que acabou
extinto, podendo o presidente legislar por decretos em qualquer matéria; foram
extintas as eleições diretas para o executivo federal, estadual e das capitais;
os atos praticados pelo governo foram excluídos da análise judicial; autorizado
o aumento dos gastos públicos com as forças armadas, extintos os partidos
políticos; suspenso o habeas corpus aos opositores, bem como os seus direitos
políticos; cassação de mandatos legislativos em todas as esferas federativas;
julgamento de civis pela Justiça Militar (resultando em inúmeros sequestros,
torturas e mortes); banimento de brasileiros do território nacional, penas
perpétuas e de morte, entre outros.
Os
militares sequer ruborizavam ante os privilégios que criavam a si próprios. Em
1969 o Presidente estava impossibilitado de exercer o cargo, sendo criada a
Emenda Constitucional n.º 1, prevendo a aposentadoria presidencial com
“subsídio mensal e vitalício igual ao vencimento do cargo de ministro do
Supremo Tribunal Federal”, garantido ainda que o erário arcasse com todas as
despesas médicas.
O
Brasil somente voltou a eleger um presidente pelo voto direto em 1989.
Com
este resumo histórico, chegamos à conclusão de que dos nossos 516 anos de
história pós Cabral, a democracia vigorou por apenas 45 anos. A vida
democrática não é um costume para as gentes de ´terrae brasilis´, e assim, os
que estão acostumados a sobrepor suas vontades à da maioria, não se conformam
com a estabilidade do estado democrático.
Nesta
data é necessário rememorarmos os dias piores que já vivemos, refletirmos sobre
os avanços que galgamos e projetarmos cada dia a afirmação e o crescimento da
democracia, não permitindo jamais que o ímpeto autoritário sequer ronde nossas
garantias à vida, liberdade, tripartição de poderes independentes e outras que
se mostram como conquistas raras em nossa história.
Jorge
André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
http://www.espacovital.com.br/noticia-33716-apologia-democratica
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