Foi retirada a névoa que cercava a montanha na qual se
encastelava o poder judiciário, sempre inatingível e distante dos reles
mortais. Parecia para todos nós ser o único poder sem máculas até que para
nossa surpresa, descobrimos que também ele é utilizado para que alguns de seus
membros possam obter destaque na mídia de maneira desproporcional, tentando
utilizar tal visibilidade para se apropriarem de quinhões de poder cada vez
maiores.
Não, aquela imagem que tínhamos de senhores doutos,
sisudos, de vida estóica, quase espartana, dedicados tão somente às questões de
distribuir justiça, nem sempre tem correspondência com verdade. Eles também são
mortais muitas vezes em sua acepção mais rasteira e, a exemplo da maioria dos
membros dos demais poderes, muitos deles estão ali para obter benesses
exageradas e se glorificarem ás custas do suor do povo.
Descobri porque é que para atingir os cargos mais elevados
do poder judiciário é exigido o denominado notório saber jurídico. Não, não é para
melhor distribuir justiça e equidade. É para ter o cabedal cultural necessário
para saber reinterpretar os textos legais com a clara finalidade de
direciona-los à solução que lhes é exigida pelo sistema. Há que se ter cultura
refinada para ter o instrumental retórico capaz de convencer a população do
acerto de suas decisões.
E assim eu que sempre fui um denodado defensor do poder
judiciário, acabei me desiludindo ao ver que aquele tribunal que deveria ser o
grande guardião da justiça, proferindo suas decisões estritamente com bases
jurídicas, muitas vezes acaba fazendo julgamentos políticos, ou seja, passando
por cima de princípios do direito conquistados dura e lentamente através de
séculos de história, para atingirem suas finalidades muitas vezes espúrias, eis
que beneficiam apenas uma pequena aristocracia.
Ainda bastante jovem, minhas leituras me levaram à
descoberta de que eu era um anarquista congênito. Anarquista no sentido de ser
contrário a qualquer forma de poder institucional e não da forma pejorativa
como é utilizada por parte daqueles que desconhecem o que é tal ideologia. É
claro que tive que me dobrar e acabar aderindo à figura do Estado até porque se
eu não o fizesse teria que me tornar um eremita e viver à margem de tudo e de
todos. Mas hoje, vendo ruir toda e qualquer ilusão que eu poderia ter em
relação aos pilares do poder, voltam a pulular em minha mente aquelas velhas
idéias anarquistas e cresce cada vez mais dentro de mim uma aversão a este mero
ente da razão que é o Estado, cuja única finalidade é servir de instrumento
para espoliar o povo.
De forma asséptica, sem sangue, mas ainda assim,
espoliação.
Jorge André Irion Jobim.
Advogado de Santa Maria, RS
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