sábado, 17 de dezembro de 2011

FILMES ANTIGOS




SENTIMENTOS. ERNESTO CORTAZAR


Inesperadamente aquela musica solada em um piano penetrou em meus ouvidos e como se fosse um licor dos deuses, embriagou meus sentimentos. Tal qual um daqueles cavalos alados da mitologia grega, a melodia me colocou suavemente em suas costas e me levou para um local recôndito cujo caminho eu pensei que já havia esquecido há muito tempo.



O lugar era como se fosse um depósito de filmes antigos. Não, não são filmes desses que são passados nas telas de cinema. São cenas antigas de minha própria vida que foram gravadas em minha memória e que naquele momento retornaram aos turbilhões como se eu estivesse fazendo uma viagem ao passado.

De repente eu revi alguns dos meus primeiros olhares sobre o mundo exterior, o primeiro beijo, o primeiro amor de infância, as primeiras canções falando de minhas utopias, a primeira guitarra, os primeiros passos para fora da segurança de minha família, os primeiros temores, as primeiras desilusões e todas as minhas reconstruções. Também me reencontrei com momentos de extrema ternura como aqueles em que eu pela manhã sentia a beleza do alvorecer e a suavidade do toque do sol no meu rosto ainda inocente e sujeito às emoções puras, daquelas que somente crianças conseguem manter vivas. Aquelas minhas sensações sublimes ao ter os primeiros contatos com a natureza, momentos em que muitas vezes eu parecia me desligar da vida assim como me ensinaram e me reconhecer como sendo apenas uma insignificante parte do universo.


Voltei a me deparar com alguns rostos já desvanecidos, assim como se fossem fotografias antigas que encontramos sem querer em uma caixa empoeirada e esquecida em algum sótão antigo no qual não entramos há muito tempo. Lembrei que todos eles foram determinantes em algum momento de minha caminhada, embora com alguns eu tenha me relacionado por um breve, porém intenso lapso de tempo. Dei-me conta com nostalgia que muitos já não se encontram mais nesta dimensão e que eu em minha pressa do dia-a-dia perdi a oportunidade de ter com eles aquela última e cordial conversa, aquele último olhar em que acabamos retendo de forma mais nítida e duradoura a imagem das pessoas em nossa retina enquanto elas desaparecem no horizonte.

Por alguns momentos eu voltei a me sentir leve, livre do peso de todas as mazelas do mundo que muitas vezes acabamos carregando nas costas ainda que sem querer. Senti vontade de resgatar aquela pureza do início da caminhada, aquela esperança de que eu poderia modificar o mundo com poesias e canções, mas que acabou esbarrando na crueza da vida que, de tão robusta, acabou me tornando uma pessoa cética em relação aos demais seres humanos.

Durante aqueles minutos que me pareceram uma eternidade, eu senti um sopro de alento e com uma vontade imensa de me jogar no mundo novamente cheio de ânimo para recomeçar a minha luta interrompida há tanto tempo. Meu corpo e minha mente pareceram se encher novamente daquela antiga energia e esperança. Foi neste momento que o pégasus que me carregava em suas asas se fragmentou no ar e eu caí abruptamente, voltando ao mundo real.

Aos poucos o frio invernal voltou a tomar conta dos meus sentimentos e eu me aconcheguei novamente em minha solidão. É que a música havia acabado e com ela, a magia.


Jorge André Irion Jobim.

Um comentário:

PAULO ROSA disse...

A Música nunca acaba, ela apenas faz pausas onde melodias continuam sendo contruídas para soarem novamente, com toda a força, no momento seguinte.E os momentos se sucedem e a vida é infinita enquanto dura!