Embora a Constituição brasileira garanta o direito à informação, dispondo que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença, ouvimos seguidamente a afirmação de que a liberdade de imprensa não é absoluta, principalmente pelo fato de estar atrelada a uma vetusta legislação autoritária cunhada no período negro da ditadura militar. Há inclusive, uma corrente de juristas contrária à existência de uma lei específica para disciplinar a atividade da imprensa por entenderem que os delitos cometidos por jornalistas seriam disciplinados pelo Código Penal.
Acredito que a verdadeira limitação imposta à imprensa, advém do fato de que os órgãos de imprensa são também empresas, necessitando portanto, de anunciantes privados e também do patrocínio público. Assim sendo, não podem criticar duramente aqueles que a mantêm sob pena de perderem boa parte de suas verbas publicitárias. Elas funcionam como uma forma de pressionar o jornalista mais crítico, fazendo-o permanecer em silêncio.
Existe também uma preocupação atualmente com a denominada censura judicial. São relatados casos em que juízes declaram a ilegalidade de se veicular notícias sobre determinados processos. Afirmam ainda que, apesar da chamada Lei de Imprensa estabelecer limites para indenização por danos morais em até 20 salários mínimos para jornalistas e de até 200 salários mínimos para a empresa, existem sentenças ultrapassando esses limites, fato que estaria estimulando a autocensura e criando a chamada "indústria das indenizações”, transformando a ofensa em meio de enriquecimento fácil.
Não é bem assim. Veja-se que, por um lado, a Constituição Federal no art. 220 e seus parágrafos, dispõe que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição. Veda ainda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística, determinando que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social. Por outro, prescreve que tal liberdade não pode ser absoluta, devendo observar alguns limites, entre eles o do art. 5º, inciso X da mesma carta constitucional. Dispõe referido inciso que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Assim sendo, o Poder Judiciário tem sido desafiado a encontrar um equilíbrio entre estes dois bens jurídicos constitucionalmente protegidos: de um lado a garantia da livre informação e de outro, a inviolabilidade dos direitos individuais.
Devo dizer que sou de uma geração avessa aos censores, porém acredito que pessoas que labutam na imprensa devem ter um cuidado muito grande para não pré-julgarem e destruírem moralmente pessoas que posteriormente, se descobre não serem responsáveis pelas acusações que lhes são muitas vezes impingidas de forma espetaculosa, açodada e irresponsável pelos órgãos de imprensa. Há um sem-número de casos assim que podem ser citados, porém, apenas para exemplificar, podemos trazer a baila aquele rumoroso caso da Escola Base. Para quem não se recorda, em março de 1994, a imprensa publicou reportagens sobre seis pessoas que estariam envolvidas no abuso sexual de crianças, alunas da Escola Base, localizada no Bairro da Aclimação, em São Paulo. Jornais, revistas, emissoras de rádio e de tevê basearam-se em fontes oficiais - polícia e laudos médicos - e em depoimentos de pais de alunos. Tratou-se de um erro, porém quando descoberto, a escola já havia sido depredada, os donos estavam falidos e eram ameaçados de morte em telefonemas anônimos.
Nota-se portanto, que os trabalhadores da imprensa devem ter consciência do grande poder que possuem. Por intermédio de seus veículos, podem inocentar ou punir alguém. Muitas vezes a punição psicológica ou moral deixa marcas tão profundas na vida dos acusados, que nem mesmo a posterior prova de sua inocência ou o tempo conseguem apagar.
Para encerrar, quero expor uma constatação que fiz e que me deixa confuso. Noto que os jornalistas insurgem-se contra risco de decisões judiciais ou projetos de lei que, sob a justificativa de preservar a privacidade, limitam o direito de informação. Querem eles uma liberdade praticamente absoluta nesse sentido. Existe porém, uma contradição que deve ser levantada. Como costumo escrever e enviar artigos para vários veículos de comunicação, entre eles jornais e estações de rádios, tenho notado alguns resquícios de censura sobre os escritos que lhes envio. Existe um jornal de grande circulação para o qual eu envio algum material tanto para ser publicado no jornal quanto para ser publicado em seu site, que contém um aviso de que o espaço é livre para colaborações mais pessoais, como crônicas e poesias. Porém deixa claro que todos os textos serão submetidos à avaliação e poderão ser recusados ou editados. Em outros veículos de imprensa, tenho notado que meus textos são editados, justamente nas partes em que eu faço alguma crítica mais incisiva.
Isso me dá a impressão de que, na verdade, o censor apenas trocou de lugar. Saiu de alguma sala empoeirada dos órgãos governamentais e foi se instalar nas dependências dos órgãos de imprensa. Será que é para evitar pessoas que não dependem de seus salários, independentes portanto, possam atingir com suas críticas algum dos patrocinadores de tais empresas de comunicação? Será que não é aí é que reside a verdadeira censura à imprensa: as denominadas verbas publicitárias dos entes públicos ou privados que podem ser suprimidas ou aumentadas de acordo com as posições adotadas pelo veículo de comunicação?
Trata-se de uma questão sobre a qual devemos refletir.
Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
Acredito que a verdadeira limitação imposta à imprensa, advém do fato de que os órgãos de imprensa são também empresas, necessitando portanto, de anunciantes privados e também do patrocínio público. Assim sendo, não podem criticar duramente aqueles que a mantêm sob pena de perderem boa parte de suas verbas publicitárias. Elas funcionam como uma forma de pressionar o jornalista mais crítico, fazendo-o permanecer em silêncio.
Existe também uma preocupação atualmente com a denominada censura judicial. São relatados casos em que juízes declaram a ilegalidade de se veicular notícias sobre determinados processos. Afirmam ainda que, apesar da chamada Lei de Imprensa estabelecer limites para indenização por danos morais em até 20 salários mínimos para jornalistas e de até 200 salários mínimos para a empresa, existem sentenças ultrapassando esses limites, fato que estaria estimulando a autocensura e criando a chamada "indústria das indenizações”, transformando a ofensa em meio de enriquecimento fácil.
Não é bem assim. Veja-se que, por um lado, a Constituição Federal no art. 220 e seus parágrafos, dispõe que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição. Veda ainda toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística, determinando que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social. Por outro, prescreve que tal liberdade não pode ser absoluta, devendo observar alguns limites, entre eles o do art. 5º, inciso X da mesma carta constitucional. Dispõe referido inciso que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Assim sendo, o Poder Judiciário tem sido desafiado a encontrar um equilíbrio entre estes dois bens jurídicos constitucionalmente protegidos: de um lado a garantia da livre informação e de outro, a inviolabilidade dos direitos individuais.
Devo dizer que sou de uma geração avessa aos censores, porém acredito que pessoas que labutam na imprensa devem ter um cuidado muito grande para não pré-julgarem e destruírem moralmente pessoas que posteriormente, se descobre não serem responsáveis pelas acusações que lhes são muitas vezes impingidas de forma espetaculosa, açodada e irresponsável pelos órgãos de imprensa. Há um sem-número de casos assim que podem ser citados, porém, apenas para exemplificar, podemos trazer a baila aquele rumoroso caso da Escola Base. Para quem não se recorda, em março de 1994, a imprensa publicou reportagens sobre seis pessoas que estariam envolvidas no abuso sexual de crianças, alunas da Escola Base, localizada no Bairro da Aclimação, em São Paulo. Jornais, revistas, emissoras de rádio e de tevê basearam-se em fontes oficiais - polícia e laudos médicos - e em depoimentos de pais de alunos. Tratou-se de um erro, porém quando descoberto, a escola já havia sido depredada, os donos estavam falidos e eram ameaçados de morte em telefonemas anônimos.
Nota-se portanto, que os trabalhadores da imprensa devem ter consciência do grande poder que possuem. Por intermédio de seus veículos, podem inocentar ou punir alguém. Muitas vezes a punição psicológica ou moral deixa marcas tão profundas na vida dos acusados, que nem mesmo a posterior prova de sua inocência ou o tempo conseguem apagar.
Para encerrar, quero expor uma constatação que fiz e que me deixa confuso. Noto que os jornalistas insurgem-se contra risco de decisões judiciais ou projetos de lei que, sob a justificativa de preservar a privacidade, limitam o direito de informação. Querem eles uma liberdade praticamente absoluta nesse sentido. Existe porém, uma contradição que deve ser levantada. Como costumo escrever e enviar artigos para vários veículos de comunicação, entre eles jornais e estações de rádios, tenho notado alguns resquícios de censura sobre os escritos que lhes envio. Existe um jornal de grande circulação para o qual eu envio algum material tanto para ser publicado no jornal quanto para ser publicado em seu site, que contém um aviso de que o espaço é livre para colaborações mais pessoais, como crônicas e poesias. Porém deixa claro que todos os textos serão submetidos à avaliação e poderão ser recusados ou editados. Em outros veículos de imprensa, tenho notado que meus textos são editados, justamente nas partes em que eu faço alguma crítica mais incisiva.
Isso me dá a impressão de que, na verdade, o censor apenas trocou de lugar. Saiu de alguma sala empoeirada dos órgãos governamentais e foi se instalar nas dependências dos órgãos de imprensa. Será que é para evitar pessoas que não dependem de seus salários, independentes portanto, possam atingir com suas críticas algum dos patrocinadores de tais empresas de comunicação? Será que não é aí é que reside a verdadeira censura à imprensa: as denominadas verbas publicitárias dos entes públicos ou privados que podem ser suprimidas ou aumentadas de acordo com as posições adotadas pelo veículo de comunicação?
Trata-se de uma questão sobre a qual devemos refletir.
Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS
Este artigo foi publicado no site
Nenhum comentário:
Postar um comentário