Autos
de infração expedidos por auditores do trabalho são públicos. Assim, ao se
divulgar resultados de políticas de fiscalização, após regular processo
administrativo, confere-se publicidade a decisões definitivas.
Com
esse entendimento, o Supremo Tribunal Federal julgou improcedente o pedido da
Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) — feito na ADPF
509 — para que fosse declarada inconstitucional a chamada "lista
suja" do trabalho escravo, da qual constam os nomes de empregadores que
submeteram trabalhadores a condição análoga à de escravo. O nome do empregador
permanece no cadastro por um período de dois anos, durante o qual a
Administração monitora a regularidade das condições de trabalho. Se verificada
reincidência, o nome continua na lista por mais dois anos.
O
voto do relator do caso, ministro Marco Aurélio, foi seguido pelos ministros
Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Rosa
Weber. Divergiu o ministro Alexandre de Moraes, para quem a Abrainc sequer tem
legitimidade para propor a ação. Edson Fachin e Luís Roberto Barroso
acompanharam o relator, mas com ressalvas. O julgamento foi feito por meio do
Plenário virtual, em sessão encerrada nesta segunda-feira (14/9).
Histórico
A
"lista suja" do trabalho escravo foi inicialmente instituída em 2004,
por meio de uma portaria interministerial. Em 2011, uma nova portaria fez
alterações na disciplina. A Abrainc impugnou esse ato de 2011, por meio da ADI
5.209. Decisão liminar do então presidente do STF, Ricardo Lewandowski, chegou
a suspender a eficácia das normas, sob o argumento de que inexistia lei formal
a respaldá-las, além de aparente inobservância do devido processo legal, já que
na portaria não haveria referência à instauração de processo administrativo e
às garantias do contraditório e da ampla defesa.
Posteriormente,
no entanto, a relatora dessa ADI, ministra Cármen Lúcia, declarou a perda de
objeto da ação, pois novo ato foi editado — Portaria
Interministerial
4/2016, dos à época ministérios do Trabalho e Previdência Social e de Estado
das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos.
Segundo
Cármen Lúcia, a nova normativa sanou os pontos que haviam sido questionados
pela Abrainc. A entidade, no entanto, voltou questionar a lista suja,
impugnando a portaria de 2016 — por meio da ADPF 509.
Relator
da ADPF, o ministro Marco Aurélio, então, considerou que a nova portaria se
ampara na Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/11). "O diploma tem por
princípio a chamada 'transparência ativa', incumbindo aos órgãos e entidades o
dever de promover a divulgação de informações de interesse público,
independentemente de solicitação", afirmou.
Assim,
reputou constitucional a portaria. "Com o Cadastro, visou-se conferir
publicidade a decisões definitivas, formalizadas em processos administrativos
referentes a autos de infração, lavrados em ações fiscais nas quais constatada
relação abusiva de emprego, a envolver situação similar à de escravidão",
disse.
O
ministro também destacou que a portaria de 2016 atende ao devido processo
legal. "Garante-se, ao empregador, a apresentação de defesa no prazo de dez
dias, contados do recebimento do auto de infração, a requisição de audiência
para ouvir testemunhas e outras diligências, bem assim recurso dentro de dez
dias, a partir do recebimento da notificação da decisão impondo a pena",
considerou.
Além
disso, registrou que a "lista suja" não tem natureza sancionatória,
"considerada a finalidade precípua de atendimento ao princípio da
publicidade
de atos administrativos de inequívoco interesse público".
Por
fim, ressaltou que o princípio da dignidade da pessoa humana — artigo 1º, III,
da Constituição — é fundamento da República e proíbe a "instrumentalização
do indivíduo". "A observação justifica-se ante a necessidade de
ter-se avanço, e não retrocesso, civilizacional. A implementação do ato atacado
volta-se a realizar direitos inseridos no principal rol das garantias
constitucionais", concluiu.
ADPF
509
Revista
Consultor Jurídico
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