segunda-feira, 20 de julho de 2020

A DESTRUIÇÃO AMBIENTAL E O RISCO DE NOVAS PANDEMIAS. Priscila Ortega

Em abril de 2018, os biólogos da Universidade de Varsóvia publicaram um artigo no qual relaciona a rápida destruição dos habitats dos morcegos com a disseminação de coronavírus, como o SARS-CoV e MERS-CoV.

Esse artigo descreve como os abrigos dos morcegos presentes nas florestas tropicais do Sudeste Asiático foram destruídos em 50% durante os últimos 70 anos, resultando no contato entre animais portadores de doenças e os seres humanos. O estudo também revela que 31% dos vírus que os morcegos transportam são diferentes formas de coronavírus. Por isso, ele também adverte sobre o risco do surgimento de futuras doenças associadas a esse tipo de vírus.

Em outro estudo, realizado em 2014 por cientistas da Brown University (EUA), indicou-se que a quantidade total de surtos de doenças infecciosas tem aumentado nas últimas quatro décadas. Concomitantemente, a cobertura florestal do mundo foi reduzida à metade do seu tamanho. Dessa forma, animais tiveram de buscar outros locais para morar, encontrando outras espécies, como a humana.

A maioria dos novos casos de surtos de doenças (em torno de 60%) mostrados no estudo foram de origem animal, incluindo o vírus Ebola, SARS-CoV e H1N1. Assim, o estudo relaciona o recente aumento das doenças infecciosas com o aumento de patógenos que transitam da vida selvagem para os seres humanos.
A situação da Amazônia

Com relação ao Brasil, os alertas de desmatamento na região amazônica foram recordes no primeiro trimestre de 2020. Comparado a março de 2019, houve um aumento de 29,9% na destruição da cobertura vegetal nativa, segundo o Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa triste realidade incide sobre os povos indígenas e comunidades tradicionais, que se tornam mais vulneráveis à COVID-19.


Além das limitações ao acesso à saúde das comunidades locais, existem outros fatores contribuem para o avanço da epidemia. É o caso do aumento das atividades do setor mineral e dos garimpos, assim como a derrubada crescente da floresta.

Em suma, a destruição ambiental contribui diretamente para o aparecimento de doenças. Para se ter uma ideia, as regiões da Amazônia que apresentaram altas taxas de desmatamento também apresentaram, simultaneamente, taxas crescentes de malária em humanos.

Com a diminuição da cobertura vegetal, poças de água estagnadas aumentam no solo. Mosquitos, como os agentes transmissores da malária, se reproduzem nessa água. Assim, o aumento da população desses insetos nas áreas desmatadas fica descontrolado, ainda mais porque seus predadores naturais (sapos e libélulas) morreram quando seu habitat foi destruído.


De acordo com Andy MacDonald, ecologista de doenças e cientista ambiental da Universidade da Califórnia (Santa Bárbara), as árvores normalmente podem absorver a água estagnada no solo por meio de suas raízes. Contudo, caso não haja árvores suficientes, essa água permanece, criando um local propício para a reprodução dos mosquitos. A cientista também relaciona a presença de maior quantidade de água estagnada em áreas de maior destruição e invasão humana. Esse fato cria uma interação mortal entre pessoas e mosquitos portadores de malária.

Aquecimento global também é responsável

Algo bem semelhante também ocorre em florestas tropicais do sudeste da Ásia. Lá, as secas ocasionadas pelo El Niño estão mais intensas e recorrentes devido ao aumento da temperatura global. Em 1998, por exemplo, a seca ocasionada por esse fenômeno atmosférico desencadeou um surto de Nipah na Malásia.

Segundo Amy Trittout, professora assistente do Instituto de Patógenos Emergentes da Universidade da Flórida, essa seca causou incêndios florestais em massa. Com isso, criou-se uma enorme poluição atmosférica que impedia a frutificação. Por esse motivo, morcegos raposas-voadoras foram obrigados a migrar da floresta para as cidades da Malásia. Alguns desses morcegos invadiram fazendas de porcos desse país, ocasionando os primeiros casos do vírus Nipah. Os morcegos mordiam as frutas que os porcos ingeriam, causando a propagação do vírus. Em seguida, os seres humanos adquiriam o vírus ao entrar em contato com os porcos contaminados.


Triste realidade

Atualmente, grande parte do desmatamento ocorre por empresas multinacionais, com o objetivo de limpar acres de terra para a produção de uma safra comercial. A Amazônia, por exemplo, está sendo destruída principalmente para o cultivo de cana de açúcar, palmeira (para a obtenção do óleo de palma), entre outros. As monoculturas, de maneira geral, esgotam o solo, deixando as culturas vulneráveis a pragas e os seres humanos vulneráveis a doenças.

Assim, ações governamentais devem ser propostas, para investigar, fiscalizar e controlar o cumprimento das leis ambientais. No entanto, o desmatamento e as ações de garimpos ilegais ainda são preocupações recorrentes. Como sociedade, devemos pressionar para que medidas contra essas ilegalidades sejam tomadas. Caso nada seja feito, uma nova pandemia deve ser esperada, ainda mais forte e cruel.

REFERÊNCIAS

Afelt A. et al. Bats, Coronaviruses, and Deforestation: Toward the Emergence of Novel Infectious Diseases?. Frontiers in Microbiology, 2018.

Smith KF et al. Global rise in human infectious disease outbreaks. Journal of Royal Society Interface, 2014.

http://eurekabrasil.com/a-destruicao-ambiental-e-o-risco-de-novas-pandemias/?fbclid=IwAR22uqm4_KvpLPdok25OwMLTLqwYNcuya_BxVjfI5DY928gi4WaQICL1RRs

Nenhum comentário: